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Por Coluna
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“No meio do caminho, a pedra” e outras notas

Vou me lembrar de que no meio do caminho do autoritarismo de qualquer cor, a pedra será a resistência democrática

Por Valentina de Botas
Atualizado em 30 jul 2020, 20h19 - Publicado em 20 set 2018, 15h48

Valentina de Botas

Para apoiar o pequeno agricultor, a Lei Federal 11.947/2009 determina que 30% da merenda escolar seja fornecida pela agricultura familiar. O governo Alckmin fez cinco licitações para a escolha de cooperativas de agricultores familiares. A Polícia Civil de São Paulo descobriu que uma delas, em vez de adquirir produtos de pequenos agricultores, comprava tudo de uma grande rede de supermercados. Que tal? Isso é estelionato. Eis o famoso caso da merenda escolar, outra história que produziu muito calor e pouca luz. Sumiu a merenda? Não, o que sumiu foi a vergonha. Parte da imprensa e do Judiciário perdeu a vergonha.

Contra Fernando Capez, ex-presidente da Assembleia Legislativa, testemunhas foram coagidas e ameaçadas no gabinete de procuradores e do delegado responsável pelo caso. O fato de as audiências em que se cometeram crimes para apurar crimes serem gravadas não intimidou agentes da lei que enlouqueceram no seu autoritarismo justiceiro. As gravações foram anexadas à defesa dos denunciados. Também com base nelas e no raquitismo da denúncia, depois de 2 anos de investigação e de Capez chegar a ter sido preso, a acusação contra ele foi arquivada há 3 meses. Vocês ficaram sabendo? Claro que não. Isso não teve nem sombra da repercussão que o “roubo da merenda” teve. As sombras são outras, tanto que, em vez de emergir essa notícia, o que predomina é o “Alckmin merendeiro” entre militantes de Amoêdo e na campanha de Bolsonaro, ao lado do codinome “Santo”, mesmo depois de noticiado que a própria Lava Jato esclareceu que ele não se refere ao ex-governador. Nesta campanha, Alckmin, um homem público de vida limpa, apanhou mais dos outros candidatos do que o representante mutante do PT, a súcia que nos desgraçou e cujo dono está preso por fração mínima de seus crimes, entre eles, o roubo do futuro que estava aqui.

Quando disseminam mentiras, homens públicos novos e veteranos demonstram seu caráter, mas eles passam, as eleições passam, o que fica é um país com culpados impunes, inocentes com a honra destruída e a percepção da opinião pública permanentemente sujeita à deformação, o que confina uma nação inteira à desilusão. Fica um país onde abusos que bolinam o estado de direito, em vez de repudiados por todos os brasileiros, são explorados por especulação financeira, votos e likes. De abuso em abuso, algum bandido pode ser pego, mas receio que o MP(F) e porções do Judiciário, como qualquer grupo humano, não abrigam somente cândidos anjos do bem desinteressados. Ainda que assim fosse, também eles teriam de cumprir a lei para fazer a lei ser cumprida. Fora disso, sobra o Estado pré-hobbesiano: anarquia e brutalidade. Estas ameaçam sobretudo os mais pobres que, reza a lenda, não sabem o que é nem valorizam a democracia; também por isso, esta picuinha burguesa, grego para muita gente (que a conhece ou não), tem de ser aperfeiçoada e ampliada. Fundamental até para quem não se importa e só quer gritar “pega ladrão”. Sem democracia, esse grito é silêncio.

Exausto e zonzo, o país, indicam as pesquisas, não enxerga o centro moderado como alternativa a primitivismos autoritários em que um extremo quer soltar o líder condenado e o outro quer prender todo investigado antes que ele prove sua inocência já que, na continuação do nós x eles, está provado previamente que inocentes são só os que estão com o “nós”. Ambos os extremos trocam a lei pela adesão ideológica. A verdade está no meio? Não sei. Drummond ensina que no meio tinha uma pedra. Na vida das minhas retinas fatigadas de não ver um Brasil civilizado, vou me lembrar de que no meio do caminho do autoritarismo de qualquer cor, a pedra será a resistência democrática, cotidiana e anônima. Fica o recado do poeta para os pastores do petismo e do antipetismo que, degenerado num bolsonarismo rupestre, deformou-se pelo que combatia.

