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Em meio à onda de criminalidade, bancada da bala ganha força no Congresso

Grupo político chega a comissões relevantes na Câmara e alavanca a pauta que aumenta o punitivismo no país

Por Victoria Bechara, Valmar Hupsel Filho 24 mar 2024, 08h00

Quando chegou à Presidência em 2018, Jair Bolsonaro provocou uma onda eleitoral que levou ao Legislativo federal centenas de candidatos que carregavam não só o discurso conservador nos costumes, mas também um olhar para a área de segurança pública que prega o aumento da força e do punitivismo como principal arma de combate à criminalidade. Durante o governo passado, propostas desse tipo foram apresentadas em grande quantidade, mas não andaram porque não encontraram o necessário apoio no Legislativo. O cenário, no entanto, começa a mudar. Em meio à atual crise de segurança, a célebre bancada da bala passou a dar as cartas no assunto, ao se estabelecer no comando de duas das comissões mais importantes da Câmara: a de Constituição e Justiça, com Caroline de Toni (PL-SC), e a de Segurança Pública, com Alberto Fraga (PL-DF). A poderosa CCJ, aliás, era comandada até então pelo PT. Na sua estreia na comissão, Caroline de Toni já priorizou projetos para endurecer penas a quem comete crimes com reincidência ou contra pessoas vulneráveis. “Uma boa parcela da sociedade entende como necessárias as pautas que a gente defende: de vida, liberdade, propriedade, defesa do agro”, disse a deputada ao programa Os Três Poderes, de VEJA.

Embora algumas manobras regimentais possam retardar a tramitação de algumas dessas pautas, a sensação é de que o empoderamento da bancada da bala será difícil de confrontar. Há um pacote robusto em andamento nas duas comissões com medidas mais duras no combate à violência — em contraste com a agenda de direitos humanos que o governo Lula tenta priorizar. Exemplos das medidas em discussão: elevar a pena máxima de trinta para oitenta anos — o que, na prática, seria a adoção da pena perpétua — e o fim de benefícios aos presos, como as saídas temporárias, as progressões de regime e a remição de penas. Há, ainda, uma ofensiva contra movimentos de esquerda, como os dos sem-terra, visando classificá-los como terroristas ou permitir ao proprietário que recupere a fazenda tomada com o uso da própria força (veja o quadro).

Acenar ao cidadão acuado pelo aumento da criminalidade é algo que movimenta a classe política, ainda mais em ano eleitoral. “O atual modelo de segurança não está funcionando”, afirma Alberto Fraga. No início do mês, os comandantes dos estados do Sul e do Sudeste, reunidos em um consórcio, firmaram um pacto regional que propõe o endurecimento das leis penais. Outro exemplo que ilustra bem o apelo da pauta é o do projeto que acaba com as “saidinhas” de presos. A iniciativa andou — já foi aprovada no Congresso — porque foi bancada por governadores como Tarcísio de Freitas (São Paulo), Romeu Zema (Minas Gerais) e Ronaldo Caiado (Goiás), todos potenciais presidenciáveis em 2026.

O alvoroço em torno do fim da saidinha foi tão grande que Guilherme Derrite, secretário da Segurança Pública de São Paulo, mesmo no olho do furacão por conta das críticas que vem recebendo pelo saldo macabro dos enfrentamentos da PM com o crime organizado na Baixada Santista (mais de quarenta mortes desde o começo do ano), pediu licença do cargo e voltou à Câmara para retomar o papel de relator do projeto. A proposta inicial, de 2011, promovia apenas mudanças nas regras, como a previsão de monitoramento por tornozeleira eletrônica. Segundo o texto aprovado no Senado, que é bem mais radical, o benefício fica restrito aos presos em regime semiaberto que frequentem curso supletivo profissionalizante ou de instrução do ensino médio ou superior. Na quarta 20, a Câmara aprovou o texto em votação simbólica. Agora o projeto será submetido à sanção (ou veto) de Luiz Inácio Lula da Silva.

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GUINADA - Caroline de Toni, à frente da CCJ: colegiado era presidido pelo PT
GUINADA - Caroline de Toni, à frente da CCJ: colegiado era presidido pelo PT (Bruno Spada/Câmara dos Deputados)

O assunto chega à mesa do presidente num momento delicado, pois a atual crise de segurança afeta os índices de aprovação do governo. Embora existam bons argumentos em defesa da manutenção da saidinha, esse direito não é bem entendido por grande parte da população — e casos de presos que voltam a cometer crimes nesse período colocam sempre fogo ao debate. Se decidir vetar o projeto (o prazo de apreciação é de quinze dias), além de bancar uma decisão impopular, Lula irá bater de frente com a vontade do Congresso, o que está longe de ser bom para um governo com enorme dificuldade em sustentar uma base parlamentar. É positivo que autoridades priorizem medidas para combater a criminalidade, mas elas precisam ter amplo embasamento técnico, de forma a se afastarem do simples apelo demagógico. Não é apenas invertendo a bússola ideológica, da esquerda (dos “direitos humanos”) para a direita (da lei do “bandido bom é bandido morto”), que o Brasil terá paz nessa área.

Publicado em VEJA de 22 de março de 2024, edição nº 2885

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