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Generais ajudam ou atrapalham? Para Trump, as duas coisas

“É um idiota”, proclamou o estrelado John Kelly segundo o livro da semana para destruir o presidente; mas as altas patentes têm valor incalculável para ele

Por Vilma Gryzinski 5 set 2018, 09h01

Se sair ou for saído do governo Trump, John Kelly terá tratamento de herói por todo o espectro da política e da imprensa americana que só pensa naquilo: detonar o presidente.

Virará praticamente um John McCain, sem a parte dos elogios fúnebres. Tratado como velho, safado, superado, canceroso, belicoso e perigoso por pelo menos a metade dos presentes em seu funeral, incluindo os dois ex-presidentes, o senador atingiu status de semidivindade entre antigos críticos por ser solidamente antitrumpista.

John Kelly, que tem no ombro quatro estrelas de general da reserva dos Fuzileiros Navais e a tarefa inglória de organizar o caótico estilo presidencial num cargo equivalente ao de ministro da Casa Civil, aparece no novo livro de Bob Woodward com as palavras mais devastadoras contra Trump.

“Ele é um idiota. É inútil tentar convencê-lo de qualquer coisas. Ele saiu dos trilhos. Estamos no hospício. Nem sei porque continuamos aqui. É o pior trabalho que já tive.”

Será que o veterano marine realmente disse isso? Foi uma avaliação definitiva ou um desabafo momentâneo. Do tipo que praticamente todos os seres humanos em situação de interação profissional já nunca disse — “Não aguento mais trabalhar nesse lugar de doidos. Só tem incompetentes aqui. Isso é um inferno etc etc”?

A última frase, sobre os probleminhas do emprego na Casa Branca, significativa para um sujeito que participou da invasão e do controle insurreicional do Iraque, já havia vazado em reportagens anteriores.

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E Bob Woodward, ao contrário do destempero amalucado de Carl Bernstein, seu colega de Watergate, é muito cauteloso: não deixa passar nada nas entrevistas com suas fontes, todas criteriosamente apuradas, checadas e, evidentemente, gravadas.

Às vezes, até chato, como aparece na conversa — gravada — que teve com Trump, na qual o presidente reclama, com sua conhecida flexibilidade em relação aos fatos, que gostaria de ter falado com ele para o livro.

Maquiavel da Quinta

Em vez de tentar tirar algo de novo, Woodward passa o tempo todo explicando como tentou de várias maneiras falar com o presidente, sem conseguir. O título “Medo: Trump na Casa Branca” é tirado de uma entrevista que fez com ele em 2016.

Nela, como um Maquiavel da Quinta Avenida, Trump fez uma avaliação crua: “O poder verdadeiro é, e não quero nem usar esta palavra, medo”.

Não é exatamente fácil imaginar Trump lendo o maior pensador político de todos os tempos nos intervalos de O Aprendiz.

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Mas ele certamente tem mostrado um entendimento prático do princípio de que “é melhor ser temido do que amado, se não for possível combinar ambos”.

E provavelmente por isso cercou-se de alguns dos mais brilhantes generais das Forças Armadas dos Estados Unidos — todos certamente de enorme intimidade com as realidades do poder.

Entre muitas frases memoráveis, John Mattis, atual e extremamente focado secretário de Defesa, disse a líderes locais iraquianos que estavam decidindo se iam ficar contra ou a favor dos americanos: “Eu vim em paz. Não trouxe a artilharia. Mas imploro, com lágrimas nos olhos, que entendam: se ferrarem comigo, vou matar vocês todos”.

Alguns generais de Trump se deram mal. Michael Flynn durou apenas 23 dias no cargo de conselheiro de Segurança Nacional e ainda está esperando a sentença na história extremamente enrolada de que mentiu a agentes do FBI sobre contatos que fez com o embaixador da Rússia.

O general H. R. McMaster também não deu muito certo. Segundo o livro de Bob Woodward, Trump o ridicularizava, inflando o peito e respirando audivelmente. Também dizia que seus ternos eram ruins.