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Parece que rumamos para o autoritarismo que dará-um-jeito-nisso-tudo-que-estaí. Autoritarismo de direita, o que, todos sabemos, é diferente do de esquerda: no de esquerda você é patrulhado se expressar simpatia pela direita; já no de direita, você é patrulhado se expressar simpatia pela esquerda. Amigos, poesia, amores, pizza, Chicabon (né, Nelson Rodrigues?), sexo, desafetos, livros, topada no dedão, filmes, almoço com a parentada, trabalho, riso e choro? Há os de direita e os de esquerda: a vida, nesse obtuso mundo mental asfixiante, fica reduzida à rotulação. E vocês acreditam que ainda tem gente que diz que petismo e bolsonarismo são tudo autoritarismo, tudo treva, que diferente mesmo é um regime democrático em que as pessoas são livres para a liberdade? É a mesma gente esquisitona que diz que glorificar Ustra é o mesmo que amar Fidel; que afirmar que no regime militar (“ditadura” não, por favor) só foi preso, torturado e/ou morto quem mereceu é o mesmo que dizer que na Venezuela há “democracia até demais”. O Brasil tem jeito desse jeito, com essa gente falando em democracia, com essa pedra no meio do caminho?

 

Renan, o inocente

Ocupado em combater a corrupção pelas redes sociais e por porta-vozes moralmente preguiçosos na imprensa, o MPF não conseguiu provas e o STF inocentou Renan Calheiros num dos inquéritos da coleção do senador. E assim, o país que, depois de petrolão e da maior crise de sua história, pode, na pessoa de Haddad, eleger o presidiário que nos desgraçou e cujo partido já deveria ter sido cassado, mas o MPF estava muito ocupado combatendo a corrupção. Desolador constatar que o lavajatismo, subproduto da Lava Jato, tornou o país mais obtuso, mais chato e mais distante do século 21, além de tirar o PT da cova política em que os brasileiros o jogaram nas eleições municipais de 2016, semear uma eleição presidencial que deixará o Brasil mais autoritário e fazer triunfar sobre os fatos a narrativa segundo a qual todos os políticos são iguais, menos Bolsonaro e Lula.

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Tô achando que é pessoal

Eu já não tinha simpatia pelo general Mourão por sua idolatria a ditadores, entre os quais não há lado certo: Fidel e Pinochet estão ambos do lado selvagem do mundo. Aí, ele falou dos meus ascendentes: os índios indolentes e os africanos malandros. Só isso já tinha me deixado bem pistola, quando soube que ele falara mal também da nossa herança ibérica e, então, me lembrei de Helena: portuguesa alva dona dos mais belos olhos verdes entre todos os belos olhos verdes que largou a família rica para viver com um preto pobre só para os dois serem meus avós e povoarem minha primeira infância com lembranças luminosas como pirilampos no meu Pernambuco. Agora, o general fala aquilo sobre mulheres criarem filhos sozinhas: eu crio minha filha sozinha! Esse cara só pode estar de sacanagem comigo. Nem vou discutir se ele está certo ou errado, se ele quis dizer isso ou aquilo, quero só registrar que, na sua falta de tato, de sensibilidade política e de picuinhas civilizatórias como respeito, o provável vice-presidente do Brasil não sabe falar ao conjunto dos brasileiros, pensa que fala à caserna e à gente que goza ao ouvir um casca grossa inculto de fala mansa. Aprenda a se dirigir a bravas mulheres brasileiras tão sofridas, general: tente ser decente, só isso.

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