A casa caiu para Bolsonaro
Está cada vez mais difícil evitar o derretimento completo do mito do governo incorruptível
Já vínhamos repetindo como uma ladainha, que uma coisa era a certeza de não haver estourado – até agora – escândalos de corrupção no governo Bolsonaro; outra, bem diferente, é de não haver esquemas de corrupção, em gestão ou em andamento, em um determinado governo.
As graves denúncias de malfeitos que envolveriam um contrato do governo Bolsonaro para a aquisição do imunizante Covaxin vieram para não deixar mais pedra sobre pedra nessa conversa fiada que os bolsonaristas insistem em vocalizar.
Mas difícil mesmo era acreditar que um núcleo político familiar cuja fagulha original traz o DNA de rachadeiros, e que convidou o Centrão inteiro para participar de seu projeto de governo, poderia atravessar uma pinguela sem se sujar de lama.
Embora as bases bolsonaristas mais fanáticas ainda relutem a entregar os pontos – agarrando-se em novas versões que se apresentam diariamente, conflitantes, a cada aprofundamento das denúncias – está cada vez mais difícil evitar o derretimento completo do mito do governo incorruptível.
Pela gravidade dos fatos, o presidente Bolsonaro, na ocasião em que soube do imbróglio, em março (há três meses), deveria ter formalizado um despacho, datado e por escrito, determinando sua apuração cabal, e encaminhado ao Ministério Público Federal ou à Polícia Federal, essa última via Ministério da Justiça.
Não fez isso. Não formalizou nada, mesmo sendo o chefe de governo, isto é, tendo sob seu comando toda a burocracia federal. E certamente não deve ter comunicado nada oralmente.
Logo, não pode provar que tomou qualquer medida. Na realidade, tudo indica que ele não tomou a providência pois certamente não acreditava que a coisa iria adiante.
O que o governo faz agora, em finais junho – exonerando servidores suspeitos, suspendendo o contrato da Covaxin e determinando apuração da Polícia Federal no caso, só reforça a convicção de que Bolsonaro teria de fato se omitido, ou melhor, teria prevaricado.
Exonerar, suspender contrato e mandar a Polícia Federal apurar eram as medidas a serem tomadas – no papel – em março passado. Agora, soa como colocar tranca em porta arrombada.
A casa caiu para Jair Bolsonaro.