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Favoritismo de candidatos à reeleição complica planos do PT e do PL

O retrato da largada na briga pelas prefeituras mostra que quem está na cadeira dificilmente sairá dela

Por José Benedito da Silva, Valmar Hupsel Filho, Victoria Bechara Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 21 jul 2024, 08h00
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  • Quatro anos depois de uma campanha municipal feita sob o espectro da pandemia, as máquinas partidárias começam a se movimentar a partir desta semana para uma eleição que promete ser intensa e nos moldes das antigas disputas. Com o início das convenções, no sábado 20, será dado o pontapé inicial na corrida para emplacar o maior número de prefeitos e vereadores e construir uma base política fortalecida para ajudar a vencer o jogo bruto que se desenha para a contenda nacional de 2026. O retrato da largada permite ver duas fortes tendências, ambas conservadoras: a opção pela reeleição dos atuais prefeitos e a preferência por legendas do centro à direita no espectro político. E sinaliza uma dúvida: o quanto os principais cabos eleitorais do país, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-presidente Jair Bolsonaro, poderão influenciar o resultado das urnas.

    João Campos (PSB)
    João Campos (PSB) (@prefeituradorecife/Instagram)

    A fotografia da largada mostra que quem está na cadeira dificilmente sairá dela. Em um cenário no qual vinte dos 26 prefeitos de capitais disputam um novo mandato, a maioria (onze) está em vantagem na corrida, segundo as pesquisas eleitorais. Outros seis, embora não estejam liderando, estão em posição competitiva. Alguns deles têm a preferência de ampla parcela do eleitorado, o que indica uma tendência a levar a disputa ainda no primeiro turno, como os prefeitos do Recife, João Campos (PSB), que cravou 75% das intenções de voto no último Datafolha, e Bruno Reis (União Brasil), de Salvador, que pontuou quase 68% no Paraná Pesquisas. Eduardo Paes (PSD), do Rio de Janeiro, e João Henrique Caldas (PL), de Maceió, também estão entre os que largam como favoritos porque têm cerca de 40 pontos à frente de seus perseguidores mais próximos (veja os números).

    Bruno Reis (União Brasil)
    Bruno Reis (União Brasil) (@brunoreisba/Instagram)

    Nos últimos anos, as eleições para prefeito assumiram quase que um caráter plebiscitário, em que a questão basicamente é decidida entre as opções de manter ou trocar o prefeito. Nas duas últimas disputas (2016 e 2020), quase 80% dos gestores de capitais foram reconduzidos ao cargo. Um dos motivos, claro, é a avaliação de seus governos. No caso de João Campos, o maior favorito entre os candidatos das grandes cidades, a sua gestão, segundo o Datafolha, é considerada ótima ou boa por 69% dos entrevistados, enquanto 24% a avaliam como regular e apenas 6% a classificam como ruim ou péssima. Os investimentos em zeladoria são o ponto forte da administração. Quando questionados sobre os principais problemas, menos de 5% citam questões como limpeza, calçamento, transporte coletivo, trânsito, moradia, mobilidade e riscos de deslizamentos. Os dois mais citados (perto de 20%), segurança e saúde, não são da alçada exclusiva dos prefeitos.

    Eduardo Paes (PSD)
    Eduardo Paes (PSD) (Ricardo Stuckert/PR)
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    Uma gestão aprovada pela população é, claro, o caminho mais curto para manter o mandato, mas há uma série de outros fatores. Para o cientista político Antonio Lavareda, diretor do Ipespe Analítica, um deles é a exposição. “São amplamente conhecidos e estão trabalhando para ser reeleitos desde o primeiro dia do mandato. São vistos pela opinião pública como candidatos naturais, ao passo que a nossa legislação restringe a visibilidade das candidaturas dos desafiantes”, avalia. Outro ponto é dispor de mais recursos financeiros porque controlam grandes máquinas públicas. Além disso, eles têm o domínio da agenda administrativa e a possibilidade concreta de transformar as alianças que lhes dão sustentação nas Câmaras em coligações eleitorais, com os consequentes arco de apoio político e mais tempo de TV. “Eles têm também posição privilegiada para angariar doações de pessoas físicas, equipes treinadas que conhecem os meandros da administração, com facilidade para fazer programas de governo, e relacionamento continuado com diversos setores da sociedade”, completa. O cientista político Rubens Figueiredo acrescenta o poder de distribuir cargos a lideranças locais e o fato de conhecerem melhor os problemas da cidade porque estão lidando com as dificuldades no dia a dia. “Além disso, acabam se valendo da propaganda da prefeitura”, afirma.

