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Príncipe nas trevas: caso do jornalista causa boicote a sauditas

Vira pó o ambicioso projeto que reúne os gigantes da economia mundial na Arábia Saudita e o herdeiro que sabotou a si mesmo vai para a casinha

Por Vilma Gryzinski 19 out 2018, 08h13

Diz das piadas mais cruéis sobre o macabro caso de Jamal Khashoggi, presumivelmente morto e picado no consulado saudita em Istambul: “Os sauditas mandaram quinze homens para matar 3 000 dos nossos em 11 de setembro de 2001. Por que temos que dar a mínima se agora mandaram outros quinze para matar um deles próprios na Turquia?”

O problema, obviamente, é que não existe modo de “não dar a mínima” para o caso, em que se misturam incompetência terminal e barbárie indescritível.

O que mais ou menos se sabe sobre o caso, até agora:

1. Foi realmente enviada uma equipe de 15 agentes, entre integrantes de serviços de inteligência e segurança para a sinistra missão. E não para um “simples” sequestro. Caso contrário, como explicar a presença de um médico legista especialista em necrópsias?

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2. Os serviços de inteligência da Turquia gravaram o que aconteceu dentro do consulado. Como não podem simplesmente admitir isso, disfarçaram. Até um relógio da Apple usado por Khashoggi apareceu como cortina de fumaça. Grampear representações diplomáticas é proibido, mas quem pode, faz. Ao ignoraram que isso acontecia, os sauditas passaram mais um atestado de incompetência.

3. Praticamente “todo mundo” já ouviu os sete minutos de gravação, incluindo gritos de Khashoggi ao ter dedos decepados e uma reclamação do cônsul saudita, dizendo que era melhor “fazerem isso lá fora”, para não complicar a vida dele.

É claro que a Turquia, cujo presidente tinha se tornado uma espécie de protetor de Khashoggi, está fazendo tudo o que pode para detonar os sauditas. É exatamente o que acontece quando se dá munição ao inimigo.

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E não são poucas as inimizadas criadas por Mohammed Bin Salman, o príncipe que atropelou a linha de sucessão para se tornar o futuro rei – isso se não afundar sob o peso da estupidez que cometeu.

Não existe palácio dos sete clãs principais da família real saudita, que ainda funciona segundo as regras das tribos do deserto, onde não esteja sendo discutido o que fazer.

Uma parte desses milhares de príncipes ficou do lado de Bin Salman quando ele acumulou todas as principais funções de governo, especialmente na área de segurança, e lançou um programa reformista de impressionante ambição.

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Outra parte ficou contra, por convicção ideológica-religiosa ou simplesmente por que acabou no Ritz-Carlton, o hotel transformado em prisão de luxo para centenas de bilionários acusados de corrupção.

Muitos só saíram depois de abrir mão de empresas e fortunas. Nunca mais abriram a boca para dizer nada sobre MBS. Dizem que o príncipe mandou prender a própria mãe – não numa cadeia, evidentemente, mas numa espécie de prisão domiciliar, confinando-a a seu próprio palácio para impedir que levasse reclamações dos clãs ao rei Salman.

Com 83 anos e possível limitação cognitiva, o rei Salman deixou o filho predileto, bonitão e inteligente, tomar conta do país inteiro. Dificilmente teria condições de reassumir as rédeas para a longa travessia do deserto criada pelo inacreditável fiasco do caso Khashoggi.

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Entre as várias iniciativas do príncipe herdeiro que queria mudar tudo estava transformar literalmente a Arábia Saudita em uma economia do futuro, desconectada do único foco de seu poder e influência, o petróleo em quantidades astronômicas.

MBS distribuiu dinheiro entre as maiores empresas de relações públicas do mundo para apresentar a imagem de reformista jovem e ambicioso que realizaria um dos maiores desejos do mundo ocidental: a promoção da religião muçulmana sem o extremismo e o jihadismo que haviam se tornado uma das correntes mais violentas do fundamentalismo islâmico.

A capacidade de influenciar um acordo de paz entre Israel e palestinos, conter o Irã e controlar os preços do petróleo também davam a ele a posição de parceiro especialmente estratégico para os Estados Unidos.

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Agora, nem um projeto como a Iniciativa de Investimento no Futuro, simpaticamente chamada de Davos do Deserto, que reuniria os nomes mais influentes das finanças e dos negócios do mundo em Riad, está literalmente no chão.

Steve Mnuchin, o secretário do Tesouro americano, teve que finalmente cair fora.

O desaparecimento do jornalista, sem nenhuma outra hipótese plausível a não ser um espantosamente imbecil assassinato político por ordem de MBS, causa um estrago enorme para a política externa de Donald Trump e afeta negócios com praticamente todos os países ocidentais ricos, que vendem de tudo a um cliente com cheque especial ilimitado.

Nem os aliados republicanos mais sólidos de Trump podem aceitar uma barbaridade desse tipo.

O tempo vai acalmar as reações de revolta, criteriosamente exploradas por um arco de inimigos que vai de Teerã a Washington, e o dinheiro vai voltar a falar? Como na piada macabra do início, os americanos relevaram até o fato de que, dos 19 terroristas do Onze de Setembro, quinze eram sauditas.

MBS sobreviverá à própria estupidez? Existe uma alternativa menos pior do que ele?

Nem que seja só pelo petróleo, as respostas interessam ao mundo inteiro.

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