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A mente do assassino: o que eles pensam na hora de matar – e depois, na prisão

Em 2010, VEJA ouviu 94 homicidas confessos para a reportagem de capa "Por que os bandidos matam"

Por Da Redação Atualizado em 30 jul 2020, 21h30 - Publicado em 23 out 2016, 11h55

mao-arma-20121116-27-original16O brasileiro Patrick Nogueira Gouveia confessou esta semana o bárbaro assassinato de seus tios, Marcos Nogueira e Janaína Santos Américo, e de dois primos, crianças de um e quatro anos, no município de Pioz, na Espanha, a 60 quilômetros da capital Madri. O crime foi descoberto em 18 de setembro, quando os vizinhos suspeitaram do mau cheiro: os corpos foram encontrados esquartejados dentro de seis sacolas. Ainda não se conhecem os detalhes do massacre. Segundo a imprensa local, Patrick teria se explicado a familiares nos seguintes termos: “Senti um ódio irrefreável. Algo me dizia que tinha que matá-los”.

Afinal, o que move os assassinos? Em 2010, VEJA ouviu 94 homicidas em 23 presídios de 9 estados e do Distrito Federal para a reportagem de capa “Por que os bandidos matam”. A primeira revelação: “O arrependimento está longe de ser a companhia mais frequente de quem mata”, dizia a reportagem. Leia trecho abaixo:

Capa de 17 de novembro de 2010. Clique aqui para ler a reportagem
Capa de 17 de novembro de 2010. Clique aqui para ler a reportagem

Dos criminosos que a reportagem de VEJA ouviu, 38 assumiram ter cometido latrocínio e 56, homicídio. Desse segundo grupo, vinte contaram ter cometido o delito em meio a uma briga, treze disseram ter matado alguém com quem tinham uma rixa antiga, cinco cometeram crime passional, cinco mataram por causa de dívidas relacionadas a drogas, cinco disseram ter agido por vingança, três eram pistoleiros que mataram por dinheiro e dois eram sequestradores que decidiram assassinar suas vítimas. Os outros três alegaram motivos variados para o homicídio: legítima defesa, transtorno emocional e perda momentânea de consciência causada por uso de drogas. Entre os que confessaram o crime de latrocínio, 20% disseram não se arrepender de ter tirado a vida de um semelhante. Isso não significa, porém, que os outros 80% tenham declarado algum remorso por isso. Indagados sobre os motivos do seu arrependimento, quase todos apontaram como primeira causa o próprio infortúnio – em geral, o fato de estarem presos. Arrependem-se não pelo crime, mas por não terem conseguido evitar que ele ‘desse errado’. ‘O ladrão competente, na visão dos criminosos, é aquele domina a vítima, consegue levar o que planejou e não mata ninguém – não por uma questão de princípios, mas porque esse é o melhor resultado para ele’, diz o psicólogo Alvino Augusto de Sá, professor da USP e membro titular do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.

Na cadeia, todo detento sabe a diferença entre ser enquadrado no segundo ou no terceiro parágrafos do artigo 157 do Código Penal. Neles, estão tipificados o assalto a mão armada (sem vítima) e o latrocínio (com vítima). A diferença entre um e outro pode ser um confinamento até cinco vezes mais longo. No livro ‘A Sangue Frio’, baseado na chacina de uma família do estado americano do Kansas, ocorrida em 1959, o escritor Truman Capote reproduz a resposta dada por um dos assassinos, Perry Smith, a um amigo que lhe pergunta se ‘deseja compaixão e o perdão de Deus’ pelo que fez. Juntamente com um comparsa, Richard Hickock, Smith foi condenado à pena de morte por assassinar um fazendeiro, sua mulher e dois filhos, depois de descobrir que o cofre que pretendia roubar da família não existia. ‘Você quer saber se eu estou arrependido?’, pergunta Smith ao amigo que o visita na cadeia. ‘Se é isso que você quer saber, a resposta é não. Não sinto nada em relação ao que fiz. Gostaria de sentir. Meia hora depois que aquilo aconteceu, Dick (apelido de seu comparsa) já estava fazendo piadas e eu estava rindo. Talvez não sejamos humanos. Mas eu sou suficientemente humano para sentir pesar por mim mesmo. Pesar por não poder cair fora daqui quando você for embora. Mas isso é tudo’. A obra de Capote é talvez a mais precisa dissecação da mente de um assassino e da violência que ela é capaz de produzir, especialmente quando combinada com outra, de alguma forma complementar.