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Ninguém espera ternos bons de generais (Paul Manafort, o lobista que foi rapidamente diretor de campanha de Trump e chegou a gastar em um ano 1,3 milhão dólares em ternos, fora as cirurgias plásticas, está atualmente no sistema prisional).

Mas também não é de se esperar que um general como John Mattis diga que o presidente tem o nível de compreensão de uma criança “de quinto ou sexto ano” do ensino fundamental.  Pelo menos a “fontes” que acabarão contando tudo.

O desprezo mútuo entre autoridades civis e militares estrelados é histórico — e inevitável. O mais famoso episódio do gênero aconteceu quando Harry Truman, um vice que virou presidente, demitiu o heróico general Douglas MacArthur, com todas as suas raras seis estrelas, por querer passar carona nas prerrogativas presidenciais durante a Guerra da Coreia.

A frase completa de Truman, dita numa entrevista muitos anos depois, demonstra sua opinião sobre os comandantes militares:

“Eu o demiti porque não respeitava a autoridade do presidente. Não o demiti por ser um idiota filho da ****, embora ele fosse, mas isso não é contra a lei para os generais. Se fosse, de metade a três quartos deles estariam na cadeia.”

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Sem reeleição

Os Estados Unidos têm uma formação histórica completamente diferente dos países latino-americanos, onde os movimentos pela independência e o poder político se tornaram território preferencial dos militares profissionais, praticamente a única instituição funcional, fora a Igreja.

O horror à concentração de poder e ao próprio conceito de um governo forte, em detrimento das liberdades do cidadão, levaram George Washington (o primeiro seis estrelas) a renunciar como comandante-chefe em 1783, depois de consolidada a vitória da independência. Originalmente, ele era fazendeiro. Voltou a ser.

O primeiro presidente americano (de 1789 a 1797) também rejeitou um terceiro mandato, sugerido por seu ex-assessor militar, o governador de Connecticut. Não sem uma certa bronca contra políticos que não respeitam “nem a verdade nem a decência, sem respeito pelas pessoas — públicas ou privadas — que divirjam delas na política”.

Bem, as coisas não mudaram muito — embora algo exacerbadas pela personalidade conflituosa de Trump. Dizer que a Casa Branca vive em “colapso nervoso” talvez seja um certo exagero do cuidadoso Woodward.

Os “generais de Trump” não têm muito tato nem diplomacia para “domar” Trump — e depois deixar vazar seus feitos —, mas trazem estabilidade, a inigualável experiência de comando do mais poderoso exército da história e o estilo lacônico que se espera dos líderes militares desde Esparta.

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“Por favor, não mencionem o meu filho”, disse John Kelly quatro dias depois de perder o caçula, explodido aos 29 anos por uma mina no Afeganistão, em novembro de 2010. Ele estava falando numa cerimônia dedicada a homenagear os que se sacrificam no serviço militar, mas não queria personalizar o assunto.

Segundo o livro de Bob Woodward, o general John Mattis respondeu assim quando Trump, enfurecido, quis saber por que os Estados Unidos gastavam tanto para manter um grande contingente militar na Coreia do Sul, com capacidade para interceptar em segundos qualquer ataque norte-coreano:

“Estamos evitando a Terceira Guerra Mundial.”

Mattis, que compreende a grande responsabilidade acoplada a um poder avassalador, também “modulou” a reação de Trump ao uso de armas químicas contra pelo regime de Bashar Assad.

“Vamos matar esses ******. Vamos matar esses ****** todos”, gritou Trump.

De forma involuntária, Bob Woodward acabou levantando a bola de Trump. Quem nunca teve vontade de dizer, aos ver os corpos inertes de criancinhas mortas espumando pela boa: “Por que os americanos não matam esses desgraçados todos?”

Assad faz parte de um governo reconhecido e tem aliados importantes — a Rússia, por exemplo. Não pode ser simplesmente bombardeado até só ficar terra arrasada.

Já em relação a seus antagonistas do Estado Islâmicos, os generais de Trump fizeram exatamente o que ele deu livre escolha para fazer. Ponto, de valor incalculável, para os generais.

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