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Pacificação de favelas devolve ao Rio alguns de seus melhores cartões-postais

Turismo em morros como Dona Marta, Babilônia e Pavão-Pavãozinho atrai visitantes e alimenta um novo mercado. A paisagem é só a primeira descoberta

Por Cecília Ritto Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 17 jul 2011, 09h43

Para os mais interessados em vivenciar a rotina da favela, existe a possibilidade de almoçar na casa de um morador para conhecer o modo de vida das pessoas e ainda conversar com quem é de lá

“Tira uma foto com a estátua do Michael Jackson, para poder dizer que você esteve no Santa Marta”. A frase é de um morador da favela de Botafogo, zona sul do Rio de Janeiro, para o italiano Federico Porracin, 24 anos. A situação é nova para os dois. O primeiro está se acostumando a orientar visitantes que querem conhecer o morro, que até pouco tempo atrás era território proibido para quem vinha ‘do asfalto’. Porracin é integrante de um contingente de estrangeiros, moradores de outros estados e até de cariocas que se sentem à vontade para descobrir pontos de vista da cidade, e da própria favela, que o tráfico de drogas manteve longe da maior parte da população.

“Explica para ele”, pede o morador, dirigindo-se a Priscilla de Araújo, 24 anos, que acompanhava e traduzia tudo para o amigo europeu. Para ela, o encontro com o morro também era uma novidade, apesar de morar bem perto do Santa Marta. A estátua do cantor é um dos pontos mais visitados por quem não é da área. Mas há muito mais para se ver em becos, trilhas e lajes, onde sotaques estranhos e idiomas complicados são cada vez mais ouvidos.

A pacificação das favelas abriu espaço para um turismo sem riscos de bala perdida. Mas nem todas as 17 localidades com Unidades de Polícia Pacificadora (UPP) são necessariamente pontos turísticos. Cinco favelas têm e exploram efetivamente passeios para turistas: Santa Marta, em Botafogo; Chapéu Mangueira e Babilônia, no Leme; e Cantagalo e Pavão-Pavãozinho, nas encostas de Ipanema e Copacabana.

O primeiro atrativo, de cara, é a vista. Do alto do Santa Marta é possível ver o bairro de Botafogo, o Cristo Redentor, Rocinha e Vidigal, Lagoa Rodrigo de Freitas, Forte de Copacabana e Pão de Açúcar. Abaixo do Cantagalo estão a praia e o bairro de Ipanema. Mas a melhor de todas as visões fica no morro da Babilônia. Da parte baixa até o alto da favela leva-se aproximadamente uma hora de caminhada, incluindo uma trilha ecológica. No final da andança, o cansaço é recompensado com um cenário extasiante de todos os pontos turísticos do Rio. De cima da pedra do Babilônia, avista-se no pé do morro: Cristo Redentor, Pão de Açúcar, enseada de Botafogo com os seus iates – que, do alto, parecem pequenos brinquedos -, Praia do Flamengo, centro da cidade, ponte Rio-Niterói e Praia de Copacabana.

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É difícil parar de olhar para o horizonte, e em dias de céu claro com sol de inverno, o azul do céu e do mar é ainda mais intenso. Mas o melhor é o visitante não dar as costas para o que vai encontrar pelo caminho. Passar pelos becos, conhecer um pouco dos hábitos, perceber os gostos musicais dos moradores e ser informado sobre a história e a cultura desses locais também faz parte do passeio. Vitor Lira, de 30 anos, é um dos guias do Santa Marta. Ele leva os visitantes pelo plano inclinado até o alto do morro e desce pelas mínimas vielas, onde estão placas sinalizando os pontos turísticos. Durante o circuito, Lira conta as histórias do tempo de criminalidade vivido por lá, como sempre pedem os visitantes.

Para os mais interessados em vivenciar a rotina da favela, existe a possibilidade de almoçar na casa de um morador para conhecer o modo de vida das pessoas e ainda conversar com quem é de lá. Considerada uma ‘favela-modelo’ do Rio, o Santa Marta, primeiro a receber uma UPP, tem investido no setor turístico. Ela já apresenta placas sinalizando os pontos turísticos, com legendas em inglês. No local, também foi aberta uma loja de produtos eletrônicos para garantir aos visitantes que tenham pilhas e câmeras fotográficas durante o passeio.

