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Marco Civil da web é só o primeiro passo, diz idealizador

O advogado afirma que, para ter rede segura e democrática, Brasil ainda precisa discutir lei de proteção de dados pessoais, entre outras medidas

Por Claudia Tozetto
29 mar 2014, 08h20

Passados cerca de cinco anos desde que ajudou a idealizar o texto básico do Marco Civil da internet, o advogado Ronaldo Lemos, de 38 anos, enfim, pode comemorar. O projeto de lei, que estabelece os direitos e deveres dos usuários da rede no Brasil, foi aprovado pela Câmara dos Deputados na última terça-feira. “Foi no dia do meu aniversário, quase uma coincidência cósmica”, brinca Lemos, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro. Embora o texto do projeto de lei tenha sofrido várias alterações nos quase três anos em que circulou no Congresso, Lemos diz que a “essência” das ideias contidas ali foram mantidas. É o caso da neutralidade de rede e das regras que regulamentam a retirada de conteúdo da web. O texto agora vai para apreciação no Senado e, se aprovado, segue para sanção da presidente Dilma Rousseff. “É o primeiro passo na direção certa”, diz Lemos. Para construir uma rede que ofereça liberdade e segurança ao usuário, o Brasil deve discutir outros mecanismo. Confira na entrevista a seguir.

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O Marco Civil resolve os problemas da internet no Brasil? Ele é o primeiro passo na direção certa, mas precisamos de outras leis. É preciso discutir a lei de proteção de dados pessoais. O tratado de cooperação judiciária, MLAT (tratado de assistência legal mútua, na sigla em inglês), também precisa de melhorias. Obter informações por meio dele é demorado e difícil. O Brasil pode ajudar a aperfeiçoar esses tratados. Iniciar as discussões é o principal desafio agora.

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Qual o saldo da aprovação na Câmara? O resultado foi positivo e até melhor do que eu esperava. O texto mantém a neutralidade de rede, garante a liberdade de expressão e a obrigatoriedade da instalação de data centers foi retirada. Por fim, a Câmara fez um bom trabalho. É improvável que haja alguma resistência no Senado. Eu acho que o texto não deve sofrer mudanças.

O Marco Civil deixa pendente a regulamentação da neutralidade de rede. Quais regras ainda precisam ser definidas? É preciso definir como proceder quando houver exceções à neutralidade, ou seja, casos em que há uma tolerância. A presidente poderá estabelecer isso por meio de um decreto, mas terá que ouvir primeiro o Comitê Gestor da Internet e a Anatel. A lei já está bem completa e sua aplicação não depende desse decreto. Se a presidente achar que não é necessária nenhuma regulamentação adicional, a lei valerá do jeito que está.

Qual será a contribuição do CGI e da Anatel para a regulamentação? A Anatel é um órgão mais fechado, voltado para regulamentação das teles. Já o CGI tem uma formação mais híbrida, com representantes do governo, setor privado e consumidores. A participação das duas instituições aumenta o controle sobre a regulamentação.

O decreto pode colocar em risco, de alguma forma, a neutralidade de rede? Seria muito difícil mudar o que está definido no Marco Civil após a aprovação do projeto, porque o decreto deriva da lei, então não pode ir além do que ela determina. Mesmo que houvesse alguma tentativa, o decreto seria considerado ilegal. Uma eventual manobra para interferir na neutralidade também geraria consequências políticas.

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O Marco Civil permitirá que a Justiça brasileira responsabilize empresas estrangeiras, mesmo aquelas que não têm escritório no Brasil? No caso das empresas que têm escritório no Brasil, não muda nada. A situação muda para aquelas que não têm, porque o Marco Civil cria a possibilidade de a empresa ser responsabilizada se não cumprir a legislação brasileira. Ela pode ser processada e julgada no país. Contudo, será difícil efetivar a decisão do juiz. Ele terá que enviar uma carta rogatória para um juiz do país onde fica a sede da empresa. Isso pode levar anos para acontecer e o juiz estrangeiro pode se negar a cumprir a sentença.

Isso pode afugentar empresas interessadas em oferecer seus serviços no Brasil? Essa possibilidade existe. Mas, sem a obrigatoriedade dos data centers, hoje ela é muito menor. Antes o problema era mais complicado, porque a empresa poderia ser obrigada a investir em um data center. Agora é um problema legal, não é mais algo que impacte o negócio. O problema é que podemos criar um paradoxo internacional: a Justiça pode pedir para a empresa entregar os dados de um usuário brasileiro que estão guardados nos Estados Unidos, mas a Justiça de lá pode não autorizar a empresa a entregar essa informação.

O Marco Civil pode influenciar outros países que discutem a regulamentação da internet? Ele pode influenciar questões sobre neutralidade e também porque é uma legislação que protege os direitos dos usuários. O Brasil certamente será usado como exemplo em outros países. Se o Marco Civil for aprovado até o início da conferência sobre internet que será realizada em abril (o Encontro Multissetorial Global sobre o Futuro da Governança da Internet, que discutirá princípios de regulação da rede em escala global), o mundo inteiro vai olhar para o Brasil.

Se o Marco Civil for aprovado, o Brasil sai na frente de outros países? Se olharmos para os países emergentes, a China tem a internet totalmente controlada, a Rússia adotou recentemente leis que restringem os direitos dos usuários, assim como já acontece na Índia. Esse movimento do Brasil, de conseguir aprovar uma lei comprometida com o interesse público, representa uma vitória da democracia.

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