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Por Coluna
O que é fato e ficção em filmes e séries baseados em casos reais
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A história real de superação do filme ‘O Que te Faz Mais Forte’

Roteirista conta o que é verdade e o que é ficção na cinebiografia de Jeff Bauman, um dos sobreviventes do atentado de Boston

Por Mariane Morisawa, de Los Angeles
Atualizado em 16 fev 2018, 08h00 - Publicado em 16 fev 2018, 08h00

Em 15 de abril de 2013, Jeff Bauman, conhecido por dar o cano, apareceu, como prometido, na linha de chegada da Maratona de Boston para recepcionar a ex-namorada Erin. A explosão de duas bombas caseiras, quase a seu lado, mudou sua vida para sempre, assim como a de Erin e seus familiares. Jeff perdeu as duas pernas no atentado, e sua recuperação e aceitação de sua nova condição são o tema de O Que Te Faz Mais Forte, de David Gordon Green, com Jake Gyllenhaal no papel principal e Tatiana Maslany como Erin Hurley. O roteirista John Pollono partiu da autobiografia de Jeff, escrita em parceria com Bret Witter e lançada no Brasil recentemente pela Vestígio, mas também entrevistou o próprio, Erin, amigos e familiares, além de Carlos, o homem que salvou a vida de Jeff logo depois das explosões. “O livro foi escrito tão rapidamente que ele ainda não tinha muita perspectiva”, disse Pollono em entrevista ao blog É Tudo História. “No tempo em que passei com eles, a verdadeira história surgiu. No fim, o filme é sobre as coisas que ele teve medo de colocar no livro.” O roteirista, claro, precisou condensar algumas partes e criar uma estrutura dramática. A seguir, o que é fato e o que é ficção no filme:

 

A noite anterior

(//Divulgação)

No começo de O Que Te Faz Mais Forte, Jeff trabalha num supermercado atacadista e consegue escapar para ir a um bar e assistir a um jogo do seu time de beisebol do coração, Red Sox. Quando chega, quase toda a sua família está lá. Pouco depois, entra Erin, com quem estava rompido na época e que vai correr a maratona para coletar fundos para o hospital onde trabalha. Jeff, carismático, pede a todos para contribuir e promete estar esperando na linha de chegada, no dia seguinte. Na verdade, as coisas não foram exatamente assim. “Condensamos coisas que aconteceram em dias diferentes na noite anterior à maratona”, explicou Pollono. “Mas é verdade que ele trabalhava no Costco, não era um cara de muita ambição, e fazia o que podia para ver o Red Sox jogando”, disse.

 

Na linha de chegada

(//Divulgação)

No filme, Jeff acorda, prepara um cartaz e corre para a linha de chegada, onde espera Erin. Ele vê um dos terroristas, vestido de preto, de óculos escuros e mochila nas costas. “Ele tinha o costume de marcar e não aparecer. Foi por isso que romperam o relacionamento, porque ele não aparecia. Ironicamente, desta vez ele estava lá”, disse Pollono. Essa parte é verdade, mas Erin sabia que ele estava indo, acompanhado de duas de suas amigas. Os três chegaram a encontrá-la num outro ponto da maratona.

 

Como a família ficou sabendo

(//Divulgação)

Erin se aproxima da chegada quando vê a explosão. A maratona é interrompida. Pouco depois, ela está num bar, ligando para a irmã e sem saber como voltar, já que seus pertences ficaram na linha de partida, 40 quilômetros antes. E então ela vê na televisão a famosa foto de Jeff com o cabelo cheio de poeira, carregado numa cadeira de rodas. Decide procurá-lo nos hospitais. “Foi um evento tão traumático que ao conversar com os familiares cada um tem uma versão ligeiramente diferente do que ocorreu. É assim que a mente humana lida com o trauma. A maior parte da família e creio que Erin também descobriu o que aconteceu com Jeff ao ver sua foto na televisão ou online, ou alguém mandou a foto”, disse Pollono. O roteirista afirmou que ela não chegou a ver a bomba, só soube que algo tinha acontecido porque a maratona foi interrompida. “Foi uma grande aventura para ela conseguir chegar ao hospital que não está inteira no filme. Tivemos de fazer funcionar em poucos minutos, mas levou um tempo para conseguirem descobrir as coisas, dado o caos da situação. E essa foi a pior parte para a família.” No livro, Jeff contou que na verdade Erin descobriu que ele estava ferido porque uma amiga avisou.

