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De 1941 a 2024: por que as enchentes são desafio constante no RS

Mais de 80 anos depois da tragédia que marcou o estado, gaúchos sofrem novamente

Por Marília Monitchele Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 8 Maio 2024, 19h07 - Publicado em 8 Maio 2024, 18h58

“Foi uma revolução dos elementos da natureza, associados numa empreitada sinistra de destruição e angústia”. É assim que um relatório destinado ao prefeito de Rio Grande descreve a inundação de 1941. Foram 22 dias de chuvas intensas que resultaram em uma das piores catástrofes da história da região. As águas invadiram o cais do porto de Porto Alegre, capital do Rio Grande do Sul, no dia 30 de abril, e rumaram para o centro em marcha contínua. O ápice da altura foi no dia 8 de maio, quando as águas do Guaíba chegaram a impressionantes 4,76 m acima do nível normal. Cerca de 70 mil pessoas (de uma população de 272 mil habitantes) tiveram de abandonar suas casas e a recuperação levou anos. “Foi um grande trauma”, afirma André Silveira, pesquisador do Instituto de Pesquisas Hidrológicas (IPH) da UFRGS. 

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Armazéns do Cais do Porto, em Porto Alegre, submersos na enchente de 1941 – (Arquivo SPH/Reprodução)

Oitenta e três anos depois, também no dia 8 de maio, as águas do Rio Guaíba estão novamente acima do nível normal. De acordo com dados do Serviço Geológico do Brasil (SGB), a expectativa é que fiquem abaixo dos 4,8m até amanhã. O que é, inacreditavelmente, uma boa notícia ante a máxima histórica, próxima aos 5,3 m, que as águas atingiram no último domingo (5). O trauma de 1941, embora devastador, pouco mudou na relação da cidade com as águas. Foi preciso uma nova inundação, desta vez em 1967, para que algo fosse efetivamente feito. 

Os efeitos de 1967 resultaram na criação do Sistema de Proteção Contra Cheias. Inaugurado na década de 1970, é composto pelo muro da Avenida Mauá (onde fica parte das comportas), o muro de concreto no Centro Histórico, casas de bombas e diques espalhados por diferentes pontos. Ao todo, são 68 quilômetros de diques, 14 comportas e 19 casas de bombas, de acordo com a prefeitura de Porto Alegre. A estrutura compõe um sistema que deveria proteger a cidade de cheias de até 6m, o que significa que se tudo estivesse funcionando como deveria, Porto Alegre estaria seca neste momento. 

Mas, como se sabe, não foi assim que aconteceu. Das cinco maiores cheias do Guaíba registradas desde 1941, quatro ocorreram apenas nos últimos oito anos. Em 2023, o Rio Grande do Sul já tinha batido marcas históricas de alagamentos. Nenhuma, porém, tinha superado o trauma de 1941. Até agora. As mudanças ocasionadas pelo aquecimento global, somadas às características hidrológicas do Rio Grande do Sul, contribuem para situações extremas, mas não são as únicas. Especialistas alertam para a falta de manutenção nas estruturas de controle das águas. De acordo com Silveira, há rachaduras espalhadas pelos muros de contenção, além de falhas operacionais nos sistemas de escoamento das comportas, o que resultou em vazamentos e prejudicou a contenção da inundação. 

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Avenida Borges de Medeiros, com o Mercado Público ao fundo – (Sioma Breitman/ Museu JJFelizardo/Reprodução)

Para a arquiteta Mima Feltrin, se a tragédia de 1941 causou alguma surpresa, a de 2024 era fato anunciado. A pesquisadora defende que desde a década de 1970, cientistas brasileiros têm produzido estudos robustos sobre as inundações no estado. E desde os anos 2000, analistas avaliam que se houvesse uma convergência geográfica, hidrográfica e meteorológica poderia haver uma enchente igual ou superior a de 1941. “Estamos falando de, pelo menos, 25 anos de avisos”, diz. A inércia diante dos fatos representa, para a arquiteta, uma estratégia política. “Aqui no Brasil a lógica é inversa. Gastamos cerca de 14 vezes mais com reconstrução do que com a prevenção de tragédias”. Diante do novo trauma, Silveira resume: “Está tudo igual a 1941, e 80 anos não mudaram praticamente nada. Vamos ter que começar tudo de novo. Espero que dessa vez aprendamos alguma coisa”.

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