    João Henrique Caldas (PL)
    João Henrique Caldas (PL) (@jhcdopovo/Instagram)

    A identificação com o trabalho do gestor dá segurança à escolha do eleitor, que se guia mais por isso do que pelas questões ideológicas. Eduardo Paes, que está no terceiro mandato, tem a gestão considerada ótima ou boa por 46% do eleitorado — outros 36% a avaliam como regular e 16% a consideram ruim ou péssima. Segundo o Datafolha, apesar de ser próximo a Lula, por quem é apoiado, ele tem 42% dos votos daqueles que escolheram Bolsonaro em 2022 e 49% dos eleitores que se identificam como de direita. “A eleição municipal é bem local. A polarização política tem alguma influência, mas não é tão relevante”, avalia Marcos Pereira, presidente do Republicanos, um dos partidos que, a depender da cidade, transita da direita à esquerda em suas alianças.

    TENSÃO - Bolsonaro com o filho Carlos e Ramagem: ação da PF impactou campanha no Rio, que é prioridade nacional do PL
    TENSÃO - Bolsonaro com o filho Carlos e Ramagem: ação da PF impactou campanha no Rio, que é prioridade nacional do PL (@ramagemprefeito/Instagram)
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    Fatores históricos também contam nas disputas municipais. João Campos, por exemplo, é herdeiro de uma das mais longevas dinastias políticas do Nordeste — é bisneto de Miguel Arraes e filho de Eduardo Campos, dois ex-governadores populares no estado. Em Salvador, a histórica rejeição ao petismo mantém altas as chances de reeleição de Bruno Reis, aliado do ex-prefeito ACM Neto. Mesmo com o PT comandando o estado há cinco gestões, o carlismo caminha para emplacar o quarto mandato seguido na capital. Pesa também o bom trabalho: a gestão de Reis é aprovada por 75% dos eleitores, segundo o Paraná Pesquisas. Em Maceió, João Henrique Caldas também se vale do histórico à direita do eleitorado: a cidade foi a única capital do Nordeste onde Bolsonaro bateu Lula, com 57% dos votos.

    APOSTA - Boulos, Marta e Lula: para o ex-presidente, é prioridade vencer a corrida pela prefeitura de São Paulo
    APOSTA - Boulos, Marta e Lula: para o ex-presidente, é prioridade vencer a corrida pela prefeitura de São Paulo (Roberto Casimiro/Fotoarena/.)

    Se a boa avaliação ajuda, o trabalho questionável, na opinião dos eleitores, pode ser fatal. É o caso dos prefeitos de Belém, Edmilson Rodrigues (PSOL), e de Fortaleza, José Sarto (PDT), que estão com dificuldades para obter um novo mandato. O primeiro tem 13% dos votos, segundo o Paraná Pesquisas, e uma rejeição de 75%. O cearense está com 18% das preferências e a reprovação de 53% do eleitorado. Outro prefeito em dificuldades é Fuad Noman (PSD), de Belo Horizonte. Vice de Alexandre Kalil, ele assumiu em 2022, quando o titular deixou o cargo para tentar o governo do estado, e larga com apenas 9% das intenções de voto, segundo a Quaest.