 

Não perde a piada

(//Divulgação)

Depois de passar por cirurgia, Jeff finalmente acorda. Fica sabendo que perdeu as duas pernas. Mas, entubado, consegue apenas escrever e anota: “Tenente Dan”, referindo-se ao personagem de Gary Sinise em Forrest Gump – O Contador de Histórias, que usa cadeira de rodas. “Aconteceu mesmo”, disse Pollono. “Seu senso de humor foi fundamental para ajudá-lo a atravessar esse período, mas também serviu para desviar-se da dor.” No hospital, seu pai (Clancy Brown) é abordado por um repórter no banheiro. “Não tenho certeza se alguém realmente veio ao banheiro, mas algo próximo disso aconteceu”, explicou Pollono. “Muitos jornalistas queriam tanto dar o furo que usaram táticas questionáveis. Os familiares ficaram muito paranoicos pois temiam que descobrissem que Jeff tinha sido fundamental em apontar quem eram os terroristas, que estavam fugindo da polícia.” O seu superior na empresa, Kevin (Danny McCarthy), vai visitar e é confundido com um repórter. Quando ele explica quem é, o pai o confronta perguntando se vai dar o emprego de volta para Jeff. Kevin explica que não porque Jeff não vai ser demitido e tem direito a seguro. “Foi o que me contaram e tirei o diálogo do livro, mas dramatizei um pouco”, contou o roteirista.

 

Erin se sente culpada

(//Divulgação)

No hospital, Erin diz a Jeff sentir-se culpada por ele estar na linha de chegada por causa dela. Jeff responde que ela não lhe deve nada. “Quando fui me aprofundando com eles, percebi que essas eram emoções presentes”, contou Pollono. “Você se coloca na situação e tenta sentir o que aquelas pessoas sentiram. Os dois expressaram esses sentimentos, e eu quis incluir porque achei que era muito poderoso.”

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Do jogo dos Bruins a Oprah

(//Divulgação)

Jeff Bauman é convidado para carregar a bandeira dos Bruins, o time de hóquei de Boston. Ele fica nervoso e tem um ataque de pânico depois, no elevador, com Erin presente. “Sim, aconteceu. Não estava no livro, mas ao conversar com a família a verdade veio à tona”, contou Pollono. Sua mãe, Patty (Miranda Richardson), embarca na onda de que ele é um herói, um conceito que deixa Jeff incomodado. “A mãe fez o melhor que podia. Ela estava fazendo de bom coração. Na família não há vilões. Cada um fez seu melhor, mas não estavam preparados para isso.” Patty lê as cartas enviadas a Jeff. “Acredito que respondeu para todos. Mas para Jeff era muito doloroso”, explicou Pollono. A mãe também aceita uma entrevista de Oprah Winfrey, que Jeff se recusa a fazer por querer evitar as aparições públicas por um tempo. Na realidade, porém, ele deu uma entrevista ao jornalista Brian Williams.

 

Momento irresponsável

(//Divulgação)

Enquanto Erin o espera num restaurante, Jeff sai com seus amigos para uma noite de bebedeira. Ele se joga de um balanço e, com a ajuda dos outros, dirige um carro, sendo parado pela polícia, que o deixa ir depois de ver de quem se tratava. “É um comportamento teoricamente verdadeiro, mas foi dramatizado e inventado para se encaixar no filme”, disse Pollono. “Esse tipo de comportamento eu vi com meus próprios olhos, quando o conheci pela primeira vez, ele estava mal, bebendo demais, usando isso como um mecanismo de defesa. Seus amigos o incentivavam, mas eles não sabiam como fazer diferente, só queriam ser bons amigos. Erin foi a única que o enfrentou e viu como ele estava pouco saudável.”

 

Sessões de fisioterapia

(//Divulgação)

No filme, Jeff Bauman começa a perder algumas sessões de fisioterapia fundamentais para seu restabelecimento. Não ajuda que sua mãe também se entrega à bebida. “Sua recuperação foi retardada porque durante uma época ele não conseguia focar nem se comprometer totalmente. Ele estava bebendo demais e evitando as sessões”, disse Pollono. “É uma tática. Mas tinha a ver com sua personalidade. Ele não mudou porque uma bomba explodiu. Era o mesmo cara. E esse homem evita confronto e dor em sua vida. Até que Jeff começou a enfrentar essa dor e sua vida começa a mudar. É disso que trata o filme.”

