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Conheça a ex-astronauta da Nasa que esteve no ponto mais fundo do oceano

Em entrevista a Veja, Kathy Sullivan falou sobre a sua experiência e reforçou a importância de um maior envolvimento de mulheres em missões de exploração

Por Luiz Paulo Souza Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jul 2023, 09h37 - Publicado em 3 jul 2023, 07h00

Em 1984, Kathryn Dwyer Sullivan foi a primeira mulher americana a fazer uma caminhada espacial, quando esteve a bordo do ônibus espacial Challanger, da Nasa. Como se fazer história uma vez não fosse o suficiente, em 2020, ela se tornou a primeira mulher a pisar no ponto mais fundo do oceano, na Fossa das Marianas, conquistando o título de única pessoa na história da humanidade que conhece os dois extremos. 

Oceanógrafa, Sullivan entrou na Nasa em 1978, no primeiro grupo de astronautas que permitiu a participação de mulheres. Na agência, esteve em três missões, totalizando 532 horas no espaço. Ela deixou a instituição em 1993, quando assumiu a chefia da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (Noaa)

INÉDITO - Mulheres na Nasa: poster de 1981 faz tributo a mulheres em missões espaciais. Na homenagem é possível ver Mary L Cleave, Bonnie J Dunbar, Judith A Resnik, Anne Lee Fisher, Kathryn D Sullivan, Rhea Seddon, Sally K Ride, e Shannon M Lucid
INÉDITO – Mulheres na Nasa: poster de 1981 faz tributo a mulheres em missões espaciais. Na homenagem é possível ver Mary L Cleave, Bonnie J Dunbar, Judith A Resnik, Anne Lee Fisher, Kathryn D Sullivan, Rhea Seddon, Sally K Ride, e Shannon M Lucid (Space Frontiers/Getty Images)

Aos 68 anos, ela foi convidada pelo explorador russo Victor Vescovo para participar de uma missão até a depressão Challanger, o ponto mais profundo do oceano, a bordo do submersível Limiting Factor. Em entrevista a Veja, ela contou os perigos e cuidados da viagem, comentou sobre as principais surpresas do fundo do mar e falou sobre a importância de uma participação feminina mais ampla em missões de exploração. 

Você foi a primeira pessoa a chegar em dois dos lugares que mais provocam a imaginação humana: o espaço e o fundo do mar. De onde veio essa motivação?

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O cerne da minha motivação é uma curiosidade ampla em torno do nosso planeta – paisagens, flora, fauna, pessoas, cultura, como as economias fluem. É multidimensional. Profissionalmente, o que mais me interessa é a geologia, em especial do fundo do mar. 

E como foi a sua jornada até o fundo do oceano profundo? Você pode comentar um pouco sobre isso?

Eu fiz três mergulhos diferentes, mas o mais celebrado foi o que fiz em 2020, a 11 mil metros de profundidade. O responsável por isso foi o explorador Victor Vescovo, que bancou o desenvolvimento do submersível – um submarino bem pequeno construído para chegar a uma grande profundidade. 

Ele já havia feito mergulhos anteriores, provando que o equipamento funcionava. Ele decidiu, então, levar pessoas notáveis para o oceano, como o Príncipe Alberto II, de Mônaco, que mergulhou no submersível até o ponto mais fundo do mediterrãneo. Depois, para a Fossa das Marianas, ele decidiu levar uma mulher que fosse oceanógrafa, por isso me convidou. 

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A ideia da nossa viagem foi medir essa profundidade de maneira mais precisa. Antes existia uma imprecisão de mais ou menos 50 metros, então levamos uma ferramenta para quem sabe diminuir este erro para 10 metros. E nós conseguimos, em um artigo que foi publicado um pouco depois. 

Qual foi a parte mais fascinante da viagem?

