Assine VEJA por R$2,00/semana
Imagem Blog

Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO

Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)
Continua após publicidade

Os tormentos de Bolsonaro

O discurso do presidente revela um político que se sente acuado no poder

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 18 nov 2020, 15h23 - Publicado em 11 nov 2020, 15h19

A quantidade de ultrajes ditas pelo presidente Jair Bolsonaro na solenidade de terça-feira, 10, no Palácio do Planalto, encobrem um político que se sente acuado. O Bolsonaro que  ameaçou “com pólvora” o presidente eleito dos Estados Unidos, minimizou mortes e ofendeu a quem lhe desagrada não estava nervoso ou surtado. O que se assistiu nesta semana foi a confissão de um homem atormentado com o peso do cargo.

A seguir algumas frases de Bolsonaro no discurso :

“Como chefe de Estado, tenho que tomar decisões, que não me deixaram tomar. Não sei por que cargas d’água. E nós temos que decidir e, decidindo, nós podemos acertar. Não decidindo, já erramos”

“O que faltou para nós não foi um líder. Faltou deixar um líder trabalhar. Que eu fui eleito para isso”

Continua após a publicidade

“Minha vida aqui é uma desgraça. É problema o tempo todo, não tenho paz para absolutamente nada. Não posso mais tomar um caldo de cana na rua, comer um pastel. Assim quando saio vem essa imprensa perturbar”. 

“A minha cadeira (de presidente) está à disposição. Não sou super-homem. Naquela pipoca lá tem kriptonita ou um formigueiro”. 

“Alguém acha que eu tenho um tesão em estar naquela cadeira? Está completamente equivocado”.

Continua após a publicidade

“Desculpem algum exagero, alguma coisa. É um desabafo, porque eu passei 28 anos dentro da Câmara e pedi a Deus para ter uma oportunidade um dia de mudar o Brasil. Eu posso até não mudar, mas eu vou tentar. Não estou preocupado com a minha biografia, se é que eu tenho biografia”.

A autocomiseração do presidente com as agruras do cargo não é nova, mas poucas vezes, Bolsonaro deixou tão público o seu abatimento. O que mudou do Bolsonaro fanfarão de tempos atrás?

Para começar, a vitória de Joe Biden. Por mais que o efeito das eleições americanas seja indireto, parece claro que o Palácio do Planalto não trabalhava com a hipótese de ter um democrata na Casa Branca. Sem Donald Trump, Bolsonaro fica à descoberto no mundo, seja na política pró-devastação da Amazônia, seja na retórica antiglobalista na diplomacia. 

Continua após a publicidade

Biden também significa que, sim!, é possível à oposição se livrar de um líder populista nacionalista de extrema-direita pelo voto. Isso reascendeu as articulações na oposição, seja no encontro Luciano Huck-Sergio Moro em outubro, seja no de Luiz Inácio Lula da Silva-Ciro Gomes em setembro.

No discurso no Planalto, Bolsonaro fez seguidos apelos aos eleitores sobre o risco de perder a reeleição.

Primeiro se comparou ao ex-presidente argentino Maurício Macri, que deixou o governo em 2019. “O Macri na Argentina, é história, não conseguiu implementar as suas políticas. Começou a levar pancada dos seus seguidores, como levo agora também. Voltou a turma da Kirchner, Dilma, Maduro, Evo, que já está na Bolívia uma hora dessas de volta”.

Continua após a publicidade

Depois falou da possibilidade de surgir um candidato novo (Huck ou Moro): “Não teremos um líder feito em um prazo de 2 anos (tempo até as eleições em 2022), não vai aparecer. A não ser, em cima da grana, aí, aparece. Comprando um montão de coisas por aí. Em especial os marqueteiros. Fora isso, não terão outros líderes, em tão curto espaço de tempo”.

Então, pessoal (empresários do turismo que o ouviam), nós temos que buscar mudanças. Não teremos outra oportunidade. Aí, vem uma turminha aí, falar de, ah, queremos um centro, nem ódio para lá, nem ódio para cá. Ódio é coisa de maricas, pô. No meu tempo de bullying na escola, era porrada. Agora, se chamar um cara de gordo é bullying. Nós temos como mudar  o destino do Brasil. Não terão outra oportunidade”.

E citou os possíveis adversários Fernando Haddad e João Doria: “Imagina se tivesse um Haddad no meu lugar? Ou se tivesse um governador de São Paulo em meu lugar? Como é que estaria o Brasil? Que desgraça estaria esse país? Semelhante aqui ao sul, Argentina, onde eles fecharam tudo”. 

Continua após a publicidade

Este Bolsonaro que se sente vítima da incompreensão dos eleitores já havia se revelado na mesma manhã de terça, quando na saída do Palácio do Alvorada, o presidente foi abordado por um apoiador. “O senhor está triste”, perguntou. “Ah, é só problema, né, cara”, respondeu o presidente. Depois o presidente reclamou porque o seu candidato (Celso Russomanno) vai perder em São Paulo. “Os prefeitos que fecharam as cidades, tiraram emprego, por que esses caras estão na frente das pesquisas, meu Deus do céu? Parece que o cara eleitor gosta daquilo, daí reclama. Igual a São Paulo, o prefeito lá [Bruno Covas] soldou até porta de comércio e está em primeiro lugar nas pesquisas”.

Todos os candidatos apoiados por Bolsonaro nas eleições municipais estão mal nas pesquisas, uma demonstração de fraqueza já percebida pelos políticos. A campanha eleitoral abriu espaço para as oposições nas redes de rádio e TV e, na maioria das capitais, um dos efeitos foi a redução da popularidade do presidente.

À fragilidade política se soma o risco econômico. Passados seis meses, o governo Bolsonaro ainda não encontrou uma fórmula para fazer sobreviver o Auxílio Emergencial, o benefício que salvou 67 milhões de brasileiros da miséria e anabolizou os índices de popularidade do presidente.

No discurso, o presidente perguntou: “Acaba o Auxílio Emergencial em dezembro, como ficam esses quase 40 milhões de invisíveis, Onyx (Lorenzoni, ministro da Cidadania? Que perderam tudo agora. O catador de latinha, não tinha latinha para catar na rua. Não tinha como vender um biscoito Globo na praia. Não tinha como vender um mate na arquibancada, no estádio de futebol”. O próprio presidente não sabia a resposta para sua pergunta.

As divagações de Bolsonaro são os tormentos quem está num labirinto e não sabe como sair.

Publicidade

Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

Domine o fato. Confie na fonte.

10 grandes marcas em uma única assinatura digital

MELHOR
OFERTA

Digital Completo
Digital Completo

Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 2,00/semana*

ou
Impressa + Digital
Impressa + Digital

Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

a partir de R$ 39,90/mês

*Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
*Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.