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O sanduíche da Belle Époque

Imperdível até hoje, o Croque-Monsieir surgiu um século atrás na capital francesa, para alimentar quem não podia ficar horas na mesa

Por J.A. Dias Lopes Atualizado em 30 jul 2020, 20h33 - Publicado em 19 fev 2018, 12h14

Época de ouro da beleza, cultura e inovação, a Belle Époque, iniciada no final do século XIX, em consequência do progresso industrial, e encerrada em 1914 ao ser deflagrada a Primeira Guerra Mundial, teve como epicentro mundial a cidade de Paris e também iluminou a arte culinária. Nobres e aristocratas europeus ou americanos, que desfrutavam da sua efervescência na capital francesa, saboreavam receitas incomuns em restaurantes elegantíssimos, cultuando as boas maneiras e as demoradas conversações.

Os pratos eram preparados com ingredientes exclusivos: trufa, o cogumelo subterrâneo de sabor inconfundível; foie gras, o cobiçado fígado gordo de ganso ou pato; aves de criação ou de caça; peixes em molhos untuosos. Além, disso, os protagonistas da Belle Époque se esbaldavam em champagnes caros e vinhos espetaculares.

Até então, a cozinha da moda seguia os padrões dos chefs neoclássicos Urbain Dubois, Jules Gouffé e Joseph Favre. Quando a Belle Époque se instalou, o novo estilo de comer foi interpretado por cozinheiros que poderiam ser considerados esteticamente românticos, como Prosper Montagné, Édouard Nignon e Auguste Escoffier, o mais importante dos três.

Pois no meio dessa exuberância, que deu à Paris o título de Cidade-Luz, apareceu um sanduíche voltado às pessoas que não dispunham de tempo para passar horas na mesa. É o Croque-Monsieur, hoje apreciado internacionalmente. Seu nome agrega duas palavras evidentemente francesas. Croquer é trincar, devorar, comer depressa. Mas também pode ser tostar levemente, no caso uma das opções com o pão usado na montagem do sanduíche.

Monsieur é senhor. Uma versão simpática, porém controvertida, acredita que esse substantivo foi agregado pelos garçons parisienses. Quando atendiam o pedido do cliente, eles acrescentavam naturalmente o tratamendo “monsieur”: “Le Croque, monsieur”. Entretanto, o filólogo francês René Girard, no livro “Histoire des Mots de la Cuisine Française” (“História das Palavras da Cozinha Francesa”), publicado em 1947, apostou em outra história.

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Contou que o Croque-Monsieur foi criado em 1910 por Michel Lunarca, dono do bistrot Le Bel Âge, que funcionava no 23 Boulevard des Capucines, fervilhante bairro parisiense na Belle Époque. Postais da éóca exaltaram o seu intenso movimento e a arquitetura harmoniosa. O pintor impressionista francês Claude Monet o retratou em famoso óleo sobre tela.

Le Bel Âge, eufemismo para velhice, evoca paradoxalmente a exuberância dos bons tempos do bistrot da Belle Époque. “Quem for hoje ao local onde ele funcionava, porém, vai encontrar um restaurante chinês”, avisa o fotógrafo brasileiro Antônio Ribeiro, fã do Croque-Monsieur, que por vinte anos trabalhou em Paris. “Entretanto, poderá saborear em frente, no elegante Café de Paris, um dos melhores sanduíches elaborados conforme a receita original”.

Há uma explicação considerada mais verossímil para a invenção do Croque-Monsieur do que a envolvendo os garçons parisienses. Lunarca, dono do bistrot Le Bel Âge, havia incluído no cardápio um novo sanduíche feito no pão de fôrma, em vez da tradicional baguette. Querendo mais informação, um cliente indagou-lhe qual a carne que ia dentro do sanduíche. Lunarca respondeu em tom de brincadeira: “De la viande de monsieur!” (“É carne de um senhor”, em tradução livre). Os outros clientes acharam graça e no dia seguinte já solicitavam Croque-Monsieur.

Resumidamente, o sanduíche consiste em um pão de fôrma com presunto, queijo e molho béchamel. Assa no forno, chapa ou frigideira, é servido depois de gratinado. Se receber em cima um ovo frito, transforma-se em Croque-Madame. Reza a lenda que essa variação surgiu por exigência de uma mulher.

