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Editorial do Estadão: Cunha é apenas um sintoma

Não se pode perder de vista que Cunha não é causa, mas consequência de um modelo desenhado para descaracterizar o Congresso como o locus da representação democrática

Por Branca Nunes Atualizado em 30 jul 2020, 21h51 - Publicado em 14 set 2016, 17h44
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  • Deve-se comemorar, e muito, a cassação do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) pela esmagadora maioria de 450 votos a 10. O resultado foi uma clara demonstração de que, do mesmo jeito que o apoiaram enquanto isso lhes interessou, os oportunistas do “Centrão” o abandonaram em massa quando perceberam o vento soprando em outra direção.

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    Poucas vezes, na história da República, como nesse caso, testemunhou-se tamanha desfaçatez no Congresso Nacional. Profundo conhecedor do regimento interno da Câmara e do tíbio caráter de uma parte considerável de seus colegas, Cunha soube como poucos explorar as imensas fragilidades das pessoas e do sistema político atual para amealhar poder e submeter a agenda política e os interesses do País ao mais rasteiro gangsterismo. Mas a virada dessa página sombria da história do Parlamento nacional não pode obnubilar o fato de que Cunha não é a doença, mas apenas seu sintoma. E a recidiva será inevitável se o País não realizar mudanças drásticas na estrutura que engendrou esse mal.

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    Para entender como funciona essa estrutura, basta recapitular de que modo Cunha construiu seu império na Câmara. O indigitado gabava-se de controlar pelo menos 150 deputados, cooptados segundo o mesmo modelo que consagrou a era lulopetista: o toma lá dá cá. Os aliados que Cunha comprou foram seduzidos pela desenvoltura com que o deputado circulava entre empresários dispostos a bancar campanhas e também pela sua influência nos corredores da administração pública. Nascia assim o “Centrão”, nome que guarda dose incomum de cinismo mesmo para os padrões do atual Congresso.

    Por “Centrão” entenda-se não o espectro político de centro – legítima aspiração de grupos que pretendem se apresentar à sociedade como moderados –, mas sim aqueles políticos que, na imorredoura definição de Gilberto Kassab, não são nem de direita, nem de esquerda, nem de centro. Ou seja, são parlamentares de partidos que não se definem por qualquer plataforma política identificável nem representam alguma ideia ou proposta. Sua atuação se limita a aproveitar oportunidades para auferir o maior ganho financeiro e de poder no mais curto tempo.

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    Eduardo Cunha, com justiça, pode ser considerado, dessa chusma de oportunistas, seu primus inter pares, mas o fato é que o agora ex-deputado não os criou. Eles já estavam lá, disponíveis para se associar a quem lhes oferecesse o que desejavam. E Cunha, provavelmente por ser ele mesmo um egresso desse baixo clero, intuiu que ali estava uma grande chance para subir na vida e na hierarquia da República – chegou à presidência da Câmara e acalentava o sonho de voos mais altos.

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    Para o País, o que interessa agora é saber como desmontar o mecanismo que permitiu a eleição de gente tão desqualificada para a vida parlamentar. É urgente reformular integralmente o sistema que deu participação no Congresso a mais de 30 partidos políticos. Mesmo que se leve em conta a proverbial criatividade brasileira, não há ideologias ou plataformas políticas para tantos partidos, razão pela qual não é possível esperar que a maioria deles represente algo senão o interesse de seus proprietários.

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    Esses partidos e deputados “avulsos” foram comprados pelos governos petistas, que os transformaram em base de apoio em troca de participação no butim estatal, na expectativa de aprovar seus projetos sem a incômoda necessidade de dar satisfação ao eleitorado. O “presidencialismo de coalizão”, já em si uma aberração, fruto da fragmentação política, transformou-se assim em “presidencialismo de cooptação”, em que aliados são atraídos não em razão de projetos do interesse público, mas na base da oferta de espaço no governo e de outros benefícios impublicáveis.

    Portanto, não se pode perder de vista que Cunha não é causa, mas consequência de um modelo desenhado para descaracterizar o Congresso como o locus da representação democrática, pois esta pressupõe compromisso com o eleitor. Sem uma reforma política profunda, que restabeleça o valor do voto e o respeito pela vontade dos cidadãos, outros Cunhas virão.

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