    O favoritismo dos atuais prefeitos não é a única imagem que se destaca na fotografia da largada eleitoral. Outra constatação é a boa posição dos partidos mais localizados ao centro. Nas 26 capitais, dezesseis têm à frente nas pesquisas políticos representantes de siglas como União Brasil, PSD, MDB, PP e Republicanos. O quadro coloca um grande desafio para PL e PT, os dois maiores partidos, mas que não elegeram nenhum prefeito nas capitais em 2020 — após a eleição, o PL filiou João Henrique Caldas, de Maceió, e Tião Bocalom, de Rio Branco. As principais apostas do PT são Porto Alegre, com Maria do Rosário (a única petista que lidera nas capitais), Teresina, com Fábio Novo, e Fortaleza, com Evandro Leitão. “A disputa não é fácil. Mas alguns prefeitos estão desgastados”, aposta o senador Humberto Costa, coordenador do grupo de trabalho eleitoral do PT. “Temos várias candidaturas competitivas. Estamos fazendo o acompanhamento dessas cidades com lupa e vamos investir recursos do fundo eleitoral”, acrescenta Jilmar Tatto, secretário de comunicação do partido. A estrela da charanga petista, claro, será Lula. No sábado 20, ele abre a temporada de convenções em São Paulo no evento que irá confirmar a chapa de Guilherme Boulos com a petista Marta Suplicy. Nos últimos meses, o presidente intensificou a agenda de viagens e deve gravar vídeos com os principais candidatos, aproveitando a melhora recente de seu índice de popularidade.

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    EM BAIXA - José Sarto, com Ciro Gomes: prefeito de Fortaleza é um dos poucos que não são favoritos nas capitais
    EM BAIXA - José Sarto, com Ciro Gomes: prefeito de Fortaleza é um dos poucos que não são favoritos nas capitais (@sartoprefeito12/Facebook)

    O maior opositor do petismo e da esquerda enfrenta desafios similares. O PL de Bolsonaro tem candidatos em dezesseis capitais e está bem posicionado em pelo menos cinco. O presidente da sigla, Valdemar Costa Neto, tem a meta ambiciosa de conquistar mais de 1 000 prefeituras. A dificuldade é saber o quanto o ex-presidente irá se empenhar. Em 2020, ele apoiou apenas treze candidatos, só dois em capitais, ambos derrotados (Marcelo Crivella no Rio e Capitão Wagner em Fortaleza). Neste ano, a prioridade é a capital do estado fluminense, que é governado pelo partido e reduto eleitoral do clã Bolsonaro. O candidato Alexandre Ramagem (PL), no entanto, saiu bastante chamuscado das últimas revelações sobre a Abin paralela, um esquema de arapongagem clandestina montado no governo Bolsonaro. Nesta semana, o ex-presidente foi ao Rio e fez campanha ao lado de Ramagem, que tem 7% nas pesquisas. Além de Ramagem, Bolsonaro só externou apoio nas capitais a Éder Mauro, que lidera em Belém, Janad Valcari, de Palmas, e Fred Rodrigues, em Goiânia. Em São Paulo, onde o PL apoia Ricardo Nunes, Bolsonaro ainda não teve — e não há, por ora — nenhuma agenda pública de campanha.

    arte prefeitos

    Analistas e lideranças políticas concordam que a disputa pelas prefeituras tende a ser um ensaio geral para 2026 e que a eleição de prefeitos e vereadores pode ser um trampolim não só para levar à Presidência daqui a dois anos como para montar uma base forte no futuro Congresso. O quadro atual mostra que os dois principais polos de projeto político para 2026 terão de se desdobrar para derrubar a tendência ao conservadorismo do eleitor na definição sobre quem prefere no comando de sua cidade. Mais do que radicalismo ideológico, o que parece contar é a busca do cidadão por segurança administrativa e a prioridade dada aos temas do cotidiano — o que é um bom sinal.

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    Colaborou Isabella Alonso Panho

    Publicado em VEJA de 19 de julho de 2024, edição nº 2902

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