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Da obrigatoriedade da vacina

A discussão revela o clássico viés autoritário brasileiro

Por Ricardo Rangel Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 23 out 2020, 10h06 - Publicado em 23 out 2020, 06h00

A vacina contra a Covid-19 ainda não existe e se passarão alguns meses até que ela esteja disponível em larga escala. Mesmo assim, estamos brigando entre nós sobre se a vacinação deve ser obrigatória ou não.

A imunidade de rebanho será alcançada com a vacinação de algo entre 50% e 80% da população, enquanto pesquisas mostram que mais de 80% dos brasileiros se inocularão voluntariamente (a campanha de conscientização aumentará esse número). Ou seja, a vacinação voluntária deve ser suficiente, e o debate sobre a obrigatoriedade é prematuro e vazio. Sua única utilidade é ajudar a nos revelar quem somos.

A discussão revela que perder tempo e energia brigando à toa é uma espécie de esporte nacional, principalmente nestes tempos de polarização política. Revela a superficialidade com que discutimos questões públicas, e que adotamos posições radicais sobre problemas que não compreendemos (e que eventualmente nem existem).

Revela a natureza de nossos políticos, que, em vez de trabalhar juntos para resolver a logística de produzir, distribuir e aplicar a vacina, preferem bater boca em busca de ganhos eleitorais. Ao politizar o assunto, Doria e Bolsonaro envenenam a população contra a vacina e põem em risco suas próprias políticas de saúde.

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Revela o clássico viés autoritário brasileiro, com uma porção de gente defendendo, a priori, o uso da mão pesada do Estado para resolver um problema que não existe, provavelmente não existirá, e, ainda que venha a existir, será mais bem resolvido com campanha de vacinação do que com coerção.

“Doria e Bolsonaro envenenam a população contra a vacina e põem em risco suas próprias políticas de saúde”

Revela a paranoia (ou má-fé) de quem equipara obrigatoriedade a vacinação à força, quando há maneiras não violentas, e melhores, de compelir alguém a fazer alguma coisa, desde multa à recusa de serviços públicos (sanções contra quem deixa de votar, por exemplo).

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Revela a natureza de uma personagem política nova, o liberal de araque bolsonarista, que proclama que a obrigatoriedade “tolhe a liberdade de escolha da população”. Diria a mesma coisa se, em vez de Covid-19, tivéssemos a peste negra, que matou metade dos habitantes da Europa? A obrigatoriedade de parar no sinal vermelho acaso “tolhe a liberdade de escolha da população”?

Liberais de verdade são menos rasos. O pai do liberalismo, John Locke, escreveu que uma lei (que, por definição, restringe a liberdade) só será legítima se “aumentar a liberdade geral”. John Stuart Mill afirmou que o único propósito pelo qual o poder pode ser exercido legitimamente contra a vontade de alguém é evitar danos a outros. A vacinação compulsória, desde que realmente necessária, evita danos aos outros e aumenta a liberdade geral, de modo que liberais de verdade não terão problema com ela. Liberais de verdade têm problema é com liberais de araque.

Não é hora de falar de obrigatoriedade, mas de logística e de campanha de vacinação: se houver resistência significativa da população, aí a gente vê o que faz. Como dizia Tancredo Neves, que tinha mais visão e espírito público do que Doria e Bolsonaro juntos, não se devem tirar as sandálias antes de chegar ao rio.

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Publicado em VEJA de 28 de outubro de 2020, edição nº 2710

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