José Casado, publicado no Globo
Michel Temer se mantém como exuberante protagonista de devassas judiciais. Tem sido assim nos últimos oito meses, com a média de um caso de corrupção estampado nas páginas do Diário da Justiça a cada 35 dias.
Semana passada, treze dos seus amigos foram presos, quatro pessoas com as quais se relacionou receberam intimações, e alguns dos seus habituais financiadores tiveram vasculhados escritórios e residências.
Isso foi consequência de 36 ordens expedidas na última terça-feira em um dos inquéritos (nº 4621) do Supremo Tribunal Federal, no qual Temer aparece sob a suspeita de “cometimento de crimes como corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa/ organização criminosa’’ ─ descrição feita pelo juiz Luís Roberto Barroso. O presidente nega.
Na manhã de 10 de maio do ano passado, Temer assinou um decreto que abriu chance para multiplicação de lucros das concessionárias dos serviços portuários. Segundo o Tribunal de Contas da União, as inovações desse decreto traziam “fortes indícios de ilegalidades’’.
Num exemplo, abriu caminho para beneficiar empresas privadas concessionárias vinculadas à Associação Brasileira de Terminais Portuários, entre elas Libra e Rodrimar, com até 100 nos aditivos em contratos de arrendamento de áreas em portos como o de Santos (SP). Dessa zona portuária saem 65% das exportações brasileiras. Os prazos de concessão das áreas em Santos foram estendidos em até 70 anos, em prejuízo dos interesses da administração pública, segundo o TCU.
O juiz Barroso, a procuradora-geral da República Raquel Dodge e a Polícia Federal sabem exatamente o que estão procurando. Mapeiam “recursos para fins pessoais e eleitorais” que as empresas privadas teriam repassado em troca das concessões feitas no decreto de Temer.
No início do mês, Barroso mandou suspender os sigilos fiscal e bancário do presidente da República. As decisões de ontem indicaram algumas novidades na investigação, que avança rápido. Nos mandados de busca e apreensão, lia-se: “Registros e livros contábeis e fiscais, formais e informais, agendas, ordens de pagamento, documentos relacionados à manutenção e movimentação de contas bancárias no Brasil e no exterior, em nome próprio ou de terceiros, contratos, notas fiscais, recibos e quaisquer documentos referentes à solicitação e recebimento de vantagem indevida e na ocultação de valores”.
Em outros documentos, o juiz foi explícito sobre “a possibilidade de se estar diante de um esquema contínuo de concessão de benefícios públicos em troca de recursos privados, para fins pessoais e eleitorais, que persistiria por mais de vinte anos no setor de portos, vindo até os dias ele hoje”. São constantes nos despachos de Barroso referências às “razões expostas” e aos “fatos demonstrados’’ pela polícia e pela procuradoria em procedimentos ainda mantidos sob sigilo.
Michel Temer era um presidente em busca de alternativas para os dias seguintes à descida da rampa do Planalto. Sem foro privilegiado, sua perspectiva é a do juízo de primeira instância ─ “e isso obviamente é preocupante”, como tem repetido seu advogado. Seu problema, agora, é como chegar a 1ª de janeiro de 2019 com a faixa de presidente da República para passar ao sucessor eleito. No Congresso, Temer se tornou uma dúvida.