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Por Sérgio Rodrigues
Este blog tira dúvidas dos leitores sobre o português falado no Brasil. Atualizado de segunda a sexta, foge do ranço professoral e persegue o equilíbrio entre o tradicional e o novo.
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Por que as poetisas estão virando poetas?

“Caro Sérgio, lendo uma matéria sobre a belíssima Alice Sant’Anna, chamou-me a atenção o termo usado para descrever seu ofício: poeta. Há tempos percebo que a forma ‘poetisa’ foi limada dos textos em geral e caiu em desuso pelos falantes do português. Essa tendência é uma evolução natural da língua ou um reflexo das questões […]

Por Sérgio Rodrigues
Atualizado em 31 jul 2020, 03h46 - Publicado em 28 Maio 2014, 10h45

alice sant'anna

“Caro Sérgio, lendo uma matéria sobre a belíssima Alice Sant’Anna, chamou-me a atenção o termo usado para descrever seu ofício: poeta. Há tempos percebo que a forma ‘poetisa’ foi limada dos textos em geral e caiu em desuso pelos falantes do português. Essa tendência é uma evolução natural da língua ou um reflexo das questões de gênero tão intrínsecas à arte literária? Gostaria de saber sua opinião.” (Luís Carlos Durans)

Tratei desse assunto na coluna no já distante (pois é…) ano de 2011. É bem-vinda a consulta de Luís Carlos, não só por citar a talentosa poeta carioca Alice Sant’Anna (foto) quanto por nos fazer voltar a um tema que intriga muita gente.

Uma mudança profunda vem ocorrendo há tempos com a palavra “poeta”. Esse vocábulo existente em português desde o século XIV – derivado do latim poeta, que tinha vindo por sua vez do grego poietes, “autor, criador” – nasceu como substantivo masculino e manteve tal condição por séculos a fio. Ainda hoje aparece assim nos dicionários: para designar uma mulher que escreva versos, diz a tradição, deve-se usar “poetisa”.

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Acontece que a língua real não se conforma com isso há muitas décadas. Tanto no Brasil quanto em Portugal, o uso tem puxado a palavra poeta para um lugar unissex, isto é, de substantivo de dois gêneros. Um lugar em que se plantou de modo tão sólido que admira não ter sido referendado ainda por gramáticos e dicionaristas. Deve ser só uma questão de tempo – e de bom senso.

A compreensão cada vez mais disseminada de poetisa como termo pejorativo, ou pelo menos de conotações condescendentes, caminhou ao lado dos avanços do feminismo no século XX. Poetas do sexo feminino que jogavam de igual para igual com os homens o jogo das letras passaram a rejeitar a distinção de gênero. Isso se deu em duas etapas.

Na primeira, o impulso foi na direção do masculino como gênero neutro, como se o eu lírico não tivesse sexo: “Não sou alegre nem sou triste: sou poeta”, escreveu Cecília Meirelles (1901-1964) no poema Motivo, o mesmo em que se declara “irmão das coisas fugidias”.

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Uma geração depois de Cecília, a portuguesa Sophia de Mello Breyner Andresen (1919-2004) completava o percurso, reivindicando abertamente para a palavra o gênero feminino. Hoje em dia é raro encontrar uma poeta de verdade que se apresente como poetisa. O vocábulo ainda se sustenta com as credenciais de “correto” em certos círculos, mas costuma ser associado ao beletrismo na acepção menos favorável deste termo e está claramente em declínio.

É curioso notar que, embora sejam semelhantes os impulsos de emancipação feminina a que respondem, a palavra “poeta” aspire à indiferenciação enquanto a palavra “presidente” busque na fala de muita gente, inclusive da própria presidente Dilma, o caminho contrário.

*

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