O caso Vaza-Jato está longe de um desfecho, mas já provocou efeitos colaterais importantes. Um deles é que o prestígio da turma ligada à Lava Jato junto a seus próprios pares vai declinando rapidamente. Por exemplo: na eleição interna da lista tríplice do Ministério Público para escolha do novo Procurador Geral da República – aquela que, todo mundo sabe, o presidente Jair Bolsonaro dificilmente vai respeitar – ficaram de fora, entre os últimos colocados, os nomes mais ligados ao ex-juiz Sergio Moro e ao pessoal de Curitiba.
Os três mais bem votados – Mario Bonsaglia, Luiza Frischeisen e Blal Dalloul – evidentemente apoiam a Lava Jato (quem não?), mas não estavam entre os preferidos da força-tarefa, além de serem pessoas de tendência mais progressista e comportamento independente. Os preferidos de Moro nessa disputa eram os procuradores Vladimir Aras e José Robalinho Cavalcanti, já que a ideia de lançar Deltan Dallagnol, alimentada por alguns setores, foi descartada antes mesmo do escândalo da Vaza-Jato. Aliás, para sorte de Moro, que teria mais dificuldade ainda para explicar que os dois não andaram juntos e misturados na Lava Jato..
O vazamento das conversas impróprias de Moro, Dallagnol e outros procuradores também deixou o ex-juiz e atual ministro da Justiça numa saia-justa junto a sua própria categoria. Nos bastidores, dirigentes de associações de juízes temem que o caso acabe por gerar questionamentos e desconfianças em relação às atitudes dos magistrados de mogo geral, contribuindo para sua desmoralização e, sobretudo, enfraquecendo seus integrantes diante de iniciativas destinadas a limitar seu poder.
Eles atribuem ao enfraquecimento de Moro a principal delas, que será, finalmente, a aprovação do projeto que pune com mais rigor os casos de abuso de autoridade, atingindo juízes, procuradores, policiais e outros agentes públicos. A proposta, já votada na Câmara, deve ser aprovada na semana que vem, a toque de caixa, no plenário do Senado. O texto está sendo negociado, e deverá ter atenuadas questões polêmicas como as da hermenêutica nas decisões judiciais – não permitindo que um juiz seja punido por sentença posteriormente revista por entendimento diferente de instâncias superiores. Mas o projeto traz, na interpretação das entidades dos magistrados, limitações e riscos ao exercício de sua função.
Acima de tudo, aprovação da Lei do Abuso de Autoridade, defendida por muitos dos políticos acusados na Lava Jato e operações assemelhadas, representa uma derrota política do mesmo Moro que, há dois anos, enquanto juiz federal, esteve no mesmo Senado para tentar evitar sua votação. O mundo gira e a lusitana roda.
Helena Chagas é jornalista