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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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Os cineastas, a Comissão da Verdade, a entrevista de um general e uma lista de mortos que alguns querem esquecer

Ai, ai… Já escrevi algumas vezes que o cinema brasileiro tinha um futuro promissor. Refiro-me às chanchadas, lá em meados do século passado. O setor se perdeu quando foi tomado pelos dublês de cineastas e intelectuais. Em vez de fazer filmes, eles resolveram se dedicar a explicar o Brasil para os brasileiros, como se pertencessem […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 09h23 - Publicado em 6 mar 2012, 07h07

Ai, ai…

Já escrevi algumas vezes que o cinema brasileiro tinha um futuro promissor. Refiro-me às chanchadas, lá em meados do século passado. O setor se perdeu quando foi tomado pelos dublês de cineastas e intelectuais. Em vez de fazer filmes, eles resolveram se dedicar a explicar o Brasil para os brasileiros, como se pertencessem a outro país ou tivessem se apoderado da razão crítica para iluminar a bugrada. Aí ele se tornou chato, discursivo, metafórico, cheio de literatices, poesia ruim, condoreirismo barato, nativismo bocó, marxismo chulé. O Cinema Novo, com raras exceções, tinha a velha pretensão das elites ilustradas: civilizar o país. A cada filme, lá estava um dos nossos bravos rapazes, eventualmente moças, mostrando o Brasil do começo ao fim. Boa parte dos cineastas estava mais preocupada em nos salvar do que em nos divertir. Isso ficava para o reacionário cinema americano…

Muito bem! João Batista de Andrade, um dos expoentes daquela geração, resolveu redigir um manifesto em favor da Comissão da Verdade. Ele teve uma idéia:
“Nós, cineastas, mobilizamos a favor de tantas causas. Até mesmo dos cineastas iranianos. E quando o assunto diz respeito à democracia brasileira, não vamos dizer nada?”

Informa o Estadão Online:
“O texto elaborado pelo diretor foi encaminhado nesta segunda-feira, 5, aos ministros Celso Amorim (Defesa), Maria do Rosário (Direitos Humanos) e Ana de Hollanda (Cultura): “Nós, cineastas brasileiros, expressamos a nossa preocupação com as frequentes manifestações de militares confrontando as instituições democráticas e o próprio Estado de direito. Todos os cidadãos brasileiros têm o direito de conhecer o que foram os 21 anos de ditadura militar instaurada com o golpe de 1964. É preciso que a Comissão da Verdade, instituída para esclarecer fatos obscuros daquele período, em que foram cometidas graves violências institucionais, perseguições, torturas e assassinatos, tenha plenas condições e apoio da sociedade brasileira para realizar essa tarefa histórica. Repudiamos os ataques desses setores minoritários das Forças Armadas brasileiras, que de forma alguma irão obstruir as investigações que devem ser iniciadas o quanto antes. Estaremos atentos para que tal comissão seja composta por pessoas comprometidas com a democracia e com a verdade”.

Justiça seja feita, João Batista tem pelo menos a virtude de não ser hipócrita. Conta uma mentira torpe quando afirma que há “frequentes manifestações de militares confrontando as instituições democráticas e o próprio Estado de direito”. Não há nenhuma! Mas diz a verdade quando afirma que a tal comissão, ao contrário do que reza o texto aprovado, quer mesmo é se fixar nos 21 anos do regime militar. Ele certamente não leu o que foi aprovado: o que se pretende é apurar crimes cometidos entre 1946 e 1988. Andrade inverteu os algarismos e leu “1964”. E é claro que é mesmo essa a intenção nada secreta.

Os destinatários do manifesto não poderiam ser mais certos. Uma fala estúpida e ilegalista de Maria do Rosário motivou o primeiro manifesto de militares da reserva. A censura determinada por Celso Amorim gerou o segundo texto; a decisão do ministro de punir os signatários, uma ação ilegal, elevou a coisa à condição de crise. A mais hábil do grupo é a irmã do Chico Jabuti… Pai, afasta de mim esse cálice, paaaiiii!