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Ela teria achado o nome do sanduíche “machista”. Para contentá-la, o chef alterou a receita, “coroando-a com um ovo frito”, como alguém já escreveu. Outros discordam da explicação “feminista”. Garantem que o Croque-Madame foi chamado assim apenas pelo ovo lembrar os chapéus femininos de antigamente.

Há muitas interpretações do sanduíche original, sobretudo no exterior do país, mas só o Croque-Madame é considerado ortodoxo. Se levar tomate, converte-se em Croque-Monsieur Provençal; com queijo bleu d’auvergne, torna-se Auvernês; e daí em diante. Os franceses mais exigentes, entretanto, não deixam de usar os ingredientes tradicionais.

O pão oficial é o de fôrma, denomindo “pain de mie”, sendo opcional a brioche quadrada. Tostava antes de ser recheado? Não há notícia disso. Geralmente não se tosta. A parte interior, que fica junto ao recheio, deve estar porosa, como uma espécie de esponja, para acolher generosamente um dos molhos mais simples e deliciosos da culinária tradicional francesa, mundialmente conhecido: o Béchamel.

Quanto ao queijo, recomenda-se o suíço Gruyère. Entretanto, o Croque-Monsieur mais qualificado incorpora o Comté, de aroma e sabor particulares, fabricado na região francesa do Haut Jura. Há quem use o Emmenthal. O chef francês Eric Berland, de São Paulo, prefere juntar o Gruyère ao Emmenthal, incorporar gema de ovo, mexer bem, e misturar ao Béchamel, criando o molho Mornay, que vai dentro e sobre o sanduíche.

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E o presunto? Precisa ser o cozido, de preferência o Jambon de Paris ou o Jambon Blanc. Jamais o cru, que endurece com o calor do forno. Já o melhor acompanhamento é uma singela salada de alface ou batatas fritas. Para beber, um vinho. O fotógrafo Ribeiro prefere um tinto seco, de preferência os tranquilos do Vale do Loire.

Personalidades francesas já se declararam apreciadoras do Croque-Monsieur, entre as quais os ex-presidentes franceses Giscard d’ Estaing e François Mitterrand. E o mais ilustre fã do Croque-Monsieur pode ter sido o escritor Marcel Proust, célebre pela obra “À la Recherche du Temps Perdu” (“Em Busca do Tempo Perdido”), publicada em sete partes entre 1913 e 1927.

Ele o cita no segundo livro da série, intitulado “À l’Ombre des Jeunes Filles en Fleurs” (“À Sombra das Raparigas em Flor”: “Agora, ao sair do concerto (…), paramos um momento, minha avó e eu (…), para trocar algumas palavras com Madame de Villeparisis, que (…) havia encomendado para nós, no hotel, Croque-Monsieur (…)”. Nenhum outro sanduíche mereceu uma referência literária tão ilustre.

RECEITA

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CROQUE-MONSIEUR

Rende 1 sanduíche

INGREDIENTES

MOLHO MORNAY

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.250 ml de molho Béchamel (em uma panela, derreta 25g de manteiga, junte 25g de farinha de trigo e mexa, para os ingredientes ficarem bem incorporados. Acrescente 250ml de leite frio e mantenha em fogo baixo, mexendo sempre, por uns 10 minutos, até obter um molho espesso e uniforme. Tempere com um pouco de sal, pimenta-do-reino e noz-moscada. Retire do fogo).
.50 g de queijo Gruyère ralado
.50g de queijo Emmenthal ralado
.1 gema de ovo

FINALIZAÇÃO

.4 fatias de pão de fôrma (ou de brioche)
.4 fatias de presunto cozido
.2 fatias de queijo Gruyère
2 fatias de queijo Emmenthal
.Queijo parmesão ralado para gratinar.

PREPARO

MOLHO MORNAY
1.Misture ao molho Béchamel os queijos Gruyère e Emmenthal ralados. Por último, incorpore a gema e mexa bem.

FINALIZAÇÃO
2.Disponha uma fatia de pão sobre a mesa e comece a montagem do sanduíche, colocando uma camada de molho sobre o pão.
3.Distribua a seguir uma fatia de presunto, em seguida uma fatia de queijo Gruyère, mais uma de presunto e uma de Emmenthal.
4.Feche com a segunda fatia de pão, adicione mais molho e polvilhe com o parmesão ralado.
5.Para o preparo do segundo sanduíche, repita os passos da finalização.
6.Aqueça os sanduíches no forno e finalize gratinando o queijo.

Receita do chef Eric Berland, do restaurante Parigi, de São Paulo, SP.

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