Há duas versões correntes para explicar a alta densidade de militares por metro quadrado do governo Bolsonaro, acentuada nesta terceira semana com a nomeação de mais militares para cargos de segundo e terceiro escalões e direção em estatais. Só nos últimos dias, foi indicado porta-voz o general Rego Barros, enquanto o ex-comandante da Marinha, almirante Eduardo Bacellar Leal Ferreira, foi designado para presidir o conselho de administração da Petrobras e o general Franklimberg Freitas retornou ao comando da Funai. Sem contar os sete ministros situados no coração do governo.
Uma dessas versões, a paranóica, dá conta de que o presidente estaria, com essa composição verde-oliva da administração, mandando recado às instituições e políticos que porventura vierem a querer apeá-lo do poder com um impeachment ou algo assemelhado antes do fim do mandato. Uma espécie de “não vem que não tem” baseado num suposto – e duvidoso – apoio incondicional das Forças Armadas em qualquer circunstância. Explicação meio duvidosa.
A outra versão, mais amena, tem base na obviedade: o capitão Bolsonaro chamou para governar com ele as pessoas em quem mais confia (inclusive as chaves do cofres) e que mais admira, e não é surpresa serem militares. Em sua maioria, são quadros bem preparados, quase todos na reserva, com incontestável afinidade ideológica com o chefe. Natural, portanto.
Nem tanto. Ainda que ambas as explicações sejam possíveis, e de modo algum excludentes, fica faltando uma peça no quebra-cabeças para justificar a opção preferencial pelos militares. Até porque Bolsonaro deixou a caserna há tempos, foi deputado por quase 28 anos e venceu uma eleição direta na condição civil. Teve tempo suficiente para procurar outra turma.
Aí é que está. Se procurou, não achou. Em seus anos civis, Bolsonaro perambulou por diversos partidos, não se integrou a qualquer projeto de poder, dedicou seus mandatos a defender interesses corporativos militares e ideias de direita radical, que o deixaram isolado no Parlamento. Vários ex-colegas de Câmara relatam mal ter trocado palavras com ele ao longo dos anos, recordando-se de um personagem sentado na parte de trás do plenário, o chamado “Vale dos Caídos”.
Chegou ao poder com 58 milhões de votos, mas sem projeto político, partido consistente ou liderança organizada, guindado pelo discurso de ser contra “tudo o que está aí”. Nunca foi líder de bancada nem presidente de comissão ou relator de projetos importantes. Excetuando-se o armamento da população e uns poucos itens já revelados, não se sabe exatamente do que ele é a favor.
No poder, frequenta solenidades militares, onde parece se sentir à vontade. Mas tem poucos compromissos e conversas políticas, como se ignorasse que é possível, sim, fazer política e negociar apoios sem cair no lodaçal do toma-lá-dá-cá mais rasteiro.
Do Vale dos Caídos ao Planalto, Bolsonaro continua em isolamento político, e isso explica a alta densidade de militares por metro quadrado de seu governo. Dificilmente, porém, vai conseguir governar assim.