Criticada pela força-tarefa da Operação Lava Jato, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou o envio para a Justiça Eleitoral de todas as investigações sobre crimes comuns conexas a crimes eleitorais pode ser revista pelo Congresso Nacional, na avaliação do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro.
Em entrevista à rádio BandNews FM, Moro sugeriu a aprovação do PLP 38/2019, enviado pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) ao Legislativo no mês passado. Dizendo que o Supremo não tomou “a melhor decisão”, apesar de respeitá-la, o ex-juiz citou a proposta e argumentou que a Justiça Eleitoral não está preparada para julgar casos como corrupção e lavagem de dinheiro.
“Eu não acho que as Cortes e a Justiça Eleitoral, apesar de fazerem um trabalho digno de elogios na organização das eleições e na diminuição das controvérsias, estejam preparadas para julgar esses casos”, afirmou. “Como foi uma interpretação legislativa, o que se pode fazer é tentar mudar pela via legislativa. No âmbito do projeto anticrime, nós temos um projeto, que virou o PLP 38/2019, que está ali na Câmara, pode ser apreciado e isso ser alterado”.
O ministro da Justiça afirmou que a sua divergência pública com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), foi um episódio “superdimensionado” e que o seu projeto “vai tramitar”. “Rusgas, algumas palavras ásperas na política, são normais, mas nós já conversamos e estamos tranquilos. O projeto vai tramitar. Cabe ao presidente da Câmara definir a pauta, mas com a liderança dele e do presidente Jair Bolsonaro isso vai se encaminhar para um bom termo”, afirmou.
Projeto
Pelo PLP 38/2019, atualmente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), seriam feitas pequenas alterações no Código de Processo Penal (CPP) e no Código Eleitoral, justamente nos itens que basearam o julgamento do STF sobre o tema. Apresentada antes da decisão do Supremo, a proposta faz valer a posição de Moro e de outros juízes federais, que recorrentemente recusavam pedidos de advogados para enviar os casos às cortes eleitorais.
Na regra eleitoral, o artigo 35, que determina as competências dos magistrados eleitorais, passaria a vigorar sem o trecho “e os [crimes] comuns que lhe forem conexos”, limitando a atuação destes aos temas relativos às eleições. Já no CPP, o conflito entre as Justiças comum e eleitoral é inserido como um terceiro caso em que um fato pode ser investigado e julgado por duas cortes diferentes, sob diferentes aspectos.
Controvérsia
A decisão do STF incomodou a Lava Jato por interferir em um tipo de caso frequentemente investigado pela operação: o de políticos que teriam recebido recursos ilícitos, frutos de corrupção, e destinado parte ou o total desses valores para o financiamento das respectivas campanhas, sem declará-los à Justiça Eleitoral.
O uso de recursos não declarados configura o crime eleitoral de caixa dois; o recebimento de dinheiro em troca de vantagens, o crime comum de corrupção passiva. Em casos como esse, nos últimos anos, os julgamentos foram conduzidos pela Justiça Federal. Agora, deverão ser gradualmente enviados às cortes eleitorais.
Um dos argumentos dos procuradores da operação e do ministro Moro é que corrupção e lavagem de dinheiro são delitos complexos e que demandam atuação de magistrados experientes nesses temas – caso do próprio titular da Justiça, quando este era juiz federal em Curitiba.
Enquanto isso, os magistrados eleitorais teriam expertise na análise de fatos relativos às eleições e às campanhas propriamente ditas, tendo um alto volume de processos em anos eleitorais, e por isso não deveriam assumir a análise de investigações como essas. “A Justiça Eleitoral, reconhecidamente célere nos seus julgamentos, não está bem estruturada para processar e julgar esses casos, cuja discussão jurídica lhe é totalmente estranha. Ela é eficiente e respeitada, exatamente por ser especializada”, escreveu Moro na justificativa do projeto.