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“Amo problemas difíceis”, diz brasileiro que ajudou no avanço de teorema

Marcelo Campos, 23 anos, cravou seu nome no panteão da matemática

Por Duda Monteiro de Barros 3 jun 2023, 08h00

Sempre fui um aficionado de números, brincava com eles, que viviam a minha volta, mas nunca imaginei que teria a capacidade de resolver um problema tão antigo da matemática. Quando criança, lá pelos meus 10 anos, já tinha a compreensão de que queria seguir na área. No ensino médio, estudava por conta própria materiais da faculdade e, no último ano da escola, ingressei num grupo de estudos da Universidade de São Paulo. Foi aí que comecei a revelar um especial interesse por conteúdos de análise combinatória. Pode soar estranho um adolescente se apaixonar por um campo tão específico. Tive a sorte de encontrar logo de cara aquilo que me trazia profunda felicidade. Terminei o colégio, no fim de 2016, e fui fazer um curso de verão do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa). Desde então, concluí a faculdade de matemática aplicada na Federal do Rio de Janeiro e, em paralelo, o mestrado e o doutorado no mesmo Impa.

No início de 2021, decidi encarar um dos projetos mais desafiadores da minha carreira. Junto com meu orientador Robert Morris e com meus colegas Simon Griffiths e Julian Sahasrabudhe, todos da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, mergulhei de cabeça no Teorema de Ramsey, que nasceu em 1930 e não registrou avanços em seu desenvolvimento desde 1935. É uma questão combinatória aparentemente simples, boba. Ela é capaz de esclarecer, por exemplo, quantas pessoas você precisa reunir em uma rede social para ter certeza de que ali haverá um grupo de 100 usuários que se conheceram ou, ao contrário, que não têm nenhum tipo de conexão entre si. Parece fácil, certo? Pois não tem nada de trivial, e é justamente isso o que mais gosto nessa área do conhecimento humano — buscar respostas complexas para perguntas básicas. Muita gente acha que vivemos numa bolha, que não há aplicação prática dessas coisas no dia a dia. Mas o que faço está estritamente relacionado ao avanço da epidemiologia, das finanças e da ciência da computação.

Passamos dois anos seguidos absolutamente obcecados com o teorema. Às vezes, achávamos que tínhamos chegado a uma conclusão, mas aí parávamos para revisar e descobríamos um pequeno erro no meio do cálculo que invalidava o resultado. Quando nos juntávamos, ficávamos horas e mais horas na frente de um quadro cheio de números. Eu chegava ao final do dia exaurido. Foi de uma emoção indescritível o momento em que, finalmente, revisamos toda a equação e percebemos que estava correta. Aquele era o primeiro avanço do teorema em 88 anos, um feito para a matemática. Essa jornada veio acompanhada dos mais distintos sentimentos. Primeiro, há o sofrimento por estar preso naquilo por meses ou até anos. Mas essa aflição é o meu motor. Me recuso a abandonar uma questão só porque a resposta parece, a princípio, impossível. Me divirto intensamente quando vejo pequenas evoluções. Uma sorte ter um trabalho que tanto me move.

Sei que a maioria das pessoas, principalmente crianças e adolescentes, não é grande fã de matemática. Normalmente, o que aprendem na escola é uma disciplina engessada, em que é preciso memorizar uma dezena de fórmulas, que nem sentido parecem fazer. Queria que todos esses alunos descobrissem, assim como eu, a beleza do universo dos números. Existe ali um lado divertido e criativo que é pouco conhecido. Não se trata de aplicar uma fórmula — isso o computador já faz. Meu trabalho hoje é pensar soluções inovadoras para problemas que ninguém nunca conseguiu solucionar. Vencida a questão do Teorema de Ramsey, estou pronto para alçar outros voos. Fui aprovado no pós-­doutorado da Universidade de Oxford e tenho planos de permanecer quatro anos na Universidade de Cambridge, estudando. A brincadeira está só começando.

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Marcelo Campos em depoimento dado a Duda Monteiro de Barros

Publicado em VEJA de 7 de junho de 2023, edição nº 2844

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