(Minhas) memórias dos outros
Nas memórias de Memélia, revivi fatos presenciados por nós, hoje contados e recontados em livros de histórias
Peço licença ao jornalista, escritor, acadêmico Zuenir Ventura para quase roubar (o titulo dessa crônica) do seu “Minhas historias dos outros”, um dos livros mais prazeirosas que li. Zu, como os amigos o chamam e eu tomo essa liberdade apesar da distância, foi meu editor no Jornal do Brasil. Anos 80.
De Zuenir, e desse tempo espetacular do jornalismo, tenho memória viva. Sob sua batuta, e a parceria de Tania Fusco, amiga imprescindível de vida e profissão, fiz muitas capas do Caderno B, e deliciosas reportagens.
Histórias e memórias. Nos períodos de festas, lembranças ficam mais aguçadas. Estamos mais sensíveis. São de praxe os encontros de Natal e Ano Novo com pessoas que não vemos há muito tempo – às vezes, encontros nem tão prazeirosos .. Fugimos deles. Ou nos entregamos.
Conversas como viagens no tempo…
Nas rodas de jantar, histórias saborosas que estavam no fundo da gaveta… O primo que literalmente rasgava notas de 100 e dava um pedaço para cada criança para que fosse colada e repartida depois. Apenas por deleite. A generosidade e a proteção dos dois irmaos homens num universo familiar quase totalmente feminino… a mesquinharia da tia que comia chocolates longe das crianças, escondida no quarto…
Nesse cenário de saudades, raiar de 2018, dias intensos de doces lembranças. Azedas também. Memórias cutucadas pelas histórias dos outros. Detalhes reavivados por palavras soltas, frases, pequenos gestos.
Foi assim em Kissimmee, Florida. Um frio de doer os ossos no jardim ainda florido, aconchego dentro de casa, Memélia e eu visitamos reminiscências dos anos 70, 80, 90… varamos madrugada.
Viagens rememoradas. Parque Nacional do Xingu, Amazonia, dezenas de vezes. Tive o privilégio de compartilhar com Meméilia Moreira coberturas históricas. Vivemos a ditadura, a repressão, a violência dos militares. Vivemos intensamente a campanha das diretas já, e a eleição de Tancredo, que pôs fim ao longo período de escuridão política no Brasil.
Nas memórias de Memélia, revivi fatos presenciados por nós, hoje contados e recontados em livros de histórias. Memélia tem memória invejável. Lembra detalhes. Datas, nomes completos, origem dos personagens. Frases ditas. Reações anotadas.
Reavivei a minha memória nessas memórias. E quero mais. Mais viagens, mais conversas, mais madrugadas, mais histórias. Mais memórias, a minha memória dos outros.
Mirian Guaraciaba é jornalista, paulista, brasiliense de coração, apaixonada pelo Rio de Janeiro