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Quem são e o que sentem os pesquisadores que deixaram o Brasil

Estudo financiado pela Fapesp e coordenado pela Unicamp mostra que eles têm em média 37 anos, estão divididos entre homens e mulheres, são em maioria brancos

Por Ana Maria Carneiro, Ana Maria Nunes Gimenez, Mariana Ceci *, para The Conversation
Atualizado em 3 set 2024, 08h56 - Publicado em 3 set 2024, 08h46
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  • Making CAR T cells. The name of the cell processing specialist that was working in the bio-safety cabinet is Dipti Sahoo. Photo by Sam Ogden Credito: Cortesia Dana-Farber Cancer Institute
    Terapia celular: laboratório investe em pesquisas na área para câncer e doenças cardíacas.  (Foto: Dana-Farber Cancer Institute/Divulgação)

    No fim de julho passado, o CNPQ anunciou a abertura do processo de seleção para o Programa de Repatriação de Talentos – Conhecimento Brasil. O edital escolherá até mil projetos de pesquisadores que atuam no exterior e desejam voltar ao país. Ele prevê uma bolsa mensal com um valor superior às bolsas oferecidas para a Pós-Graduação, verbas para pesquisa, viagens e outros benefícios, como recursos para contratação de plano de saúde para a família e previdência.

    Os debates recentes nesse campo, no entanto, levantam questões importantes para pensar o tema da mobilidade internacional no mundo contemporâneo. Estudos mostram que a mobilidade é parte relevante do funcionamento da ciência atualmente e que a limitação da circulação pode ser danosa para o sistema científico. Neste cenário, uma das principais perguntas que devemos fazer é: quem são os pesquisadores brasileiros que atuam fora do Brasil?

    Um levantamento inédito, realizado pelo projeto “Contribuição da Diáspora Científica Brasileira”, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), e coordenado pelo Laboratório de Estudos da Organização da Pesquisa e da Inovação (Geopi) da Unicamp, busca responder essa pergunta.

    Por meio de um questionário, o projeto coletou informações de 1.200 pesquisadores brasileiros espalhados em 42 países. As respostas provocam reflexões sobre o perfil acadêmico e pessoal de quem está fora do país, os motivos que levaram à decisão de sair e o grau de interesse em retornar. Estes insumos devem ser considerados na elaboração de políticas cujo objetivo é impulsionar a ciência brasileira. E é importante destacar que não há dados oficiais sobre o número total de cientistas que deixaram o país.

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    Em termos de gênero, a amostra é balanceada, com quase igualdade entre homens e mulheres. A média de idade é 37 anos, sendo a maioria (72%) branca. Ao todo, 67% dos respondentes disseram estar trabalhando, 31% estudando e 10% estudando e trabalhando. Apenas 2% disse não estar nem estudando, nem trabalhando, no momento de aplicação do questionário. Apenas 12% dos respondentes estavam desempregados quando saíram do Brasil.

    Um dado chama atenção: a maioria dos respondentes doutorandos e pós-doutorandos disse ter deixado o país após 2019. Quando perguntados por quanto tempo planejavam ficar fora do Brasil, mais de 70% do total de respondentes disse não ter previsão de retorno, número que chega a mais de 90% entre os que ocupam a posição de professor ou pesquisador com contrato permanente.

    As principais razões para deixar o Brasil são ligeiramente diferentes entre os grupos, mas as quatro principais foram:

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    1- Oferta de trabalho ou pós-doutorado no exterior;

    2- Melhores condições de financiamento para pesquisa e outras atividades acadêmicas;

    3- Bolsa oferecida pelo país de destino;

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    4- Situação política no Brasil.

    Há vários outros pontos no levantamento, como a formação dos respondentes (se fizeram parte de sua formação acadêmica dentro ou fora do Brasil) e o detalhamento da posição por eles ocupadas no mercado de trabalho. Sobre esse tópico, cabe ressaltar que a equidade de gênero diminui à medida que se avança na carreira: cargos de docentes e pesquisadores com contrato permanente são majoritariamente ocupados por homens. Mas, afinal, por que é importante conhecer esse perfil de forma detalhada?

    Trocar a fuga pela circulação de cérebros

    Em primeiro lugar, é importante nos situarmos no debate atual sobre diásporas científicas. O termo diáspora foi inicialmente utilizado para tratar de populações afastadas de suas terras ancestrais em função de perseguições políticas, religiosas ou étnico-raciais. Com o tempo, o termo passou a englobar também as migrações voluntárias, bem como de profissionais altamente qualificados – as chamadas “diásporas científicas”, “diásporas do conhecimento” ou “diásporas intelectuais”, cujas discussões se tornaram crescentes a partir dos anos 1960.

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    O termo “fuga de cérebros”, ou brain drain, por sua vez, foi utilizado no final dos anos 1950, pela British Royal Society para se referir à saída massiva de cientistas e tecnólogos do Reino Unido em direção aos Estados Unidos, considerada uma perda permanente para o país.

    Finalmente, a partir dos 1990 emerge uma nova postura frente à migração de pessoas altamente qualificadas com a ideia de “circulação de cérebros” (em inglês, brain circulation). Essa mudança é relevante, já que a migração deixa de ser considerada uma perda permanente para o país, desde que sejam estabelecidas estratégias de engajamento com os membros da diáspora, que vão além de seu retorno físico ao país de origem.

    Ao analisar os dados dos pesquisadores entrevistados no exterior, é possível constatar que muitos não querem voltar ao país. A ideia de repatriação já não precisa ser compreendida como uma opção única. Ela é relevante para aqueles que querem retornar ao país e não o fazem por falta de oportunidade (apontada por 50% dos professores e pesquisadores com contrato temporário, 44% dos doutorandos e 40% dos pós-doutorandos). Mas não será capaz de resolver a totalidade da questão.

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    O retorno físico já não é encarado como a única solução possível. Em muitos casos, é mais relevante fomentar e facilitar relacionamentos, mesmo à distância. Diáspora com forte senso de pertencimento e interesse em contribuir para o desenvolvimento de sua terra natal pode ser transformada em um ator importante desse processo. As tecnologias digitais criaram novos caminhos e oportunidades para que se possa pensar em parcerias de longo prazo. O Projeto Pesquisa da Pesquisa, também coordenado pelo Geopi, tem aprofundado as investigações sobre o impacto e a trajetória desses pesquisadores na ciência brasileira.

    A valorização dos membros da diáspora não deve acontecer em detrimento daqueles que já atuam no país, enfrentando escassez de recursos para a ciência, ou mesmo falta de oportunidades. É preciso pensar formas de interações que possam fortalecer nosso sistema de Ciência, Tecnologia e Inovação, sem gerar ainda mais desigualdades, considerando que o mercado de trabalho nacional não tem absorvido os doutores formados a cada ano. Não são essas, em muitos casos, as principais razões que motivam a saída do país?

    O engajamento não pode ser visto com um fim em si: ele deve acontecer a partir do conhecimento da diáspora, suas capacidades, necessidades e recursos, mas também do conhecimento dos recursos e capacidades que se encontram no território nacional. Isso inclui a melhoria das capacidades das instituições domésticas, da capacidade de mobilização do país e da construção de confiança mútua. Por fim, é fundamental reconhecer que não há uma única diáspora científica brasileira, mas sim múltiplas diásporas, com diferentes perfis e interesses.Quem são e o que sentem os pesquisadores que deixaram o Brasil

    * Ana Maria Carneiro, Pesquisadora do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); Ana Maria Nunes Gimenez, Pesquisadora do Lab-Geopi, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e Mariana Ceci, , Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)

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