Patriota banca coligação milionária e elege filha do presidente do partido
Em Barrinha (SP), de 35 mil habitantes, legenda gastou 1,2 milhão de reais do fundo e pagou conta de 100 candidatos a vereador; Fabiana foi eleita vice
Barrinha é uma cidade do interior paulista – distante 300 quilômetros da capital – e com cerca de 35 mil habitantes.
É também o reduto eleitoral do presidente nacional do Patriota, Adilson Barroso, que é vereador e preside a Câmara Municipal.
Barroso é um pai zeloso. Acaba de eleger sua filha Fabiana Barroso, de 27 anos e também do Patriota, vice-prefeita de Barrinha. O prefeito eleito foi o Zé Marcos, do PL.
Adilson Barroso gastou os tubos e torrou 1 milhão e 200 mil reais do fundo eleitoral da legenda – que é de 37 milhões de reais ao todo – para vencer a eleição na cidade. De fazer inveja a imensa maioria dos candidatos de seu próprio partido país afora.
O Patriota simplesmente bancou sozinho os gastos da chapa majoritária – 106 mil reais – e também, de cair o queixo, toda a campanha de 100 candidatos a vereador dos 7 partidos da coligação “Barrinha forte e competente”, que custou pouco mais de 1 milhão de reais, na totalização da prestação de contas de cada um deles à Justiça Eleitoral.
Coligação essa formal para a disputa da Prefeitura, já que para a eleição proporcional, caso dos vereadores, acabou esse tipo de junção. Mas não na prática. E não em Barrinha. Quem faz campanha sabe que é necessário ter o maior número de postulantes à Câmara para impulsionar a campanha do prefeito e vice. Da vice, no caso.
Nem o PL, partido do prefeito eleito, deu 1 centavo para campanha. O Patriota de Barroso pagou tudo.
O partido mesmo teve 15 candidatos a vereador. Os outros 85 postulantes aliados, todos bancados única e exclusivamente pelo Patriota, são de legendas com fundos eleitorais muito mais rechonchudos, como o MDB, o PSD e o PL, cujos valores variam de 117 milhões de reais a 150 milhões de reais cada.
O Patriota gastou com seus 15 candidatos a vereador 241 mil reais; com os 17 do PL, 253 mil reais; com os 18 do PTC, 258 mil reais; com os 16 do MDB, 125 mil reais; com os 14 do PSC, 109 mil reais; com os 10 do PSD, 78 mil reais e com os 10 do PV, 64 mil reais.
Apesar da gastança, Barroso elegeu 5 (2 do Patriota, 2 do PL e 1 do PTC) dos 11 vereadores que vão assumir em 2021. Ao todo, 207 políticos disputaram esses cargos.
Na prestação de contas do Patriota ao TSE, o diretório de Barrinha aparece como um dos mais contemplados com recursos do fundo.
“Se você não gasta, não adianta. Não elege”
Adilson Barroso reage de praxe em situações embaraçosas como essa. O dirigente maior do Patriota nega que tenha privilegiado seu curral eleitoral e dado atenção especial à sua filha, assegura não ter feito nada demais e nem cometido deslize. Mas reconhece algo que justifica tamanho desembolso de dinheiro público.
“Se você não gasta esse valor, não adianta, não elege” – afirmou Barroso, ontem, ao Radar.
Sobre ter bancado a campanha de dezenas de candidatos de partidos diversos, contou que as legendas coligadas “deram para trás”, teriam se comprometido a ajudar, mas não o fizeram.
“Um ou outro deu uma coisa ou outra ali para alguém. E o que gastei foi o mínimo para eleger a chapa e os vereadores. Ficou de jeito para ajudar”.
“Ela é apenas a vice. E vice é reserva”
Perguntado se 1 milhão e 200 mil reais não é dinheiro demais para uma campanha que levou 20 mil eleitores às urnas, responde:
“Não sei se é muito. Se gastasse 500 (mil) não elegeria”.
O prefeito eleito Zé Marcos derrotou a atual prefeita, Professora Mila (PTB), por uma diferença de 521 votos. O placar: 6.781 a 6.260 votos. Outros 4 disputaram. Barroso apresenta outra razão para essa dinheirada na campanha.
“Não foi fácil, nessa pandemia, concorrer contra o kit leite e a cesta básica”.
Fabiana Barroso é atuante nas redes sociais. É vice-presidente nacional do Patriota Mulher. Na campanha, esteve em Brasília e gravou vídeos e fez fotos com deputados da bancada do partido. Esteve com a ministra Damares e registrou o encontro na sua página.
O pai também nega que tenha dado tanta atenção e dispendido o montante de recursos do fundo na campanha pelo fato de filha compor a chapa.
“Ela é apenas a vice. E vice é reserva”.
“Não se pode admitir que partidos tenham donos”
Para o cientista político Marcelo Issa, diretor-executivo do Movimento Transparência Partidária, o caso de Barrinha expõe um fenômeno e uma distorção da política nacional, que é a perpetuação no comando de partidos de alguns dirigentes, além do uso do dinheiro público do fundo para determinadas regiões e localidades desses políticos.
“Essa grande concentração de recursos em localidades relacionadas a dirigentes partidários é uma distorção do que previsto na Constituição para funcionamento dos partidos. A Constituição determina que os partidos são os guardiões da democracia e, portanto, devem funcionar com parâmetros mínimos de equidade”, entende Marcelo Issa.
Esse recurso público, continua o diretor do Transparência Partidária, não pode servir a uma estrutura de poder que atenda aos interesses pessoais ou familiares dos dirigentes, caso de Adilson Barroso com o Patriota, em Barrinha.
“Por isso defendemos limite de mandatos para os dirigentes por meio de uma alteração na lei dos partidos. Não pode se admitir que os partidos tenham donos, ainda mais financiado por recursos públicos, o que me parece uma clara violação da determinação constitucional”.