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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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Ignorantes de bom coração. Ou: quem pode queimar o quê?

A quantidade de besteira que o caso Bolsonaro vem suscitando é um espanto! A questão essencial, para mim, já disse, diz respeito à liberdade de expressão. Por mais detestáveis que sejam as suas opiniões, fazer o quê? A liberdade existe também para pessoas que dizem coisas detestáveis. Citei aqui o caso da Igreja de lunáticos […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 12h22 - Publicado em 4 abr 2011, 07h31

A quantidade de besteira que o caso Bolsonaro vem suscitando é um espanto! A questão essencial, para mim, já disse, diz respeito à liberdade de expressão. Por mais detestáveis que sejam as suas opiniões, fazer o quê? A liberdade existe também para pessoas que dizem coisas detestáveis. Citei aqui o caso da Igreja de lunáticos nos EUA que invade velórios de soldados americanos que serviam no Iraque e no Afeganistão para agradecer a Deus pelas mortes: seriam punições porque os EUA são condescendentes com o homossexualismo!!! Pode? A Suprema Corte diz que sim! Um pastor decidiu queimar um exemplar do Corão, e o Taliban usou isso como pretexto para desencadear atos terroristas. Há gente por aqui achando que é tudo culpa do… pastor! Em breve, vamos ter de perguntar aos clérigos afegãos o que se pode desenhar, queimar, falar ou pensar no Ocidente. Além de politicamente corretos, teremos de ser “islamisticamente” corretos. A tese seria mais ou menos esta: a era das liberdades individuais esgotou o seu ciclo de virtudes. Vão se danar!!!

Eu acho correto ou aceitável que se perturbem velórios ou se queimem livros religiosos? Eu não! Essa gente é asquerosa! E daí? Mas não reconhecerei os sectários islâmicos do Afeganistão como tribunal competente para decidir o que se pode ou não se pode fazer no Ocidente!

Aos cretinos salta-pocinhas do multiculturalismo chinfrim, lembro que a liberdade que queima livros imprime milhões de livros. No Afeganistão, onde não se imprimem livros, só não se pode queimar um livro!

Voltemos a Bolsonaro.  Vamos botar a bola no chão. Vão querer puni-lo segundo a lei ou vão querer puni-lo “porque a gente não gosta dele, e faz tempo que merece uma lição”? Vão querer puni-lo segundo o estado de direito ou segundo a discricionariedade das “pessoas boas”? Digamos que seja segundo o “estado de direito”, já que o Brasil, por enquanto, é uma democracia.

No caso da acusação de homofobia, o caso está sendo superdimensionado porque existe aí uma agenda: aprovar a tal lei. Se alguém acha Bolsonaro “fascistóide”, é porque não leu o texto. O deputado diz lá as suas besteiras, mas não tenta mandar ninguém para a cadeia. Já aquilo que pretendem aprovar pode meter um sujeito em cana por expressar uma simples convicção religiosa contrária à prática homossexual.

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Muito bem: ninguém pode ser punido, senhores apressadinhos, a não ser na forma da lei. E inexiste uma lei que caracterize a “homofobia”. Bolsonaro parece que não aceitaria filhos gays; acha que não correria o risco de tê-los; sugere até que uns bons petelecos na hora certa corrijam o “desvio”… São idéias, assim, “pterodáctilas”? São, sim! Mas existem pessoas assim no mundo! Devem ser encarceradas por isso? Aí o sujeito ainda mais apressado diz: “Ah, te peguei no argumento, Reinaldo! Então é por isso que precisamos ter a lei”! Vocês acham mesmo que uma lei que proibisse Bolsonaro de dizer essas coisas faria o Brasil ser mais democrático?

Então vamos ver: por homofobia, dada a inexistência de lei — vejam que ainda não toquei na imunidade parlamentar —, não haveria como puni-lo. Resta a acusação de racismo.

“Racismo” não é o que eu considero “racismo”, mas aquilo que a lei tipifica como tal. Mesmo que Bolsonaro não tivesse se enganado na resposta que deu a Preta Gil — e eu acho que ele se enganou; basta ver que o vocabulário empregado não se coaduna com a pergunta —, seria preciso dizer que artigo da lei ele transgrediu. Já tratei do assunto aqui. Não acho que seja o caso.

Atenção! Se a gritaria contra Bolsonaro estivesse circunscrita ao repúdio àquilo que ele disse, eu teria escrito aqueles meus dois primeiros textos, em que o desanquei, e parado. Mas não! Decidiram levar a questão para o terreno legal, para o questionamento sobre os limites da liberdade de expressão, para a relativização da imunidade parlamentar. Aí a coisa mudou muito de figura! Aí estão querendo combater opiniões particularmente boçais com a generalização da boçalidade antidemocrática.

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“Então um parlamentar pode defender o homicídio, a pedofilia, o roubo?” Não! Não pode, não! A pergunta é burralda porque, além de tais práticas estarem devidamente categorizadas como crimes, haveria a questão do decoro, que um parlamentar não pode transgredir nem no uso da imunidade. “Ah, mas o racismo também tem uma lei que o pune”. É fato! Mas será preciso, antes, provar que houve racismo, entenderam? Provar segundo a lei, não segundo o fígado dos que não gostam do cara porque ele se opõe a cotas raciais, por exemplo.

“E o terrorismo? Um parlamentar pode defender o terrorismo em nome da liberdade de expressão?” Então… A Constituição diz que o terrorismo também é crime inafiançável e imprescritível e que será punido na forma da lei. Se o animal em questão for hábil o bastante para fazer uma defesa genérica, sem especificar atos que possam estar categorizados em leis específicas, será difícil puni-lo — a não ser por quebra de decoro. É que não temos, no Brasil, a lei que pune o terrorismo. Por essa razão, inclusive, há um monte de terroristas livres, leves e soltos, operando alegremente no Brasil, conforme fica claro da reportagem de capa da VEJA desta semana. A propósito: já se publicou resenha de livro na imprensa brasileira defendendo o terror. Ninguém protestou! Ou melhor: eu protestei!

Há várias formas de debater essa questão, inclusive a honesta e a desonesta. A desonesta tenta confundir a defesa da liberdade de expressão e da imunidade parlamentar com o endosso às besteiras que Bolsonaro diz. A honesta distingue a preservação de direitos fundamentais, inegociáveis, do conteúdo tacanho que o exercício desses direitos pode trazer à luz. Debate parecido se viu na questão do Ficha Limpa. Aprovou-se uma lei escancaradamente inconstitucional em nome do bem, e, depois, tentou-se pespegar nos defensores da Constituição a tacha de lenientes com a corrupção.

Infelizmente, boa parte dessa confusão é feita por jornalistas, que não vêem mal nenhum em propagar a ignorância, desde que seja de bom coração.

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PS – Esse escarcéu todo só está em curso por aqui porque há a cultura de recorrer ao “papai Estado” para punir os meninos maus, que fazem aquilo de que a gente não gosta… Nos EUA, por exemplo, seria absolutamente impensável a hipótese de cassar um parlamentar porque ele expressou opiniões consideradas incômodas, idiotas ou incorretas. E olhem que aquela é a pátria do politicamente correto. Mas lá deixam o embate para a sociedade.

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