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Por Coluna
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Um presidente americano no BID? (por Raul Jungmann e Mauro Marcondes)

Indicação do governo Trump não é positiva

Por Mauro Marcondes Rodrigues e Raul Jungmann
Atualizado em 30 jul 2020, 18h51 - Publicado em 20 jun 2020, 10h00

A terça-feira, dia 16 de junho de 2020, pode ficar marcada na história pela ruptura de um acordo não escrito entre os países latino-americanos e caribenhos e os Estados Unidos, para a condução de uma das instituições financeiras multilaterais mais importantes para os países da Região.

Neste dia, a administração Trump decidiu indicar um cidadão americano, Mauricio Claver-Carone, diretor de assuntos latino-americanos no Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, para presidir o Banco Interamericano de Desenvolvimento-BID.

Embora semelhante ao Banco Mundial, o BID, fundado em 1959, fruto de uma muito bem-sucedida negociação com os americanos, foi estruturado com base numa arquitetura institucional e de governança equilibrada entre os membros beneficiários dos empréstimos (latino-americanos e caribenhos) e os EUA, Canadá e demais membros não regionais.

Os latino-americanos e caribenhos detém, em conjunto, a maioria do capital do BID (50,015%) e, pela regra não escrita desde sua criação, indicam seu Presidente, enquanto os EUA, com 30% do capital votante, sempre ocuparam a posição de Vice-Presidente Executivo da Instituição.

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Para se ter uma ideia do porte do banco, consta do seu Relatório Anual de 2019, empréstimos ativos no montante de US$ 96,7 bilhões, sendo quase US$ 13,0 bilhões de novos empréstimos aprovados no ano passado, principalmente para o setor público, mas também para empresas privadas.

São projetos de desenvolvimento em diferentes setores: transporte, saneamento, saúde, reforma e modernização do Estado, desenvolvimento urbano e habitação, educação, ciência e tecnologia, investimento social, energia, agricultura e desenvolvimento rural, meio-ambiente e turismo sustentável. Para os países menos desenvolvidos da Região, o BID oferece empréstimos não reembolsáveis e apoio através de cooperação técnica.

No caso do Brasil, o banco possui uma carteira ativa de 77 operações de empréstimo no valor de US,7 bilhões, muitos deles concedidos para Estados e Municípios, constituindo-se numa fonte importante de crédito de longo prazo para esses entes da Federação.

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Nos 60 anos de existência, o BID teve quatro presidentes, todos latino-americanos. O primeiro foi o economista chileno Felipe Herrera (1960-971), seguido por outro economista, o mexicano Antonio Ortiz Mena (1971-1988). Em 1988, o Presidente Ortiz Mena teve um desentendimento com o Tesouro americano e saiu do Banco.

Mesmo naquele momento de crise, foi encontrada uma solução dentro do marco pactuado entre os EUA e os latino-americanos e caribenhos. Foi nomeado o economista uruguaio Enrique Iglesias, que liderou o BID por 17 anos (1988-2005), numa fase de importante expansão e mudanças operativas. Em 2005, assumiu a Presidência do BID o cidadão colombiano Luiz Alberto Moreno que encerrará seu terceiro mandato em outubro deste ano.

Desde 1959, o banco passou por várias transformações e cresceu não só em termos de capacidade de concessão de empréstimos e de outros instrumentos de apoio à região, como na incorporação de novos sócios, notadamente não regionais.

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A presença de um latino-americano na presidência do BID jamais foi impedimento na obtenção de recursos para o banco cumprir seu papel no apoio ao desenvolvimento dos nossos países. Além disso, um presidente latino-americano sempre foi fator de equilíbrio entre os sócios regionais e não regionais e, em especial, na mediação entre os interesses e posicionamento dos EUA e dos demais sócios regionais. Outro aspecto importante da presidência latina é a garantia da proximidade com os países beneficiários do apoio do banco e a melhor compreensão de suas demandas.

Por óbvio, os Estados Unidos não estão isolados nesta empreitada de ter um americano na presidência do BID. E não devem ser com os europeus, pois se a moda pega os americanos podem querer assumir o FMI. Pelo que se sabe, contam com o apoio, entre outros, do segundo maior acionista, o Brasil (11,354%).

Logo o Brasil, que teve um papel fundamental na criação do BID. Foi justamente a ação decisiva do Presidente Juscelino Kubitschek, ao enviar uma carta ao Presidente americano, Dwight Eisenhower, datada de junho de 1958, em que o exortava a rever as relações dos EUA com o continente, somada à ideia de criação da Organização Pan-Americana, que viabilizou, como desdobramento das tratativas com o governo americano, a constituição do Banco Interamericano de Desenvolvimento-BID, no ano seguinte.

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Em resumo, esta indicação do governo Trump não é positiva para o futuro do nosso principal banco de desenvolvimento regional. Não faz sentido algum se abandonar uma arquitetura institucional e um acordo que contribuíram para uma trajetória de bons serviços prestados para o desenvolvimento dos nossos países, em nome de uma promessa de maior compromisso americano com o BID e os países da região.

O Brasil tem história e presença importantes na instituição. Não pode desconhecer este fato e se alinhar aos interesses imediatos dos EUA, abandonando seus compromissos com os demais países beneficiários, alguns inclusive com candidaturas postas.

Há tempo de se construir consensos em torno de um candidato latino-americano ou caribenho que una a todos e leve os americanos a voltar ao pacto fundacional do BID. Caso contrário, veremos o Brasil dando mais um passo e abrindo mão da sua visão diplomática histórica para se tornar peça da engrenagem diplomática dos EUA.

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Mauro Marcondes Rodrigues – ExSecretário de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento e ex-Diretor Suplente do Banco Interamericano de Desenvolvimento-BID

Raul Jungmann –  ex-deputado federal, foi Ministro do Desenvolvimento Agrário e Ministro Extraordinário de Política Fundiária do governo FHC, Ministro da Defesa e Ministro Extraordinário da Segurança Pública do governo Michel Temer.

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