Estimada pela primeira vez a quantidade de vírus existentes nos mamíferos
Pesquisa americana aponta a existência de 320.000 tipos de vírus. O estudo desses microorganismos pode ajudar a evitar pandemias

Pesquisadores estimaram pela primeira vez a quantidade de vírus existentes em mamíferos e concluíram que eles chegam a 320.000 vírus. Cerca de 70% das doenças virais que surgem em humanos são zoonoses, infecções que são transmitidas ao homem por animais. É o caso do Ebola, Vírus do oeste do Nilo e Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars, na sigla em inglês), por exemplo. Conhecer todos, ou pelo menos grande parte deles, poderia ajudar a detectar e controlar de forma mais rápida as zoonoses.
CONHEÇA A PESQUISA
Título original: A Strategy To Estimate Unknown Viral Diversity in Mammals
Onde foi divulgada: periódico mBio
Quem fez: Simon J. Anthony, Jonathan H. Epstein, Kris A. Murray, Isamara Navarrete-Macias, Carlos M. Zambrana-Torrelio, Alexander Solovyov, Rafael Ojeda-Flores, Nicole C. Arrigo, Tracey Goldstein, Stephen P. Luby, Stephen S. Morse, Jonna A. K. Mazet, Peter Daszak, Ian Lipkina e outros
Instituição: Universidade de Columbia, EUA, e outras
Dados de amostragem: 1.897 amostras biológicas colhidas do Pteropus giganteus, um tipo de morcedo gigante
Resultado: Os pesquisadores estimam que existam 320.000 vírus diferentes nos mamíferos.
Segundo os pesquisadores, os processos necessários para identificar todos os vírus representariam um custo de aproximadamente 6,3 bilhões de dólares. Caso esse conhecimento se limitasse a 85% da diversidade viral, o valor cairia para 1,4 bilhão – menos de 10% do impacto econômico gerado pela pandemia do vírus Sars, por exemplo. O estudo foi publicado nesta terça-feira, no periódico mBio, da Sociedade Americana de Microbiologia.
“Historicamente, nossa abordagem para descobrir vírus tem sido muito aleatória. O que sabemos está muito ligado aos vírus que já se espalharam por humanos ou animais e emergiram como doenças. Mas a quantidade de vírus na natureza, incluindo muitas ameaças em potencial para o homem, é muito maior”, diz Simon Anthony, principal autor do estudo e pesquisador da Escola de Saúde Pública da Universidade de Columbia, nos Estados Unidos.
Para estimar a diversidade viral, os pesquisadores foram para as florestas de Bangladesh, país asiático em que vive o Pteropus giganteus, um tipo de morcego gigante, conhecido como raposa-voadora. O P. giganteus foi uma das fontes que originaram a transmissão para os seres humanos do vírus Nipah – causa de uma inflamação cerebral que pode deixar profundas sequelas e até matar. Identificado pela primeira vez na Malásia, em 1998, o vírus provocou o óbito de 50% dos infectados. Ele serviu de inspiração para o filme Contágio, de 2011.
De volta ao laboratório, foram analisadas as 1.897 amostras biológicas colhidas desses animais. Os resultados mostraram a presença de 55 vírus, em nove famílias virais, no P. giganteus. Destes, apenas cinco vírus eram conhecidos. Dez dos novos vírus identificados pertencem à mesma família do Nipah.
Os pesquisadores utilizaram técnicas de estatística para estimar que deveriam existir outros três vírus raros no P. giganteus, que não foram encontrados nas amostras, o que elevaria o número para 58. Multiplicando esse número pelos 5.486 mamíferos conhecidos, chegou-se ao total aproximado de 320.000 diferentes vírus.
Leia também:
Cientistas conseguem tratar infecção pelo vírus Ebola pela primeira vez
Novo vírus similar ao da SARS matou 30 pessoas no mundo, diz OMS
Custos – O mesmo processo foi repetido para calcular qual seria o custo de um estudo de todos esses vírus. Partindo de 1,2 milhão de dólares, empregado na descoberta dos 58 vírus do P. giganteus, os pesquisadores concluíram que seriam necessários 6,3 bilhões para todos os mamíferos. Porém, como a descoberta dos vírus raros acarreta um custo desproporcionalmente maior, eles mostraram também que, se limitarem o estudo aos 85% mais comuns, os custos caem para 1,4 bilhão.
Em comparação, o impacto econômico estimado para a pandemia do vírus Sars é de 16 bilhões de dólares. A Síndrome Respiratória Aguda Grave surgiu na China em 2002 e matou cerca de 10% das 8.000 pessoas infectadas em todo o mundo. “Não estamos dizendo que esse estudo preveniria uma nova pandemia como a do Sars, mas aquilo que aprenderíamos explorando a diversidade viral do mundo poderia reduzir esses acontecimentos, porque facilitaria a vigilância e os testes de diagnóstico rápidos”, afirma Anthony.
Para tentar aumentar a precisão da estimativa, os pesquisadores estão repetindo o processo em novos estudos – um com primatas de Bangladesh e outro com morcegos do México. Dessa forma, eles pretendem eliminar algumas dúvidas que ficaram após o primeiro estudo, como se todas as espécies de mamíferos têm uma quantidade semelhante de vírus.