’Só se vive uma vez’: novo lema dos que têm tudo e querem se arriscar
A tendência no mercado de trabalho foi detectada nos Estados Unidos, mas, nessa era dos comportamentos heterogêneos, desponta em toda parte
Tem gente que daria tudo para voltar a ter um emprego. Encarar metrô lotado, chefes implicantes, colegas chatos, pouco tempo para a família, tudo seria relevado em troca da estabilidade do trabalho regular.
E tem gente que está jogando tudo isso para o ar. Kevin Roose, colunista de tecnologia do New York Times, detectou a tendência, chamando-a de “economia do só se vive uma vez” – YOLO em inglês.
Na letra do rap de Drake, o cantor dá conselhos irônicos a quem quer segurança: “Fique longe das drogas, enterre o dinheiro no quintal, não viaje de avião, use macacão de titânio”.
É exatamente o que não querem fazer os millenials – a geração nascida entre 1981 e 1994 – identificados pelo colunista como os rebeldes do momento.
Não é exatamente uma novidade e toda geração tem seus insatisfeitos que largam tudo e vão morar na praia ou fazer alguma coisa sem garantia de remuneração a curto prazo – ou até a longo.
Os rebeldes atuais estão sem vontade de voltar ao trabalho presencial. Depois de mais de um ano trancados em casa, experimentaram ou acompanharam alternativas como investir em criptomoedas ou estremecer o mercado com a compra em massa de ações de empresas desvalorizadas pela pandemia, como no caso espantoso da GameStop.
É coisa para poucos, descritos por Roose como os que estão com maior apetite para o risco por causa das “contas bancárias recheadas pela poupança acumulada em um ano de ficar em casa e a alta no mercado de ações”.
“Nem todos podem se dar ao luxo de jogar a cautela para o ar. Mas para um número crescente de pessoais com colchões financeiros e capacidades valorizadas, o medo e a ansiedade do último ano estão abrindo caminho para um novo tipo de audácia profissional”, escreveu o colunista.
O que ele pressentiu como fenômeno via LinkedIn pode ser resumido justamente pelo “Só se vive uma vez”.
É o tipo de fenômeno que está muito longe de poder ser quantificado, mas as novas prioridades criadas pela experiência coletiva da pandemia estão sendo detectadas em várias fontes.
“Ao longo do último ano, nenhuma área passou por uma transformação maior do que o modo como trabalhamos”, resumiu o CEO da Microsoft, Satya Nadella.
Segundo um estudo da empresa, que tem mais de 160 mil funcionários, nada menos que 40% da força de trabalho global pensa em sair do local onde trabalha atualmente, um número nada menos do que espantoso.
As demandas podem parecer contraditórias, mas também podem ser consideradas um desejo legítimo de misturar o melhor de dois mundos: mais de 70% gostariam do sistema híbrido de trabalho e 65% sentem falta do contato pessoal no ambiente profissional.
Mais do que querer o sistema híbrido, muitos já contam que ele não tem volta. O aumento da procura de casas em localidades pequenas, mais próximas da natureza, na região de Londres indica que os interessados já contam que não terão de fazer diariamente longos trajetos de trem e metrô.
As redes de transporte também estão reavaliando tudo. Um dado sobre a queda nos meios de transportes: em 2020, houve uma queda de quatro mil mortes no trânsito nos 27 países da União Europeia.
As empresas, obviamente, já captaram as mudanças e 66% consideram adaptar os locais de trabalho às novas realidades que estão emergindo nos países que já se podem considerar pós-pandêmicos.
Reclamações: 54% dos 30 mil pesquisados acham que estão trabalhando demais, 39% se sentem exaustos e 37% acham que os empregadores estão exigindo muito deles.
Talvez o pior de tudo: o tempo das reuniões virtuais aumentou de 35 para 45 minutos.
Não é de estranhar, portanto, que tantos estejam pensando “Só se vive uma vez”, vamos arriscar uma guinada.