O Brasil conseguiu alcançar o tão esperado platô na curva de coronavírus, tanto no número de novos casos confirmados quanto de óbitos. Desde o primeiro caso confirmado da doença em 26 de fevereiro até o final de junho, o país registrou aumento constante da média móvel de novos casos. A partir de 28 de junho, a média móvel se estabilizou entre 36.000 e 38.000.
Em relação às mortes, a subida contínua se deu de 17 de março, quando foi registrado o primeiro óbito, até o início de junho, quando a média móvel chegou a 1038,1, no dia 04 de junho. A partir daí, houve uma estabilização e os valores ficaram entre 975 e 1057,9, na quarta-feira, 22 de julho, quando foi registrada a maior média móvel da pandemia.
Nesta semana, o número de casos parece ter voltado a subir. Entre quarta-feira, 22, e esta sexta-feira, 24, foram registrados os maiores números de novos casos da pandemia, com 67.860, 59.961 e 55.891 confirmações, respectivamente. Na média móvel, foram 37252,3 casos no dia 22 de julho e 39332 no dia 23 de julho e 42.434 nesta sexta-feira, 24. Essa foi a maior média móvel registrada desde o começo da pandemia. Ainda é cedo para dizer se o platô dará lugar a uma nova ascensão da curva, mas essa possibilidade existe, principalmente diante da aceleração da pandemia nas regiões Sul e Centro-Oeste e do risco de uma segunda onda no Amapá, Maranhão, Ceará e Rio de Janeiro.
VEJA ouviu especialistas para entender quais são as medidas e os cuidados que o Brasil deve adotar para controlar a pandemia. “Não há novidade. As medidas são as que já conhecemos e sabemos que funcionam porque foram implementadas com sucesso em países da Europa, que conseguiram não só achatar, mas diminuir a curva e hoje vivem uma vida quase normal. E quais são essas medidas? Uso de máscara, distanciamento físico, evitar aglomerações, manter a higiene das mãos, etiqueta da tosse, quarentenas eficientes, rastreamento de contatos e vigilância constante”, diz a microbiologista Natalia Pasternak, presidente do Instituto Questão de Ciência.
As mesmas orientações foram feitas em um estudo publicado na quinta-feira, 23, na revista científica Science. Pesquisadores de 15 renomadas concluíram que embora a adoção de medidas de distanciamento social, como o fechamentos de escolas e do comércio, tenha reduzido o potencial de propagação do vírus pela metade em São Paulo e no Rio de Janeiro, a epidemia ainda não está sob controle nesses estados e no resto do Brasil. Para controla-la, eles alertam para a necessidade implementar “triagem diagnóstica rápida e acessível, rastreamento de contatos, quarentena de novos casos e medidas coordenadas de distanciamento social e físico em todo o país”.
Testagem em massa com PCR ou teste de antígeno
Para o infectologista e epidemiologista Bruno Scarpellini, da PUC do Rio de Janeiro, os testes sorológicos e de anticorpos são importantes para entender a dimensão da epidemia no país. Mas para controlar a doença, é fundamental identificar casos ativos e isso só pode ser feito por meio do exame RT-PCR ou de testes de antígenos, que identificam a presença do vírus no organismo.
Esses testes mostram as pessoas que estão infecciosas e, portanto, que podem transmitir a doença para outras pessoas. Ao aplica-los em massa, é possível identificar pessoas que nem sabem que estão contaminadas, como as assintomáticas ou que estão no estágio inicial da doença, e isola-las para impedir a transmissão do vírus.
Detecção precoce e rastreamento de contatos
A detecção precoce é fundamental para identificar pessoas que estão no início da doença. A medida contribui não só para um melhor prognóstico da doença, já que essas pessoas são acompanhadas desde o estágio inicial dos sintomas, mas também para prevenir que elas transmitam o vírus.
Isso pode ser feito tanto pela realização de testes quanto por rastreamento dos sintomas por agentes de saúde, se não houver teste para todos. “O importante é encontrar casos suspeitos ou confirmados e rastrear seus contatos”, diz Natalia.
O rastreamento de contatos, ou seja, identificar todas as pessoas que tiveram contato com um caso suspeito ou confirmado, orientar o auto isolamento por 14 dias – período de incubação do vírus – e acompanha-las de perto nesse período, é apontado por autoridades de saúde como uma das maneiras mais eficazes da pandemia. A estratégia foi usada com eficácia em países que conseguiram controlar a disseminação do vírus, como Alemanha e Coreia do Sul. No entanto, no Brasil, ela praticamente inexiste, segundo os especialistas.
