Cada vez menores
Estudo de biólogos americanos indica como as ações humanas ao longo de milênios levaram à gradual — e preocupante — redução do tamanho dos animais
No período histórico conhecido como Pleistoceno, que começou há 2,6 milhões de anos e durou até 11 700 anos atrás, a fauna, a flora e o clima do planeta eram completamente diferentes do que vemos e sentimos na atualidade. Há 125 000 anos, os humanos do gênero Homo, que evoluíram de seus ancestrais australopitecos, conviviam com imensos mamíferos que então habitavam a Terra. Mamutes, preguiças-gigantes e tigres-dentes-de-sabre, que agora pareceriam invenções de filmes de ficção científica, dividiam espaço com o mais antigo representante de nossos ancestrais na África Subsaariana. Com o transcorrer dos milênios, essas espécies enormes desapareceram gradualmente (veja o infográfico abaixo). Passaram de uma massa média de 69 quilos para os 17 quilos atuais. De acordo com um estudo publicado pela Universidade do Novo México, nos Estados Unidos, o peso mais comum de um mamífero daqui a 200 anos poderá ser de singelos 7 quilos. E o maior animal terrestre não deverá mais ser um imponente elefante, como hoje, mas uma vaca.
A pesquisa sustenta que esse ritmo de diminuição dos animais tem como origem uma única razão: as ações praticadas ao longo dos séculos pelo homem, que, além de caçar de forma excessiva, criou ferramentas com as quais transforma o planeta, remodelando a natureza e levando ao encolhimento de hábitats, agora tomados por cidades. Com essa nova configuração do meio ambiente, não há mais espaço — literalmente — para mamutes e tigres-dentes-de-sabre. De acordo com os biólogos da Universidade do Novo México, os humanos modificaram e continuam modificando tanto a natureza que, em poucos séculos, vai se tornar inviável a existência de elefantes e ursos fora de zoológicos — a não ser que medidas conservacionistas revertam essa toada. Para chegar a tal conclusão, analisaram-se dados da massa dos animais extintos desde o Pleistoceno, somando-se a eles a massa das espécies que não desapareceram ao longo dos milênios. Com isso, calculou-se a média do tamanho dos mamíferos em cada era. Em seguida, contabilizou-se o atual peso médio dos mamíferos existentes, desenhando-se assim o estágio em que estamos.
Para projetar como será o cenário em 200 anos, com a vaca imperando como o maior animal terrestre (não foram levados em conta os aquáticos, a exemplo das baleias), consideraram-se informações como as contidas na lista de animais à beira de extinção da União Internacional para a Conservação da Natureza. Conclusão: o desaparecimento de espécies sempre esteve, em parte, condicionado ao tamanho e ao peso. Quanto maior fosse o animal, maior seria seu risco de sumir da natureza em definitivo. Eles perderam a Arca de Noé.
“Provamos que as mãos do homem, de nossos ancestrais e as nossas, em todos os continentes, é que levaram ao sumiço de muitos animais magníficos que passaram pela Terra”, disse a VEJA a bióloga americana Felisa Smith, coordenadora da pesquisa. “Não há mais como cogitar que a extinção tenha sido um processo natural, de mera seleção.” Ao considerar que a projeção para o futuro desenhada pela equipe de Felisa revela a vaca como o maior entre os mamíferos, isso significa ainda que estão sob risco os últimos representantes da megafauna que predomina há 125 000 anos — como elefantes, girafas e rinocerontes. No entanto, há uma vantagem inegável em relação ao passado: hoje, o ser humano tem boa noção de como suas escolhas afetam os outros seres vivos do planeta. Diz Felisa: “É preciso uma vontade política global de preservação de ecossistemas. Ou então não veremos mais esses belos animais entre nós”.
Publicado em VEJA de 2 de maio de 2018, edição nº 2580