Mas que diabo há com os jornalistas, que se mostram incapazes de dizer a verdade sobre a Líbia?
Qual é o nosso problema — dos jornalistas — aqui e Ocidente afora? Por que não dar às coisas o nome que elas têm? Quem não está contente com a queda de Muammar Kadafi? Tipos como Hugo Chávez, Raúl Castro e, suponho, pela proximidade exibida em tempos recentes, Luiz Inácio Apedeuta da Silva, Marco Aurélio […]
Qual é o nosso problema — dos jornalistas — aqui e Ocidente afora? Por que não dar às coisas o nome que elas têm? Quem não está contente com a queda de Muammar Kadafi? Tipos como Hugo Chávez, Raúl Castro e, suponho, pela proximidade exibida em tempos recentes, Luiz Inácio Apedeuta da Silva, Marco Aurélio Garcia e o megalonanico Celso Amorim. O trio brasileiro chamou de “independência” da política externa a cumplicidade com ditadores. E continua a fazer o mesmo em relação à Síria de Bashar Al Assad. Não se esqueçam de que petistas assinaram uma espécie de termo de cooperação com o partido Baath, de Assad. Que cooperação? Sei lá eu. Perguntem àqueles patriotas.
Pois bem. Uma coisa é recusar a proximidade com esses canalhas e votar contra eles na ONU — o que o Brasil não fez; muito pelo contrário. Outra, diferente, é deixar de reconhecer a penca de ilegalidades cometidas pelos governos Obama e Cameron — e depois pela Otan, sob inspiração de ambos — para depor Kadafi. Deixar de apontá-la é um desserviço à verdade, à inteligência e à maioridade do leitor. Fica parecendo que este é incapaz de fazer um julgamento isento e equilibrado. Também é covardia intelectual, um dos piores defeitos que pode atingir um jornalista.
A resolução do ONU (íntegra aqui), arranjada pelos EUA, é, de fato muito interessante. Cobra um cessar-fogo de Kadafi, mas não diz nada sobre os “rebeldes”. Estes, por acaso, nunca ameaçaram civis? Foi redigida numa linguagem rebarbativa o bastante para permitir quase qualquer coisa. Afinal, está lá, todos os esforços serão feitos para proteger a população. “Todos?” Quais? A Otan operou em parceria com os ditos rebeldes. Bombardeios aéreos antecediam os avanços por terra. Mais: sabe-se agora que a organização entregou armas aos rebelados. Não tinha autorização para fazer nem uma coisa nem outra. Quando a casa de Kadafi foi atacada, na suposição de que era um alvo militar, o objetivo era assassiná-lo, o que também não está na resolução.
O fato de Kadafi ser um vagabundo desprezível não nos deve impedir de ver os fatos e de reconhecer que se está promovendo o baguncismo na ONU. E seu grande promotor, no momento, chama-se Barack Obama — sem querer deixar chocado o Arnaldo Jabor, claro! —, que, de resto, empreendeu uma guerra contra o então governo reconhecido da Líbia sem autorização do Congresso. George W. Bush, a besta de plantão dos politicamente corretos, não teria chegado tão longe.
E este é o outro elemento de fundo a ser considerado nessa história toda: tirem Obama do comando de uma guerra — que será usada na eleição do ano que vem — e coloquem lá um republicano qualquer, e a grita estaria organizada em escala mundial: “Unilateralista! Autoritário! Imperialista!”. Como é Obama, então não se protesta. O princípio é o seguinte: certas ações são aceitáveis ou inaceitáveis a depender de quem as pratique; alguns teriam licença para violar resoluções da ONU; outros não!
Não, senhores! A minha opinião não é a mesma dos celerados que têm tomado contra do Itamaraty nos últimos anos. Eu não acho que, em nome da autodeterminação dos povos, deve-se permitir que facínoras tiranizem o povo, sem qualquer protesto ou reação. O que acho é que uma resolução das Nações Unidas tem de ser cumprida pelas potências. Afinal, Kadafi está indo para a lata de lixo porque incapaz de viver num mundo civilizado.
Não reconhecer as óbvias violações cometidas por EUA, Grã-Bretanha e Otan é fazer pouco da inteligência alheia. E para encerrar por enquanto: da forma como as coisas se deram, esses entes se tornam responsáveis pelo futuro governo da Líbia. Não se poderá dizer desta feita: “Agora os nativos decidem seu próprio destino!” Uma ova! Quem entra em um dos lados de uma guerra civil e decide o vitorioso da batalha está se tornando co-responsável pelo governo.
Os EUA estão agora no governo da Líbia. Vamos ver o que vão fazer por lá.