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Britânicos recriam a Amazônia na Cornualha

Experiência cultiva espécies em cúpulas gigantes e climatizadas, por onde turistas caminham e experimentam a sensação de contato com a floresta

Por Luís Bulcão, de St. Austell
Atualizado em 6 Maio 2016, 16h37 - Publicado em 12 Maio 2012, 09h07

A atividade humana também é representada na floresta. Os visitantes podem entrar em uma cabana típica da Malásia, ver o cacau de onde vem o chocolate e examinar uma pequena plantação de soja. Os desmatamentos e queimadas também aparecem em uma exposição

É longo o trajeto para a Cornualha, o braço mais ao sul da maior ilha da Europa, a Grã-Bretanha. Mas além dos penhascos com imensas paredes lapidadas pelo impacto constante do Canal da Mancha e do Mar Celta, ornadas com ruínas de castelos medievais que emergem no imaginário das lendas da Távola Redonda, os britânicos e os visitantes estrangeiros têm outro motivo para percorrer, de carro ou trem, os 439 quilômetros que separam Londres da pequena St. Austell, uma cidade de pouco mais de 20 mil habitantes orgulhosos de uma cervejaria local fundada 1851. A viagem serve para conhecer a Amazônia.

Construídas sobre uma antiga mina de caulinita – onde nada que se plantava crescia – estão as cúpulas dessa experiência única no planeta. As paredes são de etileno tetrafluoretileno (ETFE, um material mais eficiente do que o vidro para regular a temperatura interna) e custaram 80 milhões de libras, quando foram construídas no início de 2000 para abrigarem a maior estufa do planeta. O cenário remete aos arquétipos de estações espaciais humanas em outros planetas que nos acostumamos a ver em filmes de ficção científica. Bolhas gigantes se projetam do solo para proteger as árvores e plantas tropicais do ambiente hostil da Cornualha.

O nome do parque, que recebe diariamente centenas de pessoas interessadas em conhecer o clima e a vegetação de países diferentes como Brasil, Malásia, África do Sul e Grécia, não poderia ser mais sugestivo: Projeto do Éden. Fundado em 2001 e celebrado como uma das maiores ambições concretizadas de engenharia e arquitetura dos tempos atuais, o parque é mais do que uma “Disneylandia ecológica” e procura funcionar como propulsor de conscientização ambiental, lançando projetos ligados ao desenvolvimento sustentável, promovendo shows e eventos pela bandeira ambiental.

Dentro da floresta – A sensação não é imediata ao entrar na maior das bolhas. O bioma tropical, que chega a 55 metros de altura, tem 200 metros de largura e 150 metros de comprimento, simula o habitat encontrado em parte do oeste africano, na Malásia e na Amazônia. Conforme a entrada vai se distanciando, a temperatura aumenta. Aos poucos, o clima fresco primaveril do sul da Inglaterra vai ficando para trás. A umidade do ar, que às vezes chega a 90% na bolha, causa maior sensação de abafamento. Após alguns metros de caminhada, aqueles não acostumados com o calor tropical sentem-se desafiados por uma plaquinha que alerta: “se você estiver sentindo muito cansado e com calor, volte. A trilha segue por mais meia hora”. A maioria balbucia, ergue as mangas, tira os casacos, mas acaba enfrentando a temperatura entre 30ºC e 35ºC para ver coisas que não crescem no velho continente: bambuzais, cacaueiros, bananais, palmeiras, seringueiras.

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O caminho entre árvores, arbustos, riachos e plantas quase transporta para o coração de uma floresta real. No entanto, uma ausência chama a atenção. Na Amazônia verdadeira, o barulho é uma das características mais marcantes. A selva é como uma grande cidade, cheia de animais lutando pela sobrevivência, tão ou mais barulhentos do que o próprio homem. O projeto da Cornualha não pretende ser um zoológico e deixou a turma da bagunça de fora. Houve até a intenção de importar algumas caturritas e papagaios para animar o ambiente, mas eles foram considerados muito destrutivos para as plantas que crescem em cativeiro. Apenas três espécies de pacatos lagartos da Malásia, uma espécie de sapo branco, também da Malásia, e uma espécie de passarinho tropical ganharam o passaporte para a bolha. Mas além de silenciosos, são ariscos e nem sempre se expõem para a gama dos turistas curiosos. O silêncio da Amazônia inglesa é quebrado apenas pelo som de queda d´água proveniente de uma cachoeira artificial, que colabora para a umidade dentro da estufa e enfeita a área designada a representar a América do Sul.

A atividade humana também é representada na floresta. Os visitantes podem entrar em uma cabana típica da Malásia, ver o cacau de onde vem o chocolate e examinar uma pequena plantação de soja. Os desmatamentos e queimadas também aparecem em uma exposição.

O segundo bioma, com 35 metros de altura, 65 metros de largura e 135 metros de comprimento, simula o habitat do Mediterrâneo. Mais familiar para os europeus, a temperatura dentro da estufa varia entre os 9ºC, no inverno, e os 25º, no verão. As plantas cultivadas também são típicas do clima, que varia do quente e seco no verão para o frio e chuvoso no inverno. Além do mediterrâneo, que representa regiões de países como Grécia e Itália, o clima se repete em regiões como sudeste australiano, Califórnia, centro do Chile e África do Sul. A bolha do mediterrâneo abriga mais de mil tipos de plantas, como oliveiras e parreirais. A parte mística da cultura grega é representada em esculturas de figuras mitológicas e o ambiente é alegrado por um restaurante de comida mediterrânea e bons vinhos.

Um terceiro prédio de arquitetura impressionante, inaugurado em 2005, é um complexo com salas de aula e exposições interativas sobre o impacto humano no meio ambiente. Denominado Core (Núcleo) o, edifício, inspirado em um girassol, abriga uma escultura de 70 toneladas de granito que representa uma semente.

Com a camisa suada e ar ofegante após a caminhada pela bolha tropical, Richard Mullins, 47 anos, que nunca visitou uma floresta tropical, descreve a experiência do Éden como colorida e de forte sensação térmica. Ele dirigiu 243 quilômetros de Bristol até a Cornualha para trazer a família para o passeio. Mullins afirma que um dos motivos da viagem foi a conscientização dos filhos, Alana, 13, e Chey, 10. “É triste o que estamos fazendo com o meio ambiente. A maneira como estamos tratando as florestas, devastando a natureza”, disse.

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Sua esposa, Tania, diz que prioriza a educação ambiental em casa. “Tentamos encorajá-las (as crianças) a refletir, a reciclar e a fazer coisas normais, como caminhar, sair na rua, brincar”, diz ela. “Vivemos em um mundo artificial, com televisão, videogame”, completa Mullins.

Após o passeio, como em todos os parques e museus do mundo, os visitantes passam pela loja. No Éden, livros de jardinagem e produtos ambientalmente corretos fazem sucesso. Até uma cerveja leva a marca Eden por ser produzida de forma sustentável – 30 toneladas de ingredientes não aproveitados na fabricação alimentam as criações bovinas e suínas locais. O projeto de paraíso na Cornualha, com uma selva calçada, sem chuva – as plantas recebem água través de um processo de irrigação do subsolo – e sem mosquitos não deixa de ser uma floresta para inglês ver dentro de imensas bolhas de plástico. Mas o teto térmico do Éden, assim como as estações espaciais de ficção científica, também pode ser tudo o que reste para lembrar as florestas em gerações futuras se o mundo falhar em proteger seus sistemas naturais e reais.

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