O importante é vencer; ou disfarçar a raiva de perder
Redes sociais ampliam os ataques de fúria dos olímpicos que não aceitam derrotas
Louis Smith é uma celebridade na Inglaterra. O ginasta ganhou medalha de prata no cavalo com alça e chorou quase de soluçar ao recebê-la. Não de emoção pelo segundo lugar, mas de raiva por perder o primeiro para seu companheiro de time, Max Whitlock.
Os brasileiros estão acostumados a ver lágrimas. Praticamente todos os nossos esportistas choram, sem contar policiais, generais e até corruptos de alto quilate. Para muitos ingleses, as lágrimas ressentidas de Smith foram um sinal de falta de espírito esportivo e de elegância em relação ao colega.
Para complicar, as redes sociais deram um enorme destaque ao que ele parece – repetindo, parece – ter dito quando o resultado saiu. De joelhos, sem contar mais lágrimas, ele não aceitou o gesto de consolo de Whitlock. “Isso é uma porcaria, cara”, foi como sua frase foi interpretada, usando uma palavra menos publicável do que porcaria. Até uma leitora de lábios foi contratada para investigar suas palavras.
Louis Smith, claro, negou tudo. Como em tantos outros aspectos, a questão de origem social permeia o caso. Whitlock, que ganhou espetacularmente duas medalhas de ouro em um dia, é todo certinho e bonitinho – sem contar um certos detalhes que o público gay exaltou. É bastante possível que receba a honraria de cavaleiro do império britânico, com direito a ser chamado de sir.
Smith, filho de mãe inglesa e pai jamaicano, faz o estilo povão. Já participou de um programa equivalente ao Dança dos Famosos e namorou uma daquelas beldades de reality show que nunca aparece coberta por mais de vinte centímetros quadrados de tecido.
Participar nesse tipo de programa também está no currículo de outra péssima perdedora, Hope Solo, a linda, falastrona e encrenqueira goleira do time americano de futebol feminino.
Hope foi atormentada por torcedores brasileiros por ter aparecido com uma espécie de burka anti-zika. Mas nada se compara à sova moral que levou na imprensa americana por ter dito, após a derrota para a Suécia, que seu time merecia a vitória por ter jogado melhor, mas perdeu para um “bando de covardes”.
Teve até editorial pedindo que ela fosse banida da seleção americana. Os autores que se cuidem. Hope Solo já foi detida por agressão contra a meia-irmã e o sobrinho, brigou com os policiais chamados para intervir. O ex-marido dela, Jerramy Stevens, jogador de futebol americano, também foi detido por violência doméstica, no caso, contra Hope. Passou uma noite na cadeia e, no dia seguinte, os dois se casaram.
O judoka egípcio Islam El Shehaby que se recusou a cumprimentar o adversário israelense Or Sasson também fez um papelão, embora por motivos alheios ao esporte. Na era moderna, nada se compara em matéria de ambição esportiva descontrolada ao caso de Tonya Harding, a patinadora no gelo que afundou num lamaçal sem fundo e virou sinônimo de tudo o que de pior o desejo de vencer pode provocar.
O marido e um segurança de Tonya contrataram um marginal para quebrar a perna da sua maior rival, Nancy Kerrigan. Apesar dos golpes de cassetete no joelho, ela foi para o time olímpico de esportes de inverno e ganhou uma medalha de prata. Os outros envolvidos foram para a cadeia.
Nas olimpíadas da antiguidade, o pior participante de todos os tempos foi Nero, o imperador romano mais conhecido por ter assassinado a mulher e a mãe, entre outras monstruosidades. Nero associou sua participação na competição esportiva, numa Grécia sob domínio romano, a concursos de lira e declamação, que considerava suas especialidades.
Sobre a corrida de quadriga, que evidentemente ganhou, há duas versões. Numa, Nero suborna todos os competidores a cair fora à medida em que a corrida avança. Noutra, ele aparece com dez cavalos. Derrapa e cai numa curva, mas mesmo assim – alguém duvida? -, ganha a coroa de louros. Aliás, ele volta a Roma 1 808 diferentes prêmios.
Para Nero, definitivamente, o importante era vencer. Mas já pensaram o que diriam dele, hoje, nas redes sociais?