O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), à frente do grupo de Segurança Pública e Institucional no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), quer difundir no Brasil a criação de varas colegiadas para processar delitos praticados pelo crime organizado. Ele defende que essas varas especializadas na primeira instância da Justiça tenham cinco juízes fixos, em vez de apenas um.
Moraes afirmou que não há como combater este tipo de criminalidade sem que o Estado ofereça condições mínimas de seguranças aos magistrados, que ficam expostos ao julgar, de forma individual, os membros de organizações ligadas, por exemplo, ao tráfico de drogas e armas. Por isso, ele defende ampliar as varas colegiadas.
Em entrevista ao O Estado de S. Paulo, o ministro do STF chamou de “fracasso” a lei brasileira de 2012 que prevê a instituição provisória de um colegiado de juízes para analisar procedimentos relacionados à organização criminosa. “Não pode constranger a pessoa, fazer com que ele fale que tem receio (de julgar o caso). É a mesma coisa que pedir para nada”, disse o ministro, que já foi secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo e ministro da Justiça no governo Michel Temer, antes de ser indicado para a vaga no Supremo.
Um levantamento do CNJ em maio mostrou que, à época, havia 110 magistrados sob ameaça no país — seis em cada mil juízes. Moraes observa que a proteção desses magistrados é atualmente feita de forma repressiva, e não preventiva. O mapeamento feito pelo CNJ mostra justamente que os riscos na atuação profissional são maiores para os juízes de primeira instância — a média sobe para 7 em cada mil — e menores para desembargadores, quando o índice cai para 2 por mil.
Debate
A criação de varas colegiadas ainda não pode ser considerada uma unanimidade entre os magistrados. A ideia será discutida durante encontro nacional que ocorrerá em fevereiro, quando serão convidados juízes criminais, juízes de execução penal, juízes corregedores de presídios, para que possam discutir as propostas do grupo presidido por Moraes.
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Fernando Mendes, alega que não são todos os juízes que concordam com Moraes. “Nem todos concordam, porque violaria o princípio do juiz natural. Para a parte de execução, isso já existe; se isso pode ser ampliado para a vara, é uma questão que vai depender de um debate mais aprofundado”, afirmou.
Para serem implantadas no Brasil, as varas colegiadas precisam de aprovação legislativa. No âmbito estadual, os tribunais devem enviar projeto de lei para às Assembleias Legislativas. Segundo Mendes, para a Justiça Federal, a proposta deve ser enviada do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para o Congresso Nacional. Como a estrutura necessita de mais magistrados, os juízes seriam convocados por meio de concurso público. A ideia já foi apresentada por Moraes ao Congresso em maio passado, por meio de uma comissão de juristas presidida por ele.
A criação de uma central de inteligência que cruze informações relativas às organizações criminosas com as polícias e Forças Armadas é outra medida que o ministro da Suprema Corte deseja implantar. A proposta, que não é vista como controversa, também será discutida no evento em fevereiro, e, de acordo com Moraes, é algo que poderia ser feito diretamente pelo Judiciário.
“Hoje não há um banco de dados de inteligência do Judiciário. E o Judiciário é que tem mais condições de fazer isso, porque ele pega informações da polícia, do Ministério Público”, exemplificou o ministro, que foi chamado para presidir o grupo no CNJ pelo presidente do conselho e do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli.
Como as varas colegiadas seriam, em tese, restritas e organizadas só para casos específicos, a ideia de Moraes é que esses órgãos funcionem como centrais para o sistema de inteligência do Judiciário. Para o ministro, a estrutura funcionará tanto para a prevenção de ameaças como no auxílio ao combate do crime organizado. “O juiz de São Paulo que está analisando processos de uma organização criminosa vai descobrir pelo jornal que essas pessoas processadas têm 30 imóveis em Fortaleza”.
(Com Estadão Conteúdo)