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A família Busca-Pó está na mira da PF

No rastro de apreensões recordes de drogas nos portos, policiais procuram casal que enviou cerca de 4 toneladas de cocaína à Europa em dois meses

Por Eduardo Gonçalves Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 13 set 2019, 09h55 - Publicado em 13 set 2019, 06h30

Do casamento nasceu uma carreira profícua no tráfico de drogas. Karine Campos, natural de Mato Grosso do Sul, tinha o contato de produtores de cocaína na Bolívia. Marcelo Mendes Ferreira, da Bahia, sabia o caminho para os distribuidores do interior do estado. Era a união perfeita que ligava as duas pontas no negócio do pó. Em 2009, quando foram presos, os dois chefiavam um grupo pequeno que agia em Alagoinhas e Camaçari. O transporte do entorpecente era feito por meio de “mulas” em ônibus de linha ou carros velhos. Acabaram soltos em menos de seis meses. Dez anos depois, ambos voltariam a entrar no radar das autoridades, desta vez como uma das maiores quadrilhas do país nesse negócio, com atuação nos portos de Santos, Paranaguá, Navegantes, Itajaí e Salvador.

Principais alvos da Operação Alba Vírus, da Polícia Federal, no fim de agosto, Karine e Marcelo conseguiram escapar. A mesma sorte não tiveram as outras doze pessoas que pertenciam à quadrilha, entre elas Sandra de Oliveira, mãe de Karine. O casal é acusado de liderar um esquema sofisticado, com duas empresas de logística, trinta caminhões e uma importadora em Madri, na Espanha, que recebia a mercadoria. A gangue adquiria produtos como carne, ardósia e amianto para disfarçar o principal item de exportação: tabletes de cocaína com mais de 95% de pureza. Entre novembro e dezembro de 2018, o grupo enviou cerca de 4 toneladas da droga à Europa pelo Porto de Paranaguá (PR). A carga é avaliada em 630 milhões de reais. Não por acaso, os pacotes vinham com a imagem de uma barra de ouro. A quantidade exportada em dois meses é quase a mesma apreendida — 4,7 toneladas — nesse porto em 2018.

As remessas passaram ilesas pelos scanners, mas foram registradas em vídeos de celular pela própria quadrilha. O objetivo era enviar as gravações aos europeus como garantia de que a droga havia sido embarcada e para indicar o local onde estava escondida. “Eles deviam fazer isso há tanto tempo que nem se preocuparam mais em esconder o rosto”, diz a delegada Fabiana Lopes Salgado.

Cada vídeo foi armazenado em um celular diferente, que deveria ser descartado. A PF encontrou alguns desses aparelhos no forro de uma casa em Guarujá, no litoral paulista, em fevereiro, ao seguir um ex-PM integrante da quadrilha. No local, achou também duas CNHs falsas com a foto de Karine. Nos vídeos, foram identificados Marcelo e o empresário Eduardo Cardoso, em cujo nome está a importadora Broker, de Madri. Em julho, ele teria comprado uma carga de fígado de frango congelado com recheio de 1,4 tonelada de cocaína. Enquanto o casal era discreto e se comunicava por mensagens criptografadas, Cardoso gostava de se gabar de seu trabalho nas redes sociais. Chamado de “Comendador”, em referência a um personagem da novela Impé­rio, postava fotos ao lado de contêineres com mensagens de autoajuda. “Foque em ser produtivo ao invés (sic) de ser ocupado”, dizia uma delas.

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Na prisão realizada em 2009, a quadrilha foi pega com 5 quilos de cocaína, cinco carros e 3 300 reais. Na ocasião, acabaram também na cadeia a mãe, o pai e a irmã de Marcelo. Desta vez, segundo a PF, o casal escapou por um golpe de sorte, já que nem teve tempo de sumir com os 31 milhões de reais achados em endereços ligados ao esquema. Também foram localizados dez carros de luxo, entre Land Rovers e BMWs, vinte caminhões, uma lancha e imóveis avaliados em 25 milhões de reais.

OPERAÇÃO – O Porto de Santos, em 2018: 2 toneladas confiscadas (Antonio Milena/VEJA)

A ascensão da família no mundo do crime acompanhou o crescimento acelerado do negócio do pó na última década. Em 2018, a PF e a Receita bateram o recorde de apreensão de cocaína nos portos — 32,3 toneladas. Neste ano, já superaram a marca histórica: de janeiro a agosto, foram interceptadas mais de 33,6 toneladas. O aumento da repressão não é a única explicação para o fenômeno. A produção mundial de cocaína aumen­tou à taxa de 25% e o consumo na Europa subiu 70% nos últimos oito anos, segundo relatório mais recente da ONU sobre o assunto. Como a maior parte da droga é produzida na Bolívia, na Colômbia e no Peru, o Brasil é o principal corredor para a Europa e a África. “Não é possível dizer que as apreensões impactaram o mercado. Basta ver que o preço da droga segue inalterado”, diz Guaracy Mingardi, ex-subsecretário Nacional de Segurança Pública.

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Só em São Paulo, que abriga o Porto de Santos, o maior da América Latina, a apreensão de drogas cresceu mais de 80% neste ano. Para o secretário de Segurança Pública, general João Campos, isso é o resultado de megaoperações policiais nas rodovias e do uso cada vez maior de scanners, drones e cães. O governo vai comprar mais 105 drones (tem trinta) e criar um batalhão específico de cães. “O nosso lema é apreender e destruir mais, 24 horas por dia”, diz.

A Alba Vírus foi comemorada pelo ministro da Justiça, Sergio Moro. “A polícia do governo Jair Bolsonaro é dura contra as drogas”, disse. Mas o problema está longe de ser resolvido. Segundo agentes da Receita, a cada tonelada interceptada, ao menos 5 são embarcadas. E falta encontrar os líderes do grupo. Até a quinta 12 não havia pistas sobre o paradeiro do casal. Karine e Marcelo devem ser incluídos na lista vermelha da Interpol, que reúne criminosos com mandados de prisão procurados internacionalmente.

Publicado em VEJA de 18 de setembro de 2019, edição nº 2652

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