Contratado pela defesa do secretário municipal do Rio de Janeiro, Pedro Paulo Carvalho, para analisar o laudo do Instituto Médico Legal que registrou as agressões dele à ex-mulher Alexandra Marcondes, em uma briga do casal em fevereiro de 2010, o perito Roger Ancillotti produziu um “laudo do laudo” a que o site de VEJA teve acesso: ele inverte papéis e aponta que quem partiu para a agressão foi ela; ele teria se defendido. Recheado de suposições e tecnicalidades, o relatório independente de Ancillotti (que também é perito da Polícia Civil) desqualifica, por exemplo, a descrição do IML de “avulsão pequena” para a lesão de um dente de Alexandra durante a briga, registrada no primeiro relatório: “Avulsão usado na odontologia se refere a um dente que foi deslocado por completo”, sendo assim, “doutrinariamente haveria e com certeza não houve dano estético”, argumenta.
A briga entre Alexandra e Pedro Paulo, apoiado pelo prefeito Eduardo Paes à sua sucessão na eleição deste ano, ocorreu no apartamento em que moravam, quando ela descobriu indícios de traição dele. Depois da altercação, ela foi à delegacia mais próxima, registrou queixa e, como é de praxe, passou por exame de corpo de delito no IML. Horas mais tarde, foi a vez dele fazer o mesmo. São esses dois laudos do IML que Ancillotti, passados seis anos, esmiúça na revisão da história. Na sua percepção, Pedro Paulo não pode ter dado socos em Alexandra, como consta do depoimento dela, porque no laudo do IML “não se observam lesões sequer leves” nas mãos dele. Mais: o fato de ela não ter recebido atendimento médico “nos faz depreender” que os machucados dela “são de natureza leve”.
Em outro ponto, admite que não pode afirmar que as escoriações de Alexandra foram resultado de “uma ação defensiva da outra parte” porque desconhece “a dinâmica dos eventos”, mas, “com base em estudos de cinemática do trauma”, isso pode muito bem ter acontecido “visto que a primeira Lei de Newton diz: ‘Um corpo em movimento ou em repouso tende a ficar neste estado até que uma energia externa atue sobre ele’.” Até a possibilidade de alguns ferimentos de Alexandra terem sido obra dela mesma é aventada, na forma de pergunta e resposta em uma gramática, essa sim, castigada. Pergunta: “As lesões constatadas na parte feminina descritas no laudo poderiam ter sido auto lesão, considerando que esta seja canhota?”. Resposta: “Sim”, acompanhado de um arrazoado técnico. Em conclusão, diz Ancillotti que “as lesões provocadas no senhor Pedro Paulo indicam que o mesmo encontrava-se posicionado em atitude de defensiva”.
Em vídeo, ex-mulher de Pedro Paulo refaz sua história
A inversão de vítima e agressor também sustenta um vídeo, igualmente anexado à defesa e divulgado em Veja.com na quarta-feira, em que Alexandra conta que ela atacou e ele tentou escapar dos golpes. Antes disso, desde que VEJA divulgou o boletim de ocorrência de Alexandra, o casal já vinha amenizando o ocorrido, dizendo se tratar de “agressões mútuas” passíveis de acontecer com “qualquer casal”. Não conseguiu, no entanto, impedir o andamento do processo, que tem por base a lei Maria da Penha e, por isso, independe do consentimento dos envolvidos. Com o vídeo e o novo laudo, a defesa esperava obter o arquivamento do caso. Mas eles promovem uma versão tão oposta ao depoimento inicial de Alexandra – origem de um processo em mãos do Ministério Público Federal, já que Pedro Paulo também é deputado federal — – que o procurador geral Rodrigo Janot encaminhou ao Supremo Tribunal Federal pedido de abertura de um novo inquérito só para apurar o que chamou de “giro radical” na história. O pedido está sendo examinado pelo ministro Luiz Fux.