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Traficantes fazem 31 reféns em hotel de luxo no Rio

Bando trocou tiros com policiais militares ao sair de baile funk e buscou abrigo no Intercontinental, em São Conrado. Uma mulher morreu

Por Rafael Lemos e Cecília Ritto
21 ago 2010, 16h06

Bairro fica espremido entre mar e montanha. Moradores revivem o pesadelo da guerra entre traficantes da Rocinha e do Morro do Vidigal

Hóspedes e funcionários do InterContinental Rio – hotel de luxo localizado em São Conrado, na zona sul da cidade – viveram momentos de pânico na manhã deste sábado, quando o hall foi invadido por 10 bandidos armados. O grupo havia trocado tiros com policiais militares nas ruas do bairro e tentou se abrigar na cozinha do estabelecimento, onde 31 pessoas (26 funcionários e 5 hóspedes) foram mantidas reféns por cerca de duas horas.

O gerente geral do Intercontinental, Michel Chertouh, estava no hall no momento da invasão e contou que ouviu um dos criminosos alertar o bando: “É burrice entrar, disse o bandido”, contou Chertouh. Segundo ele, no momento da invasão havia 1.500 pessoas no prédio, entre as quais 250 funcionários.

O hotel foi cercado por policiais do Batalhão de Choque e do Batalhão de Operações Especiais (Bope). Depois de cerca de duas horas de negociação, os 10 criminosos se entregaram às 11h. Antes, porém, o grupo queimou um laptop que a polícia suspeita conter informações sobre a contabilidade do tráfico na Rocinha – uma das maiores favelas do Rio e que concentra a distribuição de drogas para a maior parte da zona sul.

A confusão teve início na Avenida Niemeyer, via que beira o litoral entre os bairros do Leblon e de São Conrado. Dois policiais militares do 23º BPM (Leblon) suspeitaram de um grupo que deixava um baile funk no Morro do Vidigal. Segundo a PM , eram duas ou três vans escoltadas por cerca de 10 motocicletas – num total de mais de 40 pessoas.

Ao serem abordados, os bandidos teriam reagido e começou a perseguição, que se estendeu da Niemeyer até a Avenida Aquarela do Brasil, que liga a praia à auto-estrada Lagoa-Barra, a outra via de acesso entre a Zona Sul e a Barra da Tijuca. No local, teve início um tiroteio com um outro pequeno grupo de policiais chamados em reforço. As avenidas onde ocorreram os confrontos deste sábado formam os principais acessos à principal área dos jogos olímpicos de 2016.

A troca de tiros teria começado por volta das 8h30 da manhã, horário com fluxo reduzido de veículos e pedestres. Os estampidos e a movimentação dos bandidos assustaram quem passava pelas ruas do bairro. Algumas pessoas chegaram a buscar abrigo no Hotel Intercontinental antes mesmo da entrada dos bandidos. Quem estava em casa foi acordado pelo barulho. Muitas pessoas não tiveram coragem de chegar à janela para ver o que acontecia.

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O grupo se dispersou. Parte do bando conseguiu pular o muro de um condomínio e, pelas áreas comuns, chegou à Estrada da Gávea, por onde escapou. Outros traficantes chegaram a invadir a concessionária Fiat Itavema, que teve um dos vidros quebrados. Nenhum dos automóveis da loja foi roubado.

Por volta das 9h, os bandidos tentaram se abrigar no hotel. Segundo funcionários, os traficantes entraram pela primeira porta que avistaram, a da cozinha. Trinta funcionários e cinco hóspedes foram mantidos reféns por cerca de duas horas.

A esta altura, 50 homens do Bope tinham sido deslocados para o local, para cercar o hotel e dar início às negociações. Os traficantes acabaram se entregando e apresentando o arsenal que usou no ataque: oito fuzis, cinco pistolas, três granadas e farta munição.

Quatro policiais foram baleados e uma mulher morreu atingida por um disparo. Ela foi identificada como Adriana Medeiros e, segundo a polícia, tinha uma condenação na Justiça e seria “gerente financeira do tráfico”. Segundo a polícia, entre os 10 bandidos que se renderam, havia dois homens ligados à cúpula do tráfico da favela da Rocinha.

O ex-Secretário Nacional de Segurança Pública, Luiz Eduardo Soares, relatou pelo Twitter o confronto entre os bandidos e a polícia, que começou bem em frente ao edifício em vive. “Estou no Afeganistão? Não. Sou repórter de guerra na zona sul do Rio de Janeiro. Se moradores dos prédios estão assustados, imagino na Rocinha”, escreveu pela manhã. “Tiros de fuzil soaram intensos como se cruzassem quartos e salas dos prédios”, relatou em seguida. “As vias de acesso ao bairro foram fechadas. As pouquíssimas pessoas que estão nas ruas jogaram-se no chão”.

Bairro revive pesadelo – Espremido entre mar e montanha, o bairro de São Conrado tem como acessos principais os túneis que o ligam ao Leblon, em direção à zona sul, e à Barra da Tijuca, em direção à zona oeste. Os outros caminhos são a Avenida Niemeyer e a estrada da Gávea, que passa por dentro da mata e, parte dela, corta uma parte da Rocinha.

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Nos últimos dez anos, a repetição de episódios em que traficantes rivais da Rocinha e do Morro do Vidigal se enfrentaram acabaram criando um trauma que teve, como efeitos colaterais, a desvalorização imobiliária e o esvaziamento de parte das atividades econômicas. Ironicamente, é em São Conrado que fica um os centros de consumo de alto luxo no Rio, o São Conrado Fashion Mall.

Entre os que viveram momentos de pânico estava o ex-jogador de vôlei Tande, que passava por São Conrado. Ele relatou ao RJTV que quando passou pelo túnel Dois Irmãos começou a escutar o barulho de tiros. “Ficamos parados no meio do tiroteio, muito tiro, muito tiro. E no meio do tiroteio vejo uma menina desesperada, indo pro chão. Vários homens indo para o chão também. Como escutei um barulho de tiro, vi dois carros e um espaço, eu falei’ vou entrar no meio dos dois’. Quando eu botei meu carro ali, vem um carro da polícia e bate em mim. Foi um momento desesperador. De prazer, virou um caos, uma sensação de pesadelo.”

Política – Em campanha na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, neste sábado, o candidato do PSDB à Presidência, José Serra, classificou de “petulante” a ação de bandidos que invadiram o Hotel Intercontinental. “A ação foi ousada, provocadora, tendente a desestabilizar as questões da segurança e atrair o receio internacional em relação ao nosso país”.

O tucano aproveitou ainda para reafirmar a promessa de criar um Ministério da Segurança. “Isso precisa ser enfrentado com estrutura. Senão, essas coisas vão se repetir sem parar”. Até o momento, as candidatas Dilma Rousseff (PT) e Marina Silva (PV) não comentaram o episódio.

O governador Sérgio Cabral elogiou a ação da polícia. “Eles foram firmes e profissionais.” O secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, disse que esse episódio não vai alterar a política de ocupação pacífica das favelas do Rio de Janeiro.

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