Informa ainda o Estadão:
“O estopim para a elaboração do manifesto foi a entrevista do general da reserva Luiz Eduardo Rocha Paiva, ex-secretário-geral do Exército, à jornalista Miriam Leitão, publicada no jornal O Globo na sexta-feira, 2. A entrevista também foi ao ar na Globo News, no especial Uma História Inacabada, na qual Rocha Paiva questiona a abertura dos arquivos da ditadura e a criação da Comissão da Verdade.
“Isso é um trabalho para historiadores e pesquisadores”, declarou ele, que também levantou dúvida sobre o fato de que Dilma Rousseff ter sido torturada na prisão. “O estopim foi, sim, a entrevista do general. Mas não queríamos ficar só como resposta a ele, e sim dizer que estamos cansados de ver isso se repetir: a reação absurda desses setores minoritários que fazem isso para impedir o real andamento das investigações. Não quisemos colocar pedido de punição, Isso é problema do governo. Queremos que o governo, punindo ou não, faça a comissão andar, que não recue”, declarou João Batista.”

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Comento
Cineastas, jornalistas e açougueiros têm o direito de ter opiniões e de ser desinformados. A diferença é que a opinião dos açougueiros desinformados não vai parar nos jornais. Batista está errado. “Punir ou não” não é problema do governo coisa nenhuma! Existem uma Lei da Anistia e uma decisão do Supremo.

Quanto ao general, dizer o quê? Talvez tenha sido ingênuo ao ter concedido a entrevista. Que grande absurdo ele disse? Em essência, lembrou que é falsa como nota de R$ 3 a tese de que todos os que cometeram atos terroristas durante o regime militar foram punidos. Muitos mandantes não foram. Se uma Comissão da Verdade quer estabelecer a cadeia de responsabilidades de um lado, que se faça o mesmo do outro.

Só pode achar isso errado quem insiste na tese de que um lado daquela contenda queria ditadura, e o outro, democracia. É mentira! Brutalidades foram cometidas. Sim! Também pelos supostos libertários. ORA, HÁ NOTÓRIOS ASSASSINOS QUE RECEBERAM INDENIZAÇÃO DO ESTADO, PAGA COM O DINHEIRO DE TODOS OS BRASILEIROS. Não adianta me xingar! Provem que estou mentindo.

O que eu quero?

Como sempre, quero que se cumpra a lei, inclusive a da Anistia. Sempre lembrando que “anistia” não quer dizer “absolvição”, mas “perdão” e “esquecimento”. O processo político brasileiro perdoou Dilma Rousseff, por exemplo, independentemente do resultado do IPM, por ela ter aderido a grupos terroristas que mataram pessoas. Ainda que não tenha puxado gatilho nenhum, participou da decisão dos que puxavam e da organização dos crimes. Outras figuras do governo estão nessa situação.

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Ora, caso não tivesse havido “perdão” e “esquecimento”, independentemente de ela ter cumprido uma pena, teríamos de ficar lembrando: “Lá vai a mulher que pertenceu àqueles grupos que mataram Edward Ernest Tito Otto Maximilian Von Westernhagen, Wenceslau Ramalho Leite, José Antunes Ferreira, José do Amaral, David A. Cuthberg, Cidelino Palmeiras do Nascimento, Aparecido dos Santos Oliveira, Kurt Kriegel, para lembrar algumas das pessoas assassinadas pelo Colina e pela VAR-Palmares”. Batista conhece alguma resposta dada às famílias dessas pessoas? Os membros daquelas organizações que hoje estão fazendo política institucional tiveram ao menos a delicadeza de se desculpar com suas respectivas famílias?

Essa questão, como ficou evidente, não esteve presente nas considerações que Miriam Leitão fez na entrevista com o general. Vamos conhecer o passado? Vamos! Uma comissão que começa definindo os mortos que serão esquecidos e os que serão lembrados e os culpados que serão nominados e os que serão ignorados não é da verdade, mas da mentira.

Sei bem como são as coisas. Os bobalhões de sempre vão reclamar ao ver listados nomes de pessoas assassinadas pelos grupos a que Dilma pertenceu: “Como Reinaldo Azevedo é agressivo! Vejam como ele é reaça!” Ora… Um país que quer instalar uma “Comissão da Verdade”, para definir uma história oficial, não suporta os fatos?

Volto aos cineastas. Todos os signatários, eu sei, são pessoas honestíssimas. Falarei em tese. É preciso tomar cuidado com o binômio “cinema-verdade”. Vai que alguém decida algum dia investigar quanto o estado brasileiro já repassou a nossos cineastas para que pudessem nos premiar com suas obras-primas — inclusive e muito especialmente, durante a ditadura. Chegaríamos à conclusão de que foi o setor que mais concentrou renda na história do país. Os filmes podiam ser uma porcaria, mas os apartamentos na orla de Ipanema e Copacabana sempre foram uma beleza!

Viva a verdade!

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