Como enfrenta as críticas de quem atribui sua nomeação para o governo unicamente ao simbolismo do caso Marielle? Muita gente me atacou quando fui nomeada ministra dizendo que eu era só irmã da Marielle. Nos últimos cinco anos, fizemos campanha para eleger mulheres negras e pautamos discussões sobre violência política no mundo todo. Isso é o fortalecimento da minha própria história. Para além de ser irmã, carregá-la comigo e ter orgulho disso está na minha essência. Estamos uma ao lado da outra. Estamos sempre juntas.
A senhora já criticou o que seria a banalização da imagem de Marielle pelo país. Por quê? É importante que todas e todos saibam quem era Marielle, mas também que conheçam quais pautas e práticas políticas que ela defendia para que não se torne apenas uma imagem vazia. Ela é um símbolo legítimo que expressa coletivismo, e muitas pessoas ecoam o seu nome, mas precisamos fazer isso com responsabilidade.
A viúva do ex-capitão da PM Adriano da Nóbrega disse em sua proposta de delação premiada que quem mandou matar Marielle foram chefes milicianos. Como é ter entre os ministros do novo governo uma colega acusada de ter relação com milícias? Não cabe a mim julgar nada ou nenhum histórico que a ministra Daniela Carneiro (ministra do Turismo) possa ter tido ou não. Fomos nomeadas pelo presidente Lula e respeito todo e qualquer posicionamento dele quanto a isso. Quem nomeia não sou eu. Não cabe a mim julgar.
Qual é seu principal desafio como ministra da Igualdade Racial em um país historicamente conhecido pela desigualdade? Tem racismo no futebol, em evento religioso, racismo recreativo, em marchinhas de Carnaval. Para muitas pessoas, a irmã da Marielle é abortista, é de esquerda, é maconheira. Nosso intuito é a responsabilização sobre uma série de comportamentos racistas que estão presentes em toda a sociedade. Racismo é crime. Não existe outra expressão a ser usada.
Quando foi a primeira vez que se sentiu vítima do racismo? É difícil dizer ao certo a primeira vez que o racismo atravessa a nossa vida. Lembro de, pequenininha, o ônibus não parar para a gente, lembro dos olhares para o meu cabelo e para minha roupa. Veja que 58 milhões de pessoas votaram em Jair Bolsonaro, uma pessoa que falou tantas coisas grotescas sobre a população negra, LGBTQIAPN+. Parte dessas pessoas não quer dialogar, e sim desrespeitar. Sei que não vai ser fácil, mas quero dialogar com quem pensa diferente.
Publicado em VEJA de 15 de fevereiro de 2023, edição nº 2828