Em breve o ministro da Casa Civil Rui Costa pode ter motivos para comemorar. O Tribunal de Contas da União (TCU) está prestes a concluir uma investigação administrativa sobre o rumoroso inquérito que apura como o Consórcio Nordeste, que representa os nove estados da região e era presidido pelo homem forte de Lula na época da pandemia, pagou adiantado 48 milhões de reais a uma empresa especializada em cannabis medicinal para a compra de respiradores e nunca recebeu nenhum dos aparelhos.
A transação, que tinha por objetivo comprar 300 ventiladores pulmonares para atender pacientes no momento em que mortes por Covid-19 atingiam níveis alarmantes, foi uma sucessão de desastres: grande parte das negociações para a aquisição dos equipamentos foi feita por WhatsApp, a empresa chinesa supostamente responsável pela fabricação dos aparelhos era de outro ramo, os valores foram depositados adiantados e sem qualquer exigência de garantia e – o mais escandaloso – o Consórcio Nordeste atestou em uma nota fiscal que as máquinas haviam sido entregues e aceitas “em perfeitas condições”. Na verdade, nenhum respirador pago antecipadamente sequer saiu da China.
Por trás da nota fiscal que atestava todo o acervo entregue e “em perfeitas condições” estava a assinatura do então secretário-executivo do consórcio Carlos Gabas. Ex-ministro do governo Dilma Rousseff, ele era braço direito de Rui Costa e passou a ser investigado no TCU pelas barbeiragens no caso. Parecer do Ministério Público junto ao TCU a que VEJA teve acesso mostra que a parte técnica do tribunal rejeitou qualquer tese defensiva do ex-ministro petista e pretende responsabilizá-lo. Diante da calamidade imposta pela pandemia e dos 48 milhões de reais pagos antecipadamente, porém, a proposta de sanção é irrisória: inabilitar Carlos Gabas para funções comissionadas e de confiança em cargos públicos pelo período de cinco a oito anos.
Reportagem de VEJA mostrou que auditores do TCU já haviam concluído, em etapas anteriores do caso, que a documentação para a compra dos respiradores foi produzida para “dar ares risíveis de legalidade ao procedimento” e que Gabas, em especial, “contribuiu efetivamente para a concretização da irregularidade” na aquisição dos insumos para o combate à pandemia. A compra dos respiradores pelo consórcio na época presidido por Rui Costa, completa a auditoria, “além de evidenciar o dano ao erário, (…) escancara a balbúrdia do processo de planejamento, de orçamento e de mitigação de riscos” da compra dos aparelhos médicos.
De acordo com parecer do procurador do TCU Sérgio Caribé, Carlos Gabas elaborou a minuta do contrato de 48 milhões de reais que previa o pagamento adiantado sem se atentar à incapacidade da empresa Hempcare e ao risco de calote, princípios básicos no bom uso do dinheiro público. Para ele, a estimativa de custos dos respiradores foi feita à margem da lei e para “constar um valor que correspondesse exatamente ao da proposta da empresa Hempcare”.
“Tudo isso levou não apenas a um prejuízo de ordem material, mas, certamente, a um dano grave causado à saúde das pessoas que necessitavam dos aparelhos para se curar ou, até mesmo, para sobreviver. Possivelmente, neste caso, a ausência de zelo e diligência causou dano ao bem jurídico tutelado mais importante de nosso ordenamento, que é a vida”, conclui o procurador. A proposta de inabilitar Carlos Gabas para funções de confiança no serviço público ainda vai ser apreciada pelo Plenário do TCU.