Somente o que couber no bolso ou no coração
A degeneração explicita da nossa democracia é visível
Sendo otimista, é o triunfo da esperança sobre a experiencia. Sendo pessimista, o número de explicações é infinito. Mas nenhuma explicação torna palatável, justificável, ou compreensível a nossa dificuldade de renovação.
A degeneração explicita da nossa democracia é visível, inescapável e, pelo jeito, inevitável. Lá vamos nós outra vez escolher candidatos em menu envelhecido. Difícil imaginar que da boca deles sairá qualquer coisa além de populismo e demografia. E impossível imaginar que de suas cabeças brotem ideias capazes de fazer o país entrar no século vinte.
Nos dias de hoje, fazer o mínimo é o máximo que a gente deseja. É demonstração evidente que a gente se acostuma a qualquer coisa. Desde que aos poucos. Depois de séculos loteando uma quase nação, não somos mais que um acumulado de sesmarias onde donos de gado e gente luta pela divisão de um bolo cada vez menor.
A gente perdeu de tudo. Mas a maior perda é a da capacidade de notar os absurdos. Pelo Brasil, o absurdo encharca a conversa, faz parte da paisagem, e é onipresente e onisciente. Tanto que a gente nem mais nota. Não calcula. Não vê.
O Brasil se tornou país de bacharéis dedicados a exercícios semânticos e sem sentido. Tem excesso de leis. Falta justiça. É dividido pela política. Mas a política não tem agenda. Vota. Mas não escolhe. A cada dia, mais gente parece se convencer de que tudo isso não vale a pena. Que as coisas não vão mesmo funcionar. Desistem, enfim. Esse é o perigo.
O brasileiro se sente desamparado. Acha que não tem futuro. E se pudesse mudaria para outro lugar. Sem se dar conta de que contribui para profecia auto cumprida. Entra em circulo vicioso onde a autodestruição é o único resultado previsível.
O Brasil precisa melhorar tudo. As instituições, o controle, a ética, as leis, a justiça, as eleições, a democracia e muito mais. Mas já seria um bom começo se melhorasse a disposição pela renovação. E ao menos tentasse eleger o novo.
Não há mais tempo a perder. Já desperdiçamos todo tipo de oportunidade. Gastamos nosso bônus demográfico e comprometemos gerações futuras. Estamos envelhecendo antes de enriquecer. Errar as escolhas é luxo ao qual não podemos nos dar.
É hora de abandonar o passado. Desapegar. Deixar para tras erros antigos. Pedir aos ventos que levem tudo o que não for mais útil. O Brasil está cansado de bagagens pesadas. Permanece esmagado pelos pesos que carrega nas costas. Não dá mais. Daqui para frente, o Brasil precisa carregar somente o que couber no bolso ou no coração.
Elton Simões mora no Canadá. É President and Chair of the Board do ADR Institute of BC; e Board Director no ADR Institute of Canada. É árbitro, mediador e diretor não-executivo, formado em direito e administração de empresas, com MBA no INSEAD e Mestrado em Resolução de Conflitos na University of Victoria. E-mail: esimoes@uvic.ca .