Nota técnica sobre saúde sexual gera exoneração no Ministério da Saúde
Integrantes da Secretaria de Atenção Primária à Saúde foram afastados após reclamação de Bolsonaro. Pasta afirma que documento foi divulgado indevidamente
O Ministério da Saúde exonerou nesta sexta-feira, 5, integrantes da equipe técnica da Secretaria de Atenção Primária à Saúde por causa de uma nota técnica com orientações sobre o acesso à saúde sexual e à saúde reprodutiva no contexto da pandemia do coronavírus.
O documento chegou a ser divulgado no sistema interno do Ministério da Saúde, e teve forte repercussão nas redes sociais, gerando reclamações do presidente Jair Bolsonaro. Procurada pela coluna, a pasta informou que eventuais exonerações fazem parte da composição de nova equipe, mas admitiu que a “minuta” da nota técnica foi divulgada indevidamente (veja a íntegra do posicionamento ao fim da reportagem).
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Clique e AssineSegundo a coluna apurou, temas tratados na nota técnica, como a inclusão da contracepção como necessidade essencial durante a pandemia, desagradaram a equipe do ministro interino da Saúde, general Eduardo Pazuello, que assumiu o cargo após a saída de Nelson Teich. O general assina as exonerações.
Entre outros pontos, a nota técnica afirma que devem ser considerados como essenciais e ininterruptos “os serviços de atenção à violência sexual; o acesso à contracepção de emergência; o direito de adolescentes e mulheres à SSSR [saúde sexual e saúde reprodutiva] e abortamento seguro para os casos previstos em Lei; prevenção e tratamento de infecções sexualmente transmissíveis, incluindo diagnóstico e tratamento para HIV/AIDS; e, sobretudo, incluindo a contracepção como uma necessidade essencial”.
Os dois integrantes da equipe da secretaria que foram exonerados de seus cargos no Diário Oficial da União desta sexta, 5, são a Coordenadora de Saúde das Mulheres, Flávia Andrade Fialho, e o Coordenador-Geral de Ciclos da Vida, Danilo Campos da Luz e Silva.
Outro ponto da minuta de nota técnica que teria incomodado a atual gestão do Ministério da Saúde é a recomendação para que os serviços de saúde aproveitem “a presença de usuárias em qualquer ponto de atenção para ofertar aconselhamento em planejamento sexual e reprodutivo”. A nota também orienta que o serviço de saúde deve “garantir e ampliar a oferta de inserção do DIU de cobre nas maternidades, como ação complementar à Atenção Básica, durante o período pós-parto e pós-aborto imediatos”.
Internamente, as demissões são vistas como decisão da ala ideológica que percorre todo o governo. Servidores dão como exemplo uma frase da ministra dos Direitos Humanos, Damares Alves, na reunião ministerial do dia 22 de abril. Na ocasião, Damares afirmou que o Ministério da Saúde está “lotado de feministas” que querem a liberação do aborto. “O ministério […] tá lotado de feminista que tem uma pauta única que é a liberação de aborto. Este governo é pró-vida”, disse.
O que diz o Ministério da Saúde
Procurado pela coluna, o Ministério da Saúde informou que “a Secretaria de Atenção Primária à Saúde (SAPS), do Ministério da Saúde, informa que o documento indevidamente veiculado em mídias sociais e meios de comunicação social, referente à minuta da Nota Técnica nº16/20, elaborada pela Coordenação de Saúde da Mulher (COSMU/SAPS), não foi demandado nem apreciado por esta Secretaria de Atenção Primária à Saúde”.
“Desta forma, a referida minuta não possui legitimidade desta Secretaria e o assunto em comento não foi discutido no âmbito do Ministério da Saúde. Informamos que as medidas administrativas foram adotadas para identificar a falha processual e os responsáveis pela elaboração e divulgação não autorizada da referida minuta”, diz ainda a pasta, explicando que “eventuais exonerações fazem parte parte da composição de nova equipe”.