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Ursos-polares podem morrer de fome por aquecimento global, diz estudo

A pressão imposta pelas mudanças climáticas pôs a vida dos gigantes alvos em risco novamente

Por Luiz Paulo Souza Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 25 fev 2024, 08h00

A pelagem muito branca e o andar desengonçado conferem uma imagem enganosa aos ursos-polares. Maiores mamíferos marinhos carnívoros do mundo, esses animais são constituídos para sobreviver ao extremo frio ártico e para caçar suas presas sem se preocupar muito com a concorrência. Seus únicos predadores históricos eram os povos inuítes, que os matavam única e exclusivamente para subsistência. Até que entraram em cena os caçadores esportivos, o que acabou causando desequilíbrio. Ao longo de um século, cerca de 300 animais foram mortos anualmente, fazendo com que a população chegasse a meros 10 000 durante os anos 1970. Na época, um acordo internacional proibiu a caça. Hoje, a população triplicou. Mas a pressão imposta pelo aquecimento global pôs a vida dos gigantes alvos em risco novamente.

O perigo decorre do derretimento dos blocos de gelo marinho do Ártico, habitat natural dos bichões e local onde correm atrás de suas refeições. O gelo, não tão permanente, vem derretendo continuamente, em razão das altas temperaturas no globo. Com isso, os costumes naturais vêm mudando, assim como sua capacidade de buscar alimento em épocas de baixa. Um grupo de cientistas americanos e canadenses monitorou vinte animais durante o verão setentrional para analisar como se comportariam no período em que boa parte do gelo derrete e eles se veem obrigados a viver na terra. “Ficamos surpresos com a variabilidade do comportamento”, disse a VEJA Karyn Rode, coautora do artigo publicado na Nature Communications.

As observações foram mesmo distintas. Enquanto alguns deles passaram o período de calor em um estado de quase hibernação, a maioria nadou ou caminhou dezenas de quilômetros em busca de alimentos como algas, grama, frutas ou pássaros. Uma constatação, no entanto, foi quase unânime — com a exceção de um sortudo que se alimentou dos restos de um imenso animal marinho, todos perderam peso em uma média de quase 1 quilo por dia, independentemente da tática adotada. “Isto sugere que os ursos não têm estratégias comportamentais e energéticas que possam usar para evitar a perda de peso durante o verão em terra”, diz Rode.

arte urso polar

Essa gangorra climática, a rigor, não é estranha aos ursos-polares, que desenvolveram estratégias naturais para enfrentá-la. Os cientistas, porém, estão intrigados com o fato de que, ao longo das últimas quatro décadas, a duração desse período de estiagem aumentou em três semanas e agora já dura 130 dias. Se chegar a 180 dias, estima-se que pelo menos 24% dos machos morrerão de fome. Justamente por isso, a espécie foi considerada em estado de vulnerabilidade pela União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês).

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Os sinais de que a ameaça é real já começam a aparecer. Hoje, já foram identificadas dezenove populações entre Canadá, Estados Unidos, Rússia e Groenlândia. Destas, dez ainda são pouco conhecidas, mas, entre as mais estudadas, pelo menos três estão em declínio. Entre elas, o grupo da Baía de Hudson, investigado no estudo mais recente. “A perda de gelo marinho foi identificada em vários estudos como a principal ameaça às populações de ursos-polares, o que pode ser o motivo dessa redução do número de animais em alguns pontos críticos”, disse a pesquisadora americana.

Embora os negacionistas das mudanças climáticas afirmem, falsamente, que a população de ursos-polares está aumentando, a triste verdade é que esses fabulosos animais ainda estão na corda bamba da existência. As novidades, contudo, não são todas ruins. Além de revelar que a espécie é, sim, capaz de adaptar seus hábitos a um ambiente diferente, mesmo que não de maneira efetiva para se manter viva por muito tempo, o estudo permitiu a observação de aspectos surpreendentes das interações entre as espécies. Através das imagens captadas nas andanças dos ursos, os pesquisadores conseguiram ver que, apesar de serem solitários, durante o período de provações eles passaram a interagir muito mais entre si. “Foi algo muito fascinante de ver”, diz Anthony Pagano, cientista signatário do estudo. Talvez precisemos de provas como essas para entender que, se preservada, a natureza ainda tem muitas belezas a revelar.

Publicado em VEJA de 23 de fevereiro de 2024, edição nº 2881

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