O recurso da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contra a condenação no caso do tríplex do Guarujá será julgado pela 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, a mesma que já negou, por unanimidade, um habeas corpus preventivo do petista em março do ano passado. O colegiado, conhecido por manter as decisões vindas das instâncias inferiores, é composto por Felix Fischer, relator da Lava Jato na corte, e outros quatro ministros: Jorge Mussi, Reynaldo Soares da Fonseca, Marcelo Navarro Ribeiro Dantas e Joel Ilan Paciornik.
Porém, no julgamento do recurso de Lula, a 5ª Turma terá a participação de quatro julgadores, já que Paciornik declarou-se impedido de participar das ações relativas à Lava Jato porque seu advogado pessoal, Renê Dotti, também representa a Petrobras, assistente da acusação no processo contra Lula. Em caso de empate, será convocado um ministro da 6ª Turma, que também trata de matéria criminal. Por uma questão de antiguidade, este julgador será Antonio Saldanha Palheiro, que terá de se inteirar de todo o processo e não tem prazo para proferir seu voto.
De acordo com o Anuário da Justiça, os ministros do colegiado costumam trocar os votos antes dos encontros semanais, o que facilita as discussões, uma vez que dúvidas e discordâncias são expostas previamente. As sessões da turma não são transmitidas pela TV, mas o tribunal avalia fazer uma transmissão por seu canal do YouTube — assim como aconteceu no julgamento do HC de Lula.
O que o colegiado vai analisar agora é um chamado “agravo regimental” apresentado pela defesa de Lula contra uma decisão monocrática de Felix Fischer, que, em novembro de 2018, negou um recurso especial do ex-presidente para que a condenação no caso do tríplex fosse revista e, ele, absolvido. O petista está preso desde 7 de abril do ano passado para cumprir a pena de doze anos e um mês de prisão a que foi condenado no processo pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4).
O ministro Fischer pode levar o processo para julgamento a qualquer momento. A defesa de Lula tenta fazer com que o recurso seja analisado pelo conjunto dos ministros e não apenas por um deles. Mas, para isso, é preciso que os pares de Felix Fischer derrubem sua decisão monocrática. O que os advogados de Lula argumentam é que o recurso expõe 18 teses jurídicas compatíveis com a jurisprudência do STJ que deveriam ser enfrentadas pelos ministros.
Se a decisão individual de Fischer for derrubada, seus colegas poderão votar no mérito do recurso, que discute a inocência de Lula — e permitiria a participação da defesa no julgamento. Os advogados do petista também pedem o envio do processo para a Justiça Eleitoral, algo que, se for concedido, pode levar à anulação da condenação na Justiça Federal. A petição é baseada na recente decisão do Supremo Tribunal Federal, que determinou que cabe à Justiça Eleitoral julgar crimes comuns, quando correlatos a crimes eleitorais.
O raciocínio é que, se o petista é acusado de receber o imóvel como parte de 16 milhões de reais pagos pela OAS ao Partido dos Trabalhadores para o financiamento de campanhas a partir de fraudes na Petrobras, o processo deveria ter sido julgado pela Justiça Eleitoral. Condenado em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o petista cumpre doze anos e um mês de prisão no processo do tríplex na superintendência da Polícia Federal em Curitiba, desde abril do ano passado.
Conheça o perfil dos ministros da 5ª Turma do STJ
Felix Fischer
Alemão de nascimento e mais antigo ministro do STJ, o relator dos processos relacionados à Lava Jato é conhecido por manter as condenações contra os réus da operação. Ao julgar um habeas corpus que foi negado a Lula em março do ano passado, Fischer mencionou elementos do processo que indicam “conduta inapropriada” de ex-presidente e seus advogados. Ele citou declarações para “intimidar julgadores”, como uma ameaça de que mandaria prender os procuradores responsável pelo caso, e depoimentos que o acusam de incentivar a destruição de provas. Antes de assumir uma vaga no STJ, em 1996, era procurador do Ministério Público do Paraná.
Jorge Mussi
O catarinense iniciou sua carreira na advocacia, foi desembargador do Tribunal de Justiça de SC e está no STJ desde 2007. Em maio de 2018, negou um pedido de habeas corpus feito pela defesa do ex-presidente do PSDB Eduardo Azeredo, que tentava evitar sua prisão no caso que ficou conhecido como mensalão tucano. No Tribunal Superior Eleitoral, Mussi votou contra o registro de candidatura de Lula com base na Lei da Ficha Limpa — e defendeu sua aplicação. Na ocasião, ele afirmou que a inelegibilidade do petista, condenado em segunda instância e preso na Lava Jato, era “cristalina”.
Reynaldo Soares da Fonseca
Presidente do colegiado, o maranhense ficou em segundo lugar em levantamento feito entre juízes federais para a vaga do ministro Teori Zavascki, morto em um acidente aéreo em janeiro de 2017, no Supremo Tribunal Federal — ficou atrás do então juiz federal Sergio Moro por apenas um voto; a cadeira acabou sendo ocupada por Alexandre de Moraes. No STJ, também votou contra um pedido de liberdade de Paulo Vieira de Souza, investigado por fraudes em governos do PSDB em São Paulo, e negou um pedido do ex-governador do Distrito Federal José Roberto Arruda para suspender a ação penal da operação Caixa de Pandora.
Ribeiro Dantas
O potiguar iniciou sua carreira como promotor, foi desembargador do TRF da 5ª Região, e chegou ao STJ em 2015. Ao votar contra o habeas corpus de Lula, entendeu que a não aplicação da prisão após a condenação em segunda instância, entendimento que vigorou no STF entre 2009 e 2016, estava tornando o Direito Penal brasileiro “sem efetividade”. É dele também uma decisão de março de 2016 que permitiu o fatiamento de um denúncia do Ministério Público de São Paulo contra Lula e que deixou nas mãos do juiz Sergio Moro o trecho relativo ao tríplex do Guarujá — entendimento que, à época, foi criticado tanto pelos promotores paulistas quanto pela defesa do petista.
Antonio Saldanha (convocado em caso de empate)
O ministro da 6ª Turma só será convocado para participar do julgamento em caso de empate. Levantamento do Anuário da Justiça dá pistas de uma tendência “garantista” do magistrado: em um habeas corpus, ele votou que a execução da pena depois da decisão de segunda instância não é automática. A publicação também registra sua opinião de cautela ao que chama de “messianismo punitivista”. Entre decisões em casos mais rumorosos, foi a favor da substituição da prisão preventiva por medidas cautelares ao julgar habeas corpus dos irmãos Joesley e Wesley Batista, donos da empresa que controla o frigorífico JBS, e dos empresários Carlos Augusto Ramos, conhecido como Carlinhos Cachoeira, e Fernando Cavendish.