Confira abaixo alguns dos quarenta depoimentos publicados na edição de 17 de novembro de 2010 de VEJA:

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ivoIvo, condenado por homicídio em Santa Catarina: “Matei um cara que foi puxar o freio de mão durante um assalto. Você não sabe se ele vai puxar uma arma. Na dúvida, você atira. Teve outro, no Paraná, que tentou reagir. Tive que atirar nele. Matei um monte. Tinha a sensação de que, se eu não matasse e desse as costas, alguém ia me matar. Perdi o controle. Se o cara não parasse o carro ou não botasse a mão na cabeça, já estourava ali mesmo.”

ednelsonEdnelson, condenado por latrocínio no Pará: “Era uma encomenda. Fui passar um Carnaval no interior e acabei ficando sem dinheiro. Um fazendeiro me abordou num baile e perguntou se eu queria ganhar dinheiro com um serviço fácil: matar uma pessoa. A vítima era taxista. Pedi 6 000 reais e ele aceitou. Arrumei um parceiro e fui até o tal taxista. Pedi para ele levar a gente até uma fazenda. Meu parceiro o segurou por trás, eu avisei que ele ia morrer. Ele implorou para não ser morto, mas eu meti a faca no gogó. Dei uma só. Ele demorou para morrer, ficou uns quinze minutos gritando, batendo as pernas. Fez o mesmo barulho de gado morrendo. Fui cruel de assistir. Fui preso oito dias depois e até hoje não recebi o dinheiro.”

wanessaWanessa, condenada por homicídio no Distrito Federal: “Esfaqueei meu marido e matei minha melhor amiga porque descobri que os dois tinham um caso. Fiz isso para lavar minha honra. Cheguei em casa e peguei ela com ele na cama. Fui para o bar na hora, desolada. Quando voltei para casa, ele estava só, chorando aquele choro falso. Fiquei com muita raiva. Dei seis facadas nele, mas ele não morreu. Saí de lá e fui para uma festa, onde encontrei a menina. Dei duas facadas nela. Ela implorou, mas eu deixei o ódio falar mais alto. Assisti a ela agonizar. Senti prazer em ver ela se debatendo. Hoje, vejo que não valeu a pena. Não sou uma assassina.”

hlcH.L.C., condenado por assalto e latrocínio em Minas Gerais: “A gente já tinha recebido os 200 000 reais do resgate, mas meu amigo achou que a vítima, um fazendeiro, tinha visto o rosto dele. Aí não dava para deixar vivo. Pelo sim, pelo não, a gente mata e depois vê. Quando o velho viu que ia morrer, ele chorou e implorou, mas eu não vacilei: disparei nove tiros. Para sumir com o corpo, meu amigo abriu a barriga dele, colocou pedras lá dentro, costurou e jogou numa lagoa. Hoje eu não faria isso, até porque quem é sequestrado uma vez e pega o resgate pode muito bem ser sequestrado novamente”

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jeanJean, condenado por latrocínio no Rio Grande do Norte: “Descarreguei o revólver num cara numa loja de doces porque ele atirou em mim. Não atirei por raiva, mas por medo. Antes a mãe dele chorando do que a minha. Anunciei o assalto da porta. Falei três vezes para ninguém se mexer. Eu via o braço dele se mexer, mas não a mão, que estava escondida. Até que escutei um tiro e senti um negócio quente na minha barriga. Ele tinha me acertado. Na hora, parti para cima atirando.”

damiaoDamião, condenado por homicídio em Rondônia: “Eu não fui com a cara do cidadão e ele não foi com a minha. A gente estava no boteco, os dois tinham bebido. Ele disse que eu não era homem. Mostrei para ele que era homem, sim. Fui para riba dele. Eu não queria matar, só brigar. Tanto que estava com meu ‘trinta e oito’ e não usei. Ando com ele desde os 11 anos, quando ganhei do meu pai. O velho disse: ‘Nunca trespasse o direito dos outros, mas também nunca traga desaforo para casa’. Na briga, o cara puxou a faca e me furou. Tomei a faca e enfiei no peito dele. Morreu na hora. Dou graças a Deus por ter matado. Se não mato, ele me mata. Não penso mais nisso. Passou, passou”

dfJ.D.C., condenada por latrocínio no Distrito Federal: “O disparo saiu porque o taxista reagiu. Eu queria puxar ele para fora do carro, mas ele fez força para trás. Eu estava segurando a arma com uma mão e a cabeça dele com a outra. Fez uma alavanca e meu dedo acabou disparando o gatilho. Foi direto na cabeça dele. Eu quero aconselhar a quem for roubado: nunca reaja. Faz o que o assaltante está falando. Qualquer bem material a gente pode reconquistar. E tenta esconder o rosto. O bandido tem medo que você reconheça ele depois. Já vi casos assim”

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