No Brasil, a cidade de São Caetano do Sul, na região metropolitana de São Paulo, é um exemplo na aplicação dessa medida. Agentes de saúde da cidade se mantém em contato constante com os contatos de pessoas contaminadas para avaliar sua saúde e garantir que elas estão tomando as precauções necessárias. “É algo trabalhoso, mas que nosso sistema de saúde tem que capacidade de fazer e é extremamente efetivo”, ressalta a micriobiologista.
LEIA TAMBÉM: Produtos importantes para ter em casa em tempos de coronavírus
Uso de máscaras e distanciamento social
A população tem um papel fundamental no controle da doença. A maioria das medidas existentes hoje para controlar o coronavírus dependem diretamente de ações e da cooperação das pessoas, como o uso de máscaras e a manutenção do distanciamento social. “Precisamos dividir com a população a missão de contenção do coronavírus e não simplesmente impor medidas. Essa mensagem de colaboração nunca foi passada de forma clara”, afirma Natalia Pasternak.
Inúmeros estudos já provaram que o uso de máscara é uma das formas mais eficazes de prevenção contra a doença. Recentemente, O diretor do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA, Robert R. Redfield, afirmou nesta semana que a pandemia de coronavírus pode ser controlada nos Estados Unidos em até oito semanas se todos estiverem usarem máscaras.
“As máscaras de tecido são uma das armas mais poderosas que temos para retardar e impedir a propagação do vírus, especialmente quando usadas universalmente em um ambiente comunitário”, afirmou em entrevista para o Journal of American Medical Association.
Ao usar máscara, as pessoas se protegem e ainda protegem as demais, reduzindo de forma substancial o risco de transmissão da doença. Mas para que essa medida seja eficaz, é preciso que a máscara seja utilizada de forma correta – tampando o nariz e a boca. As mais eficazes são as máscaras que possuem três camadas de tecido, segundo Scarpellini. Para quem fica um longo período fora de casa, a recomendação é troca-la a cada duas horas.
Manter distância mínima de 2 metros de outras pessoas quando estiver na rua e evitar aglomerações é essencial para reduzir o risco de transmissão do vírus e manter a doença sob controle.
Quarentena em locais com ascensão da doença e flexibilização consciente
Locais que apresentam aceleração da doença devem adotar uma quarentena efetiva. Essa é a única forma de conter de fato a propagação do vírus, diminuir a curva para níveis seguros e podermos voltar a uma vida normal. “É o que está acontecendo na Europa hoje. Lá ainda não tem vacina nem tratamento eficaz, mas eles conseguiram reduzir a curva e hoje vivem uma vida praticamente normal, sem descuidar da vigilância para evitar o aumento dos casos novamente”, diz Natalia.
Tão importante quanto a quarentena é a flexibilização. O ideal é flexibilizar quando a taxa de contágio estiver abaixo de 1. Ou seja, quando uma pessoa infectada é capaz de transmitir o vírus para menos de uma pessoa. Essa taxa indica que a epidemia está sob controle. “É preciso abrir gradativamente, com segurança e cautela, até chegar o momento que certas medidas não serão mais necessárias porque a curva caiu e conseguimos controlar a doença. Não precisamos nem devemos esperar a vacina para voltar a uma vida relativamente normal. Vamos garantir que possamos fazer isso com as medidas que sabemos que funcionaram em outros países”, ressalta a especialista.
Comunicação eficaz e medidas coordenadas
É unanime entre os especialistas que é preciso haver uma comunicação eficaz e honesta com a população. “Precisamos do engajamento das pessoas em uma mudança de comportamento. Para que isso aconteça, elas precisam ser esclarecidas com informações transparentes e honestas”, afirma a presidente do Instituto Questão de Ciência.
Outro fator importante é a adoção de medidas coordenadas que orientem os estados e cidades sobre como lidar com a pandemia. Para que os gestores saibam quando é o momento de adotar ou flexibilizar uma quarentena, como realizar de forma eficaz o diagnóstico precoce e o rastreamento dos contatos entre outras medidas. “Sabemos que cada região brasileira será afetada de forma e em momentos diferentes pela pandemia, então a resposta não será uniforme. As decisões serão tomadas regionalmente. Mas precisa haver uma coordenação nacional”, diz a Natalia.
Brasil
Nesta sexta-feira, 24, o Brasil registrou uma média móvel de novos casos de coronavírus de 42434 casos – a maior até hoje – e de mortes de 1.055,3. Em números absolutos, o país registrou nas últimas 24 horas, com 55.891 confirmações, terceiro maior número desde o começo da pandemia. No mesmo período foram 1.156 vítimas fatais, totalizando 85.238 mortes por coronavírus. O total de pessoas infectadas chegou a 2.343.366.