Cosmo vira mercado promissor para bilionários e suas empresas
Cinquenta anos após os primeiros passos em solo lunar, a corrida espacial não é mais protagonizada por países, e sim pela iniciativa privada

“Esta nação deve se comprometer em atingir o objetivo de pousar um homem na Lua.” O ano era 1962; o país em questão, os Estados Unidos; e o autor do desafio ninguém menos do que o presidente John F. Kennedy (1917-1963). Seu discurso inflamou o nacionalismo americano — em plena Guerra Fria. O objetivo de JFK era superar a União Soviética, que largara na frente em uma disputa apelidada de “corrida espacial”. A provocação deu certo: em 20 de julho de 1969, dois americanos, Neil Armstrong (1930-2012) e Buzz Aldrin, tornaram-se os primeiros homens a pisar no solo lunar. Em três anos, os Estados Unidos levariam outros dez astronautas a caminhar pelo satélite. Desde 1972, no entanto, após a bem-sucedida missão Apollo 17, nenhum outro indivíduo repetiu o extraordinário feito. Nos próximos anos, isso pode mudar. Mas quem tem maiores chances de enviar uma nave à Lua não é uma nação e sim companhias privadas.
A corrida espacial entre EUA e URSS — que sequestrou tantos “corações e mentes”, como se dizia naqueles tempos — começou a perder impulso entre as décadas de 70 e 80, exatamente em razão das evidências de superioridade americana na disputa. Dos anos 1990 em diante, os governos de modo geral — e não apenas os protagonistas da Guerra Fria — passaram a investir em projetos espaciais mais baratos e até mesmo menos midiáticos, a exemplo do uso de telescópios orbitais, como o célebre Hubble. Com isso, os recursos da até então intocável Nasa, a agência espacial americana, caíram do patamar de quase 5% do Orçamento federal, em meados da década de 60, para menos de 0,5% em 2018. Foi nesse vácuo deixado pelas nações que surgiram outros interessados em pegar o bastão da exploração do universo — os bilionários e suas ambiciosas empresas. O cosmo virou um mercado promissor.

A mudança de rumo consolidou-se em 21 de julho de 2011, com a derradeira missão de um ônibus espacial dos Estados Unidos. A partir dali, a Nasa assumiu o discurso de que confiaria a particulares a tarefa de enviar astronautas e cargas para fora do planeta, incluindo o povoamento e o abastecimento da Estação Espacial Internacional. Um ano antes, o presidente Barack Obama já sinalizara a postura: “Ao comprarmos os serviços de transporte espacial, aceleraremos o ritmo das inovações à medida que startups de jovens líderes se estabeleçam para competir e projetar novos meios de transportar pessoas e materiais para fora da atmosfera”.
Duas companhias privadas logo se apresentaram para o, digamos assim, novo desafio. De um lado, a SpaceX, do bilionário sul-africano Elon Musk, fundador também do PayPal, empresa de pagamento on-line, e da Tesla, de carros elétricos. Do outro, o americano Jeff Bezos, da Amazon, o homem mais rico do planeta, que pôs no páreo a sua Blue Origin. A corrida espacial de agora tem como meta a conquista de um mercado que, se hoje já vale em torno de 400 bilhões de dólares, até 2030 deve alcançar algo como 805 bilhões. “A meta é aproveitar a concorrência para forçar a redução dos custos das viagens”, disse a VEJA o engenheiro espacial americano Chris Lewicki, criador da Planetary Resources, que visa, no futuro, a utilizar os serviços das companhias de exploração do universo para construir um sistema de mineração de asteroides.
As engrenagens que movimentam esse mercado já estão a todo o vapor (com o perdão da expressão um tanto “retrô”). A rivalidade entre a SpaceX e a Blue Origin fez diminuir em mais de 30% o custo de decolagens apenas com a criação de um método para lançar foguetes e depois pousá-los de volta inteirinhos — nas missões anteriores da Nasa, as naves eram destruídas quase completamente em cada operação. Desde 2018 o título de foguete mais poderoso do mundo também deixou de ser do Saturn V, responsável por conduzir o homem até a Lua nas décadas de 60 e 70, e passou para o Falcon Heavy, da SpaceX, com capacidade para transportar 64 toneladas de carga. Os bilionários por trás das empreitadas, contudo, garantem que não visam tão somente a lucros estratosféricos. Além de faturarem alto nos contratos com governos e com a venda de excursões orbitais para multimilionários, eles também prometem, para as próximas duas décadas, conduzir astronautas de volta à Lua e realizar uma inédita e esperadíssima viagem a Marte (leia mais a respeito no quadro acima). O desafio, como se vê, é de uma nova odisseia no espaço.
Publicado em VEJA de 10 de julho de 2019, edição nº 2642

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