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Blog do jornalista Reinaldo Azevedo: política, governo, PT, imprensa e cultura
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A forma como a imprensa faz poesia da discriminação de classe no Rio quase me comove, mas consigo me conter

Caos nesta segunda no transporte público da cidade do Rio, com a decisão da Prefeitura de proibir a circulação de vans em grande parte da Zona Sul. O Rio é mesmo uma cidade maravilhosa. A maneira como os pobres são discriminados por ali, e com o apoio de grande parte da imprensa, beira a poesia, […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 06h28 - Publicado em 15 abr 2013, 20h02

Caos nesta segunda no transporte público da cidade do Rio, com a decisão da Prefeitura de proibir a circulação de vans em grande parte da Zona Sul. O Rio é mesmo uma cidade maravilhosa. A maneira como os pobres são discriminados por ali, e com o apoio de grande parte da imprensa, beira a poesia, o estado de arte. A medida foi tomada depois que uma turista foi estuprada no interior de uma van, e seu namorado, espancado. Como não existe controle sobre essa modalidade de transporte público, o jeito é ser radical: nada desses veículos na Zona Sul, onde circula, afinal, a maior parte dos turistas. O raciocínio, não fosse seu caráter obviamente discriminatório, faz sentido: com menos vans, menos riscos. E se tem, adicionalmente, a impressão de que se tomou uma providência. Antes que continue — e para desfazer mal-entendidos —, é preciso apontar a culpa de São Paulo (ou de uma de suas gestões).

As vans no transporte público são, prestem bem atenção!, uma herança maldita do PT. Sim, senhores! Essa modalidade inicialmente clandestina começou na gestão de Luíza Erundina na capital paulista e não foi reprimida a tempo. Ao contrário: foi até estimulada. Os petistas achavam que, assim, encostavam contra a parede os capitalistas selvagens. Eram tempos em que os petistas ainda não viviam em mutualismo com o… capitalismo selvagem! Logo algumas de suas franjas se ligaram ao crime organizado e, aí, adeus! Nunca ninguém mais conseguiu acabar com a praga.

À época, especialistas alertaram para seu caráter deletério. Estimular esse tipo de, digamos assim, “iniciativa privada” informal numa área de prestação de serviço que tem de ser regulada porque usa o aparelho urbano seria fonte permanente de problema. Não deu outra! Mas o PT jamais resistiu à tentação de apresentar uma resposta simples e errada para um problema difícil. De São Paulo, a doença se espalhou para o Brasil inteiro, chegando ao estado de arte no Rio. E não é assim em razão da índole particular do carioca. É que essa informalidade encontrou naquela geografia e naquela topografia o ambiente ideal para prosperar. As vans podem chegar a lugares aonde os ônibus não chegam.

Ora, à medida que as empresas começaram a dividir passageiros com esse novo serviço, foram adaptando seus investimentos à nova realidade de mercado — em São Paulo, no Rio e em qualquer lugar. As vans deixaram de ser apenas uma alternativa para quem queria um pouco mais de rapidez e conforto (ou que fazia um trajeto não servido por ônibus ou metrô) e passou a ser um serviço necessário. Elas supriram parte do crescimento da demanda por transporte público. Não se corta isso da noite para o dia sem transtornos severos.

E é o que viu no Rio. Reproduzo (em vermelho) trecho de reportagem da Folha. Volto em seguida.
*
O primeiro dia de proibição da circulação de vans e Kombis em bairros da zona sul do Rio causa transtornos, desde o início da manhã desta segunda-feira (15), para moradores da cidade. Por volta das 7h, alguns ônibus seguiam lotados com passageiros pendurados nas portas. Trabalhadores ficaram revoltados com o atraso de até uma hora dos ônibus, que na maioria das vezes passavam superlotados e não paravam nos pontos. “Estamos na fila [do ônibus] há quase uma hora porque eles passam cheios e não param. Sempre peguei van da Ilha do Governador [zona norte] para Ipanema e nunca tive problema. Agora tive que fazer baldeação na Leopoldina [no centro] e enfrentar esse caos para chegar no trabalho”, lamentou a costureira Nadmar Almeida, 47.

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Muitos passageiros reclamaram que a mudança vai prejudicar quem depende do transporte público na cidade. “É maldade o que estão fazendo com a gente. Estamos viajando esmagados nesses ônibus lotados”, disse o cozinheiro Josenildo Alves da Silva, 47, que seguia da Leopoldina para o Leblon. Às 9h30, uma manifestação da categoria fechou a avenida Delfim Moreira, no Leblon. O protesto provoca um enorme engarrafamento na pista sentido Copacabana, zona sul.

Segundo decreto do prefeito do Rio, Eduardo Paes, publicado na quinta-feira (11) no “Diário Oficial” do município, as vans não podem mais circular na zona sul da cidade no bairros de Botafogo, Humaitá, Urca, Leme, Copacabana, Ipanema, Leblon, Lagoa, Jardim Botânico, Gávea e São Conrado.
(…)

Voltei
Aqui e ali, a gente lê que os ônibus e o metrô procurariam se reorganizar para suprir a demanda por transportes. Pelo visto, não adiantou. E não teria mesmo como adiantar. Reitero: depois de anos cumprindo um papel da demanda por transporte público, não se muda a realidade por decreto.

Eu fico imaginando qual seria a abordagem da imprensa, inclusive da carioca (da paulistana, com certeza absoluta!), se a administração pública decidisse tomar uma medida como essa nos bairros ricos da cidade. Convenham: uma tolice dita por uma moradora de Higienópolis — não pelo bairro, já que bairro não fala nem pensa — gerou um “movimento social”. Ela, com todo o direito a ter uma opinião (ou alguém lho havia cassado?), ainda que idiota, afirmou que não queria estação de metrô no bairro porque isso atrairia “gente diferenciada”. E lá foram os petistas mais alguns xexelentos, com amplo apoio da imprensa, fechar ruas para fazer o “churrasco da gente diferenciada”. Cheguei a ler verdadeiros ensaios nos jornais, da mais pura antropologia botequeira, demonstrando como esta é a cidade da exclusão e coisa e tal. No Rio, não! Todos terminam na mesma gafieira da Glória Perez e no paraíso de Dante do Complexo do Alemão…

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Mas, como se vê, não há perigo de haver uma abordagem crítica nem mesmo de uma medida que tem óbvio caráter discriminatório. Não só se cria uma área da cidade onde “esse tipo de coisa não entra” — por que não? — como se punem os pobres que trabalham na Zona Sul e dependem do transporte público.

“Olhe o Reinaldo defendendo as vans…” Uma ova! Eu acho que é preciso começar a tomar medidas para acabar com elas. Mas, antes, é preciso oferecer uma alternativa aos que se tornaram dependentes das vans não por escolha, mas por culpa da incúria do Poder Público.

Dizem que sou conservador. Uns bestalhões me acusam de reaça. Não dou a mínima. O fato é que tenho asco de discriminação, inclusive da dita “discriminação positiva”… Pouco me importa se o cartão-postal que serve de fundo tem o rio Tietê ou a tardinha que cai, o barquinho que vai e outros diminutivos turísticos.

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