Aos poucos os moradores descobrem novas formas de satisfazer as necessidades e curiosidades do turista. E, para quem sentir saudade dos tiros, há até a possibilidade de disputar uma partida de PaintBall, desde que com o agendamento prévio. Afinal, há gosto para tudo.

No caso do Chapéu Mangueira, existe a chance de se hospedar em um albergue, inaugurado em novembro do ano passado. O Favela Inn pertence ao morador Vitor Medina, 32 anos, que também acompanha grupos estrangeiros e ainda tem uma barraca na Praia do Leme. Ele cobra 25 reais a diária, com café incluído, durante a baixa-temporada. Na alta-temporada, a tarifa sobe para 50 reais. E, em tempos de Réveillon – quando dali tem-se uma das melhoras vistas para os fogos de Copacabana – e Carnaval, o valor chega a 100 reais.

Outro destaque do Chapéu Mangueira é o Bar do David, que ganhou a terceira colocação no campeonato de Comida Di Boteco com o prato Tropeiro carioca. Ao preço médio de 10 reais a refeição, o bar abriu espaço para a chegada de pessoas de fora ao morro. Além das comidas mais comuns, como frango, contra-filé e peixe, há feijoada de frutos do mar e o tropeiro, que entrou para o cardápio da casa às quintas e sextas.

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Para o diretor do departamento de turismo da UniverCidade, Bayard Boiteux, o turismo nas favelas é uma nova oportunidade de mercado. “O turista cada vez mais quer ter experiência cultural. E, quando ele visita uma favela, consegue isso. Ele volta para casa e conta que passeou e tirou fotos na favela. Isso contribui para que a imagem do país seja mais positiva”, conta.

Em comum nessas cinco favelas, a preocupação com a valorização da história de cada uma. O Cantagalo compõe, com o Pavão-Pavãozinho, o primeiro museu de território, reconhecido pelo Instituto Brasileiro de Museus (Ibram). O Museu de Favela propõe um passeio cultural pelas ruelas da favela. No roteiro estão a Casas Tela, onde há pinturas feitas pelos próprios moradores nas fachadas das residências.

No Dona Marta, o turista aprende também a desfazer uma confusão de nomes. “Dona Marta” é o nome do morro; Santa Marta é o nome da favela, assim batizada por causa da capela.

Para o policial que atualmente comanda as UPPs, coronel Robson Rodrigues da Silva, o turismo nas favelas repete, no Rio, um processo que criou áreas turísticas e novos cartões-postais em outras partes do mundo. “Imagina se é pacificada a Faixa de Gaza. As pessoas vão querer conhecer. Assim como é o caso do Muro de Berlim, que os turistas querem visitar, chegar perto. As favelas são pontos turísticos não só pelas vistas bonitas, mas pelo momento que elas vivem”, acredita.

Alemão – Algumas favelas, apesar de não terem a vista exuberante, estão despertando o interesse de quem é de fora. Poder chegar perto e entrar no Complexo do Alemão, um dos lugares mais perigosos do Rio até o final do ano passado, é no mínimo curioso. O teleférico instalado no local permite uma visão panorâmica da imensidão que é esse conjunto de favelas. Além dos moradores que lotam as filas para passear pelo novo transporte, visitantes vêem nele a oportunidade de conhecer, de cima, o antigo bunker do tráfico. E, por isso, o teleférico carrega a chance de se tornar um novo ponto turístico.

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O guia e professor Milton Teixeira levará, em agosto, cerca de 40 senhoras moradoras do Leblon, a maioria da terceira idade, para o Alemão. Até hoje, ele só levou turistas à Igreja da Penha. Para guiar o grupo ao conjunto de favelas, terá de fazer um laboratório pela área nos próximos dias. De certeza, por enquanto, só uso do teleférico – que até elas querem conhecer de perto.

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