 

Contatos forçados

(//Divulgação)

Após o atentado, Jeff Bauman passa a ser abordado por pessoas desconhecidas, que querem autógrafos ou fotos. Nem sempre ele se sente bem. “Queria mostrar como a cidade e o país queriam que ele se curasse para que eles se sentissem melhor”, disse Pollono. “E o filme tenta deixar claro como isso na verdade torna as coisas mais difíceis para ele. Só porque você chama alguém de herói, não é que a pessoa vai se sentir assim. Jeff gosta de agradar as pessoas, como muitos filhos de pais divorciados, então ele tentava fazer os outros felizes e dar a eles o que achava que eles queriam. Mas na verdade ele estava sofrendo muito.” Numa das cenas, dois homens dizem a ele para admitir que foi tudo uma fraude, que não houve atentado de verdade e ele foi contratado para fingir ter perdido as pernas. “Ele me contou isso e ouvi as histórias de outras pessoas e inicialmente não acreditei. Mas coloquei no roteiro e algumas pessoas que leram disseram que era maluco e que não dava para acreditar. Mas mantivemos – e hoje temos todos esses casos de teorias da conspiração e ‘fake news’ na internet.”

 

Medo da gravidez

(//Divulgação)

Jeff reage mal quando Erin lhe dá a notícia de estar grávida. Em um diálogo no carro, afirma não entender nem por que Erin está com ele. “Não sei se eles tiveram uma conversa tão dramática – e certamente os atores injetaram a cena com suas próprias emoções”, disse Pollono. “Mas a realidade é que eles estavam com medo de terem engravidado, e Jeff, que mal podia cuidar de si mesmo, estava apavorado de ser pai. Uma coisa que ele me disse que realmente ficou comigo é que ele se achava um fracasso antes e agora se achava um fracasso sem pernas. Isso foi algo com que ele estava lutando.”

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Carlos

(//Divulgação)

No filme, Jeff reluta em se encontrar com Carlos (Carlos Sanz), o imigrante latino que o salvou. O rosto de Carlos nem aparece nas cenas, só seu característico chapéu. Mas perto do fim do filme, Jeff finalmente aceita o encontro, e ele muda sua vida. Carlos perdeu um filho na guerra e, no desespero, ateou fogo a si mesmo. O outro filho não suportou a dor e cometeu suicídio. Carlos agradece a Jeff porque sentiu ter ajudado seu filho por meio dele. Na realidade, os dois se viram muito tempo antes. “Parte do desafio deste filme e de qualquer um que lide com conflito pessoal é que você não quer um personagem que de repente diz: Ah, agora entendi. É preciso dramatizar”, explicou Pollono. “Jeff tinha dificuldade de encontrar um propósito em sua vida. E Carlos contar sua história naquele momento faz com que entenda seu papel e encontre um propósito. Uma das maiores qualidades de Jeff, que eu testemunhei, é sua habilidade de se conectar com as pessoas. Mas isso levou um tempo para alcançar. Carlos foi chave nisso. Se ouvíssemos essa história antes no filme, não significaria tanto para o personagem Jeff. Quando ele conta finalmente, estamos preparados para ouvir. É uma escolha dramática.”

 

Red Sox

(//Divulgação)

Jeff Bauman é convidado para fazer o arremesso inicial num jogo do Red Sox. Dá para perceber que ele já não está tão abalado. Fica empolgado e até treina com os amigos. “O Jeff de hoje está num bom momento. A realidade é que quando ele fez aquele arremesso ainda tinha um longo caminho a percorrer”, disse Pollono. “O filme antecipa os acontecimentos, mas ele acabou chegando lá. De qualquer forma, foi um momento extremamente importante para ele, sua família, amigos e para a cidade de Boston.”

 

Aceitação

(//Divulgação)

Após o jogo, Jeff é abordado por dezenas de pessoas. Um homem vem contar que perdeu seu irmão na guerra. Uma menina fala do trabalho que fez para a escola. Outro comenta que estava numa das torres no 11 de setembro. Não foi exatamente assim, mas Jeff foi cercado diversas vezes naquele dia e algo tinha mudado nele, segundo Pollono. “Ele sempre teve medo de multidão, mas ali ele superou e começou a apertar a mão de desconhecidos e falar com eles. Isso realmente aconteceu. Continua acontecendo com ele. Eu vi. As pessoas de Boston nem sempre são tão abertas em relação a seus sentimentos, mas como Jeff é um cara local conseguiu se conectar com outros como ele. Isso é único.”

 

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