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Viagens domésticas, mais baratas e longe das aglomerações atraem turistas

Os roteiros internacionais dão lugar a experiências "hiperlocais"

Por Luiz Felipe Castro Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 8 jan 2021, 18h16 - Publicado em 8 jan 2021, 06h00

“Para viajar, basta existir”, sentenciou Bernardo Soares, um dos heterônimos do poeta português Fernando Pessoa (1888-1935), no clássico Livro do Desassossego. A frase pode não ter feito muito sentido em 2020, ano em que o novo coronavírus obrigou bilhões de pessoas a permanecer em casa, mas ganhará novos significados em 2021. Talvez o mais adequado seja “para existir, basta viajar”. Poucas atividades são tão vitais para revigorar o espírito humano quanto desbravar países, ou uma cidade, ou apenas um lugar desconhecido — é um prêmio merecido para compensar o suor de cada dia. Quando a vacina vier, e espera-se que venha rapidamente, é muito provável que uma multidão de viajantes lote hotéis, restaurantes e os Airbnbs da vida, como se quisesse recuperar o tempo perdido na terrível pandemia. Especialistas ressaltam, porém, que o turismo será de um jeito diferente em 2021, e talvez por um bom tempo. Em vez dos roteiros de longa distância, para países e culturas diferentes, entrará em cena o passeio perto de casa, mais barato e, em certos casos, longe de aglomerações.

Segundo a Organização Mundial do Turismo, agência especializada das Nações Unidas, o mercado de viagens internas já era seis vezes maior que o internacional antes do ataque da Covid-19. Agora, a OMT não só projeta o aumento na proporção como indica os deslocamentos regionais como a melhor forma para reaquecer a economia. Em suas últimas diretrizes, sugeriu que práticas como isenções fiscais e folgas prolongadas no trabalho são estimulantes naturais para o setor ­— os profissionais aproveitariam os fins de semana mais extensos para ir à praia ou à cidade vizinha. Em novembro, o Ministério do Turismo do Brasil seguiu o exemplo e apresentou um plano de retomada que inclui, entre outras ações, investimentos no turismo ao ar livre. “Isso será fundamental para a retomada econômica do país”, afirmou o então ministro da pasta, Marcelo Álvaro Antônio.

Os viajantes estão dispostos a aceitar a nova realidade. De acordo com uma pesquisa realizada pelo Airbnb, 62% dos 1 000 clientes consultados disseram que pretendem fazer, em 2021, as chamadas viagens “hiperlocais”, aquelas de até 300 quilômetros de distância, geralmente feitas de carro. Ainda segundo a plataforma de aluguel por temporada, no Brasil a tendência se reflete no aumento de reservas de casas de campo e em cidades litorâneas. O ano da consagração do home office também mudou a percepção da população: 82% dos entrevistados estão interessados em buscar um novo espaço, longe de casa, como parte do trabalho remoto.

NOS ARREDORES - Segundo o Airbnb, as reservas para cidades a no máximo 300 quilômetros de distância são as preferidas -
NOS ARREDORES – Segundo o Airbnb, as reservas para cidades a no máximo 300 quilômetros de distância são as preferidas – (Hans Lucas/AFP)

Diante da nova configuração corporativa, passar semanas em uma casa próxima, com piscina e ao lado da família, se tornou ótima opção. “Acreditamos na tendência do anywhere office, que permitirá uma frequência maior nas viagens de lazer, já que as pessoas poderão trabalhar em qualquer lugar”, afirma Alexandre Moshe, diretor-geral da Decolar, a maior agência de viagens on-line do país. Trajetos de carro, portanto, serão tendência para os próximos anos, o que acabará beneficiando diretamente outros setores. É o caso das locadoras de automóveis. Algumas delas anunciaram recentemente a ampliação da frota para atender ao esperado crescimento da demanda nos meses que virão.

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A própria crise econômica terá papel relevante no estímulo do turismo doméstico. Milhões de brasileiros perderam renda nos últimos meses e um certo grau de incerteza, apesar dos sinais evidentes da retomada, ainda paira sobre o futuro. Preocupado em gastar muito, o viajante tenderá a escolher um destino mais em conta. A alta do dólar é outro fator que, especialmente no caso brasileiro, levará os turistas a olhar para dentro do país. Magda Nassar, presidente da Associação Brasileira das Agências de Viagem, vê a crise como uma enorme oportunidade. “Boa parte da população entende que viajar para fora representa status, mesmo que seja para países sul-americanos”, diz ela. “Isso se arraigou nas últimas décadas. Querer conhecer o mundo é legítimo, mas prestigiar um país com tantas atrações como o Brasil também é importante.”

A tendência do turismo interno já é notada para as férias de verão. Segundo a CVC, a maior operadora de turismo do país, a Região Nordeste lidera as buscas para os próximos meses, em especial destinos como Natal, Maceió, Porto de Galinhas e Salvador. O Rio de Janeiro e suas paisagens exuberantes também estão no radar. Além disso, revela a empresa, destinos ao ar livre, como a Serra Gaúcha, no sul do país, também estão sendo mais procurados. A CVC tomou uma série de providências para impulsionar o turismo interno, como tarifas flexíveis, promoções em visita a parques nacionais e descontos em condomínios voltados para o público de alta renda, antes acostumado a ir para a Europa ou os EUA. O Brasil está muito bem posicionado para a nova realidade do turismo. País de dimensões continentais e com paisagens diversas — de lindas praias a florestas intocadas, de metrópoles a regiões serranas bucólicas —, ele tem vantagens incontestáveis em relação à maioria das outras nações. Talvez tenha chegado a hora de, em vez de Miami e Paris, priorizar as belezas nacionais.

Publicado em VEJA de 13 de janeiro de 2021, edição nº 2720

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