O mais interessante é que esse local é a união entre dois pedaços de Terra, mas tem uma pequena porção plana no centro onde nós pousamos. Eu sabia que existia vida em todos os lugares, mas eu nunca tinha lido nada sobre que tipo de vida tinha lá. Foi interessante ver que o fundo do mar é parecido com a Lua, bem plano, mas um pouco enrugado e sob cada uma daquelas protuberâncias tem o buraco de uma pequena minhoca. Os oceanos são a fonte secreta de vida neste planeta. É fascinante. 

Outra coisa que também é interessante, e eu sei disso por causa de trabalhos anteriores do Victor, é que se você conseguir pegar uma dessas bichos para analisar o interior, você provavelmente vai encontrar microplásticos. Então não importa o quão distantes eles estão dos seres humanos, eles são afetados por nós.

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Que precauções vocês tiveram que tomar para ir a um ponto tão extremo?

Foram muito mais precauções do que é possível dizer em uma conversa, mas posso comentar uma. O submersível que o Victor montou é uma esfera. Ela tem mais ou menos 2 metros de diâmetro, as paredes são construídas com 9 centímetros de titânio puro e essa esfera foi testada com o equivalente a 150% da pressão que ele teria que suportar no ponto mais fundo. 

O Victor não só tinha convicção de que funcionaria, ele testou para confirmar. Além disso, existiam dois sistemas a bordo, para garantir que seria possível retornar a superfície se um deles falhasse.

As pessoas costumam dizer que nós sabemos mais sobre a lua ou sobre marte do que sabemos sobre o oceano terrestre. Quais as diferenças da exploração desses dois mundos?

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É uma generalização dizer que sabemos mais sobre Marte ou sobre a lua do que sobre o nosso oceano, mas certamente tem um fundo de verdade. É bem mais fácil mapear a topografia desses lugares do que mapear a forma do fundo do mar. Isso acontece simplesmente porque nós podemos utilizar luzes, lasares e radares para mapear essas superficies, mas nada disso consegue penetrar o oceano. 

A única ferramenta que dá pra usar aqui são as ondas sonoras, que se espalham muito facilmente. Por isso, se você comparar a melhor imagem de Marte e a melhor do fundo do mar, a do oceano será muito mais imprecisa. 

Outra dimensão dessa dificuldade é que não é só o fundo que conta, mas todo o volume de água, o que vive lá e os processos químicos que ocorrem. 

EXTREMOS - Kathy Sullivan: ela foi ao espaço e depois mergulhou ao ponto mais baixo de que se tem notícia
EXTREMOS - Kathy Sullivan: ela foi ao espaço e depois mergulhou ao ponto mais baixo de que se tem notícia (NASA/Arquivo pessoal)

As explorações, tanto para o espaço quanto para o fundo do oceano, costumam ser feitas apenas por homens. Que diferenças você tem observado com uma participação mais ampla das mulheres nisso?

Sim, os homens tem um grande legado de exploração porque por séculos eles foram os únicos que podiam ter títulos acadêmicos, só eles podiam ter financiamentos, só eles podiam controlar os recursos. 

Foi só agora, ao longo do meu período de vida, que as mulheres começaram a participar como cientistas, e não como ajudantes. Liderando pesquisas, escrevendo artigos, fazendo investigações próprias, às vezes até como capitãs dos navios. Aos poucos isso está mudando, elas estão recebendo reconhecimento e autoridade. 

E você vê alguma diferença prática na maneira como as mulheres fazem a gestão dessas explorações?

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Acho que sim. A dinâmica do time geralmente é diferente. Quando você tem apenas homens juntos, cada um quer fazer uma coisa diferente, existe uma competição e eles não ouvem ou aprendem uns com os outros. Em times femininos, você vê mais criatividade, mais produtividade científica. O time não está brigando, mas pensando nas coisas juntos. 

As oportunidades para pessoas interessadas em espaço e no oceano estão aumentando e de maneiras diferentes. Você não precisa ir para a universidade, conseguir um doutorado, seguir exatamente o mesmo caminho que eu para conseguir se envolver nessa área e fazer a diferença no mundo. Então pegue a sua curiosidade e faça com que ela te impulsione para frente. 

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