Quando comentou o sequestro de um ônibus de passageiros na ponte Rio-Niterói na manhã desta terça-feira, 20, o presidente Jair Bolsonaro (PSL) relembrou um caso que aconteceu há quase duas décadas: o do ônibus 174, em 11 de junho de 2000, que terminou de forma trágica, com uma professora morta em uma ação desastrosa da Polícia Militar.
No sequestro de hoje, a ação criminosa foi encerrada depois de três horas com o tiro de um atirador de elite que acertou o sequestrador em um dos momentos em que ele estava fora do coletivo, sem usar nenhum refém como escudo-humano. Situação bem diferente da de 2000, quando a refém Geisa Firmo Gonçalves foi baleada no momento em que o bandido Sandro do Nascimento deixou o ônibus, com a professora colada ao seu corpo.
A perícia mostrou que o primeiro tiro que atingiu Geisa partiu da arma do policial Marcelo Oliveira dos Santos, um recém-formado agente do Bope então com 27 anos. Os demais, do sequestrador, que atirou à queima-roupa contra a refém. O criminoso, preso, foi assassinado por asfixia dentro de uma viatura da PM logo depois.
“A ordem superior era fazer qualquer coisa, menos atirar. Não foi usado sniper. Resultado, foi a morte de uma professora inocente. Depois, esse vagabundo morreu dentro do camburão. Os policiais do camburão foram submetidos a júri popular. Foram absolvidos por 4 votos a 3. Quase você bota na prisão o policial que matou um marginal como aquele do sequestro do ônibus 174”, afirmou Bolsonaro.
Além de não ter se exposto como o sequestrador do ônibus na ponte Rio-Niteroi, o comportamento de Sandro do Nascimento também elevou o grau de complexidade daquela situação. Drogado, o bandido ironizava a situação e chegou a ordenar que uma passageira escrevesse ameaças nos vidros do veículo. Num gesto de desespero, chegou a ordenar que alguns reféns deitassem no chão do ônibus, atirando ao redor deles, para assustá-los.
Desde aquele sequestro, em 2001, situações com reféns no Rio de Janeiro são especialmente traumáticas. Em rede nacional de TV, a população do Rio e a polícia descobriram juntas, da pior forma, que seus agentes de segurança não estavam preparados para evitar que esse tipo de cenário evoluísse para um circo de horrores. Mas o caso do ônibus 174 tornou-se um divisor de águas.
O sistema foi reconstruído, a começar por algumas mudanças estratégicas primárias. Desde então, os negociadores são tão ou mais importantes e preparados que os atiradores. Em 2011, o sequestro de um ônibus que seguia do centro do Rio para Duque de Caxias também evoluiu para uma situação com reféns. E, apesar do lamentável desfecho com quatro feridos, a situação se resolveu no prazo de uma hora.
A população do Rio passou a valorizar os negociadores. E entendeu, pelo desfecho de outras situações semelhantes, que há como se evitar – ou amenizar – as grandes tragédias nesse tipo de situação. Em uma delas, negociador e atirador saíram aplaudidos. Em 25 de setembro de 2009, um criminoso manteve refém a dona de uma farmácia no bairro de Vila Isabel, na zona norte.
Enquanto um policial negociava com o bandido, que ameaçava detonar uma granada junto ao corpo da mulher, outro agente se posicionou no prédio em frente. Na primeira oportunidade clara, e de acordo com todo o treinamento que recebeu, o atirador atingiu em cheio a cabeça do assaltante. A polícia saiu aplaudida.
Em 21 de agosto de 2010 os negociadores do Batalhão de Operações Especiais (Bope) tiveram que lidar com um quadro ainda mais complexo: um bando de traficantes armados, que havia trocado tiros com a polícia na saída de um baile funk, invadiu o Hotel Intercontinental, em São Conrado, na zona sul, e fez 31 reféns.
Foram necessários 50 minutos para convencer a quadrilha a abandonar as armas e se entregar. Dez criminosos foram presos, e os policiais evitaram, além da tragédia no local, uma repercussão que seria danosa para a cidade que assumiu o compromisso de abrigar, nos próximos anos, as maiores competições mundiais do esporte e um número incontável de eventos internacionais.