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Caçador de Mitos Por Leandro Narloch Uma visão politicamente incorreta da história, ciência e economia
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Deveríamos permitir a venda de sangue para transfusão?

O estoque nos bancos de sangue aumentaria se fosse possível pelo menos dar brindes aos doadores

Por Leandro Narloch
Atualizado em 30 jul 2020, 22h29 - Publicado em 17 jun 2016, 12h14
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  • Mais uma vez, o baixo estoque nos bancos de sangue preocupa os hospitais e leva médicos a adiarem cirurgias.

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    Para um economista, a causa da escassez é simples. Se uma proibição ou um tabelamento de preços impede que as pessoas lucrem fornecendo um produto, ele acaba sub-ofertado. No Plano Cruzado, o tabelamento de preços esvaziava as prateleiras dos supermercados; hoje, a proibição da venda se sangue esvazia prateleiras de hospitais.

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    A solução seria, então, legalizar o mercado?

    Certamente a escassez diminuiria. Uma pesquisa da Universidade Johns Hopkins, nos Estados Unidos, concluiu que a oferta de um vale-presente de míseros 5 dólares aumenta em 26% as chances de uma pessoa doar sangue; já um vale-presente de 10 dólares eleva a probabilidade em 52%.

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    Mas não é tão simples assim. Um argumento recorrente é que o mercado legal de sangue exploraria os mais pobres. Como escreveu o sociólogo Richard Titmuss num livro de 1970, surgiria “uma nova classe explorada, uma população humana de grandes doadores de sangue”. Em troca de migalhas, pobres venderiam o próprio corpo pacientes ricos. Isso já acontece nos Estados Unidos, onde é permitida a venda de plasma (o líquido amarelado que constitui 55% do sangue). Segundo a Atlantic, americanos pobres costumam vender plasma por 30 dólares.

    Não gosto desse argumento. É como o sujeito concluir que explora a empregada doméstica e resolver demiti-la para acabar com a exploração. Ela sai aos prantos de casa, triste com o fim do emprego. Opções não exploram ou oprimem; a falta de opções, sim. Pobres só venderiam sangue por falta de opção para ganhar dinheiro. Ao proibir que façam isso, tiramos uma opção de quem já tem pouquíssimas.

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    Outro argumento contra a venda é o da mercantilização do sangue. Como afirma o filósofo Michael Sandell no livro O que o dinheiro não compra, “transformar o sangue em mercadoria corrói o sentimento de obrigação de doar sangue, diminui o espírito de altruísmo e solapa a ‘relação de doação’, uma característica atida da vida social”.

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    Essa objeção lembra a “falácia da ladeira escorregadia”. Permitir a venda de sangue não necessariamente resultaria em fim do altruísmo. Cobertores são mercadorias, nem por isso deixamos de fazer mutirões para doar cobertores, e ficamos histéricos ao saber que a prefeitura de São Paulo confisca esse produto de mendigos durante o inverno. A possibilidade de doar sangue sempre estará aberta, e ocorre com frequência onde a remuneração a doadores é permitida.

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    Mas há um efeito negativo. Se vender sangue virar “coisa de pobre”, o pagamento seria um tiro no pé. Muita gente de classe média veria a atividade como degradante, pouco digna, e a evitaria. Justamente por isso, os pesquisadores da John Hopkins sugerem que uma remuneração não-financeira, como um vale-presente, funcionaria melhor que dinheiro, pois os doadores não a considerariam um pagamento. O Brasil, porém, é um dos raros países do mundo onde mesmo dar brindes a doares é proibido.

    Seria ótimo se o altruísmo garantisse bons estoques nos bancos de sangue. Mas, como mostram as notícias desta semana, ele não está sendo suficiente.

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    @lnarloch

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